Por Redação O Sul | 24 de novembro de 2025
Ao longo dos meus anos atendendo homens de diferentes idades, histórias e medos, percebi que não é a falta de informação que mais os afasta da prevenção, mas a falsa sensação de invencibilidade. Somos treinados para acreditar que nada vai nos atingir e, quando atinge, janelas de oportunidade foram perdidas. Neste mês de conscientização sobre câncer de próstata, a pergunta que fazemos é: “Você está pronto para viver mais?”. A resposta parece óbvia, mas viver mais exige atitude, responsabilidade e coragem para dirimir tabus que ainda dominam a saúde masculina. Ao cuidar da própria saúde, estamos também cuidando das relações e das pessoas que caminham ao nosso lado.
O câncer de próstata é um divisor de águas nesse debate. Não costuma dar sinais no início. Quando os sintomas aparecem, como dificuldade ao urinar ou dor persistente, a doença pode estar avançada. E, ainda assim, muitos homens evitam a consulta preventiva, como se o simples ato de procurar ajuda os tornasse frágeis. A ciência, porém, nos mostra outro caminho. Um robusto estudo europeu analisou mais de 162 mil homens durante 23 anos e comprovou que o rastreamento com PSA reduz em 13% a mortalidade por câncer de próstata.
No Brasil, ainda diagnosticamos muitos casos em fase avançada. Quando o tumor já se espalhou, os tratamentos são mais agressivos e os impactos na qualidade de vida, maiores. Vejo diariamente homens que chegam ao consultório arrependidos não do que fizeram, mas do que deixaram de fazer: a consulta adiada, o preconceito com o toque retal, o “isso não vai acontecer comigo”. A negligência, nesses casos, cobra um preço alto.
Se eu pudesse escolher apenas uma mensagem para reforçar, seria a que o rastreamento não é sobre medo, mas sim sobre controle. O PSA e toque retal se complementam. Mesmo com PSA normal, podemos encontrar alterações suspeitas no exame físico em até 20% ou 25% dos casos. Ignorar um dos exames é deixar a oportunidade de diagnóstico precoce. Com diagnóstico precoce as chances de cura superam os 90%.
Mas quando falamos em viver mais, não basta apenas diagnosticar cedo (prevenção secundária). Precisamos chamar a atenção também para a prevenção primária, reforçando a importância da alimentação balanceada, controle do peso, atividade física regular, não fumar e moderar álcool. São hábitos que reduzem a inflamação sistêmica, preservam o equilíbrio hormonal e protegem a próstata. Viver mais é um projeto que começa na rotina.
E se engana quem pensa que Novembro Azul se resume à próstata. Câncer de pênis e de testículo também exigem atenção e ainda sofrem com invisibilidade. No primeiro, higiene íntima adequada, vacina contra HPV e tratamento de fimose poderiam evitar grande parte dos casos. Já o câncer de testículo acomete os jovens, muitas vezes no auge da vida e a chave para a cura está no autoconhecimento do próprio corpo. Notou algo estranho? Durou mais do que alguns dias? Procure ajuda. A informação precisa chegar aos homens mais jovens para que eles também se reconheçam como parte desse cuidado.
A pergunta que escolhemos como campanha não é retórica. Você está pronto para viver mais? Estar pronto significa investir no seu futuro e no futuro de quem depende de você. Significa reconhecer que prevenção não é perda de tempo, mas ganho de vida. Significa trocar o silêncio por uma conversa franca com o urologista. Significa compreender que coragem não é aguentar calado, mas sim agir a tempo.
Eu quero que os homens vivam mais e bem. Que participem da vida de seus filhos, netos, parceiros e amigos. Que mantenham sua autonomia, capacidade de amar e de serem amados. Que não deixem a negligência decidir seu destino. Você está pronto para viver mais? Se a resposta for sim, o caminho está aí. (Gustavo Cardoso Guimarães/O Globo)
