Terça-feira, 25 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 25 de novembro de 2025
A ruptura entre o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) e o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), explicitada na segunda-feira pelos dois, é fruto de uma escalada de atritos e teve como pano de fundo a saída do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) do País. O parlamentar, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na ação da trama golpista, é considerado foragido após viajar para os Estados Unidos. Nos bastidores, petistas insinuaram que o presidente seria “cúmplice” da fuga, uma vez que o parlamentar apresentou atestados médicos para não precisar comparecer às sessões. Apesar de não ter sido Lindbergh quem fez a associação, o episódio estremeceu a relação dos dois.
O primeiro sinal de tensão entre os dois, porém, é anterior. Surgiu durante a tramitação da PEC da Blindagem. Lindbergh passou a dizer nos bastidores que Motta adotava uma postura “complacente” com o Centrão, sobretudo por não atuar para frear um texto que ampliava proteções a parlamentares e contrariava interesses do governo. Deputados da base afirmam que o petista esperava da presidência da Câmara uma ação mais incisiva para conter o avanço da proposta, enquanto aliados de Motta defendiam que sua função era “equilibrar os interesses de todo o Parlamento”, mesmo quando isso contrariasse parte da coalizão governista. A partir dali, Lindbergh começou a insinuar que o presidente da Casa “se afastava das prioridades do país”.
Em paralelo, o petista acumulava outra queixa: a de que Motta faz “vista grossa” a casos envolvendo parlamentares da ala bolsonarista. Lindbergh tem repetido, internamente, que os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-RJ) e Carla Zambelli (PL-SP) “já deveriam estar cassados” pelos processos que tramitam no Conselho de Ética, mas que os casos “não avançam” porque a presidência da Casa — na leitura dele — evita tensionar com o PL para não desestabilizar a governabilidade. O entorno de Motta afirmam que o presidente da Câmara não interfere no ritmo do colegiado e que o trâmite segue regras regimentais.
O mal-estar aumentou na votação da medida provisória alternativa ao aumento do IOF. O governo articulava a aprovação de um texto para recompor receitas, mas a Câmara retirou a matéria de pauta no dia em que caducava, abrindo caminho para a derrota. No entorno de Lindbergh, o episódio foi interpretado como mais uma demonstração de que Motta “não colocou peso” para segurar uma pauta considerada estratégica pelo Planalto. A avaliação entre petistas era a de que o presidente vinha adotando uma linha ambígua para evitar desgaste com bancadas resistentes ao texto.
O estresse se consolidou com a indicação de Guilherme Derrite (PP-SP), secretário de Segurança Pública de São Paulo licenciado, para relatar o PL do Antifacção. O PT tentou, de maneira reservada, construir um acordo para que a relatoria ficasse com um nome mais neutro — ou ao menos não alinhado a Tarcísio e à ala mais dura da segurança pública. Motta, no entanto, manteve a escolha, o que foi encarado como uma provocação.
A leitura interna foi de que o presidente da Câmara buscou acomodar a oposição após semanas de tensão com o governo. No PT, o gesto foi visto como um ponto de inflexão. Lindbergh passou a reclamar que Motta tentava agradar a todos e, ao fazê-lo, deixava o governo exposto. A reunião de líderes que se seguiu — marcada por interrupções e falas elevadas — cimentou o distanciamento pessoal entre os dois.
O estopim, porém, veio com o caso Ramagem. A descoberta de que o deputado havia viajado aos Estados Unidos, mesmo proibido pela Justiça, e continuava votando remotamente com base em atestado médico levantou suspeitas internas sobre falhas de controle da Mesa Diretora. Lindbergh acionou o STF e cobrou explicações formais. Dentro do PT, parte da bancada passou a empregar a expressão “cúmplice de Ramagem” para se referir à condução de Motta.
Irritado com a escalada das acusações, Motta comunicou a interlocutores que não voltaria a conversar diretamente com Lindbergh. Petistas chegaram a ligar para o presidente para pedir desculpas. Teriam explicado que extraíram um documento do site da Câmara que comprovava que Ramagem pagou telefonia no exterior com dinheiro da cota parlamentar e assumido que, por isso, Motta saberia.
A aliados, Lindbergh tem dito que Motta “escolheu brigar com quem não precisa” e que sua divergência é política, não pessoal. Integrantes da bancada do PT, por sua vez, têm afirmado que as divergências são compartilhadas pelos deputados.
Oficialmente, Motta mantém interlocução com o governo, mas fechou as portas para o petista. Lindbergh, por sua vez, deixou claro a aliados que vê uma aproximação crescente do presidente da Câmara com o PL — e não pretende recuar dessa leitura.
A reconstrução de pontes é vista como improvável. A crise ocorre justamente no momento em que o governo tenta impedir que a oposição consiga pautar projetos ligados à anistia dos condenados e investigados pelos atos de 8 de janeiro. Desde a prisão preventiva de Jair Bolsonaro, o PL pressiona para votar o projeto de redução de penas, e tentar reestabelecer a anistia total em plenário.
O Planalto é contrário ao tema. Por isso, a orientação ao bloco governista é clara: não abrir espaço para que a pauta seja votada nas próximas semanas. O front governista tem como principal foco aprovar o orçamento de 2026.
Procurado, Lindbergh disse que nunca afirmou que o presidente da Câmara teria sido cúmplice da fuga de Alexandre Ramagem. “O que fiz, no cumprimento do meu dever parlamentar, foi solicitar formalmente à Mesa informações e cópias da documentação da licença saúde concedida ao deputado, que foi anunciada à imprensa após a evasão do território nacional, sem publicação oficial ou transparência. Qualquer interpretação diferente distorce os fatos”, afirmou. Motta, por sua vez não comentou. As informações são do jornal O Globo.