Quinta-feira, 20 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 22 de setembro de 2025
O presidente dos EUA, Donald Trump, disse nessa segunda-feira (22) que a FDA (Food and Drug Administration, a Anvisa dos EUA) pedirá aos médicos que aconselhem mulheres grávidas a não usarem paracetamol, princípio ativo do Tylenol, devido a um suposto risco aumentado de autismo para os bebês.
“Tomar Tylenol não é bom. Eu digo: não é bom. Por esse motivo, eles recomendam fortemente que as mulheres limitem o uso de Tylenol durante a gravidez, a menos que seja clinicamente necessário”, disse Trump durante evento na Casa Branca, ao lado de Robert F. Kennedy Jr., secretário do Departamento de Saúde dos EUA, equivalente ao ministro da Saúde no país.
Kennedy afirmou que a FDA iniciará o processo de alteração dos rótulos de segurança do medicamento.
O Tylenol é fabricado pela empresa de saúde do consumidor Kenvue, que foi desmembrada da Johnson & Johnson em 2023, e versões genéricas de paracetamol também estão disponíveis. A empresa afirmou nesta segunda-feira que discorda da sugestão da ligação do medicamento com o transtorno que, segundo ela, não tem base científica.
Trump também sugeriu leucovorina, uma forma de ácido folínico (forma ativa do ácido fólico), como tratamento para sintomas de autismo. No entanto, pesquisadores afirmam que a leucovorina, usada para tratar alguns pacientes com câncer em quimioterapia, demonstrou ser promissora em ensaios clínicos muito pequenos, mas que pesquisas de grande porte ainda são necessárias para chegar a uma conclusão sobre o autismo.
Na última sexta-feira (19), o presidente norte-americano já havia adiantado que teria um anúncio “incrível” para fazer sobre o autismo e afirmou que o transtorno “está totalmente fora de controle” e que achava que “talvez tenhamos um motivo para isso”. No domingo (21), Trump disse que achava o paracetamol “um fator muito importante” para o autismo.
As preocupações com o paracetamol e os problemas de desenvolvimento em crianças são antigos. Cientistas estudam uma possível conexão há anos, mas as pesquisas até agora não produziram resultados conclusivos.
Estudos que examinaram o possível risco ao desenvolvimento cerebral fetal são mistos. Enquanto alguns encontraram uma ligação com distúrbios do neurodesenvolvimento em crianças, outros não.
Isso porque existem limitações metodológicas dos estudos disponíveis, incluindo a dependência de relatos das gestantes, que podem ser tendenciosos, e o controle insuficiente de variáveis de confusão, como infecções maternas e outras condições médicas que podem influenciar o desenvolvimento neurológico da criança.
Uma análise de diversos estudos realizados entre 2013 e 2023, publicada no ano passado na Revista Brasileira de Implantologia e Ciências da Saúde, aponta ainda que as diferenças nas doses e períodos de uso dificultam a determinação de uma relação causal.
Além disso, todas as pesquisas existentes sobre os efeitos do paracetamol são observacionais, o que significa que os pesquisadores analisam dados sobre as gestações das mulheres e depois observam como seus filhos se desenvolvem ao longo do tempo.
O paracetamol é amplamente utilizado para aliviar dores e reduzir a febre, sendo um dos medicamentos mais prescritos para gestantes devido ao seu perfil de segurança em comparação com outros analgésicos, como os anti-inflamatórios.
Por não possuir efeitos adversos conhecidos nos períodos de gestação e ser considerado seguro para o uso materno, o paracetamol é frequentemente escolhido como o medicamento de primeira linha para o alívio de sintomas comuns durante a gravidez, como dores de cabeça e lombalgias (dores na parte inferior das costas).
No entanto, nos últimos anos, surgiram preocupações sobre os potenciais impactos desse uso durante a gestação, especialmente no que diz respeito ao desenvolvimento neurológico infantil.
Estudos indicam que o paracetamol pode atravessar a barreira placentária, atingindo o feto em concentrações similares às encontradas na circulação materna e influenciando processos biológicos cruciais para o desenvolvimento fetal, como a neurogênese (processo de formação de novos neurônios) e a função dos sistemas endocanabinoides —responsáveis por regular funções fisiológicas, como dor, humor e memória.
Um estudo abrangente com mais de 60 mil crianças realizado em 2014 apontou um aumento significativo no risco de TDAH entre aquelas expostas ao paracetamol durante a gravidez. Esse estudo controlou fatores como histórico de infecções maternas e uso de outros medicamentos, buscando minimizar a influência de variáveis de confusão.
No entanto, a dependência de autorrelatos maternos sobre o uso do medicamento limitou a acurácia dos dados.
Modelos animais também reforçam a hipótese de que o paracetamol pode interferir na formação neural, afetando a cognição e o comportamento social.
Diante das limitações metodológicas, incertezas e falta de consenso, alguns cientistas recomendaram que os profissionais de saúde tomem uma postura preventiva e alertem as mulheres grávidas sobre a possibilidade de uma ligação entre o paracetamol e o autismo.
O estudo publicado na revista brasileira recomenda cautela no uso deste medicamento durante a gravidez, empregando a menor dose possível e por tempo limitado, sempre com orientação médica.
“Muitos especialistas recomendam que o uso do medicamento seja limitado a casos em que não há alternativas seguras e que se utilize a menor dose eficaz possível, especialmente durante o segundo e o terceiro trimestres, períodos críticos para o desenvolvimento neurológico do feto”, diz o estudo, que aponta ainda a necessidade de mais pesquisas para esclarecer “mecanismos subjacentes a esses efeitos adversos”. As informações são dos jornais Folha de S.Paulo e The New York Times e da agência de notícias Reuters.