Quarta-feira, 26 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 19 de junho de 2017
Se o provérbio “amigos, amigos… negócios à parte” se mudasse agora para “inimigos, inimigos… negócios à parte”, o presidente Michel Temer seria, hoje, o símbolo máximo dessa situação. Por ironia do destino, Temer é obrigado a defender seu próprio carrasco, o empresário Joesley Batista, para evitar que as exportações brasileiras de carnes continuem a perder espaço no mundo por causa dos efeitos da Operação Carne Fraca da Polícia Federal. Para isso, o presidente enviou ministros e altos funcionários para Ásia, União Europeia e Oriente Médio e, nesta segunda-feira (19), ele próprio embarcará para a Rússia, onde deverá reforçar, como um dos principais pontos da agenda bilateral, a qualidade do sistema sanitário nacional.
Causador do inferno astral de Temer, após ter apontado o presidente da República, em delação na Justiça, como um dos grandes interessados na compra do silêncio do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha – preso atualmente em Curitiba (PR) no âmbito da Lava-Jato – Joesley é um dos donos da JBS. O frigorífico é o maior produtor de proteína animal do mundo. A companhia opera no processamento de carnes bovina, suína, ovina e de frango. Também atua na produção de alimentos. Em relatórios a investidores, a empresa destaca a receita na Rússia, que representa 1% do total.
Em março deste ano, a PF deflagrou uma operação que mostrou um esquema de corrupção envolvendo os maiores frigoríficos do país, incluindo a JBS. Essas empresas são acusadas de adulterar a carne que vendiam nos mercados interno e externo, com o aval de servidores públicos federais. A notícia causou perplexidade e preocupação aos países importadores que, por outro lado, beneficiaram-se com a queda dos preços dessa commodity.
Temer enfrenta, portanto, um paradoxo. Se, internamente, não é interesse do presidente facilitar a vida da JBS em renegociação de dívidas e outras questões junto a bancos públicos e órgãos públicos federais, externamente a ordem é abrir mercado para a carne brasileira. A origem não importa, pois o que pesa é o cumprimento das normais sanitárias internacionais.
“O Brasil é um grande exportador de carne, independentemente de quem seja o exportador. Se o governo não defender a JBS, abrirá espaço para que outro país ocupe o lugar do Brasil”, resume o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, José Augusto de Castro.
Países com chances reais de ocupar o espaço do Brasil a curtíssimo prazo são dois: Estados Unidos e Austrália. Embora os argentinos tenham tradição forte no ramo, não possuem condições para atender à demanda.
No caso dos americanos, a ameaça é ainda mais concreta, diante do momento de reaproximação política entre Washington e Pequim. A China, para compensar o elevado superávit comercial que tem com os EUA, poderá comprar mais carne americana em uma política de boa vizinhança, o que seria ruim para o Brasil.
O presidente da AEB alerta que o mesmo pode ocorrer em relação à Rússia. Moscou, em mais uma tentativa de reaproximação com os EUA, também poderá aumentar suas compras de carne daquele país.
“A Rússia é um mercado que precisa ser preservado, assim como os demais. Se essa situação se mantiver, além dos exportadores brasileiros, os maiores prejudicados serão os consumidores do Brasil e do exterior. Os preços vão subir. Por enquanto, os problemas estão concentrados, basicamente, na carne bovina. Mas isso poderá se forem atingidos frangos e suínos”, diz Castro.
Em outra frente, o Brasil é bombardeado pelos países agrícolas europeus. Irlanda, França e Holanda pressionam o comando da União Europeia a suspender ou dificultar o ingresso de carne brasileira naquele mercado. A UE exige mais rigor na fiscalização das exportações para a região e critica fortemente a forma como o governo Temer está conduzindo a crise que colocou os frigoríficos sob suspeita.
Dados obtidos no Sistema Integrado de Comércio Exterior mostram que, de janeiro a maio, o Brasil exportou US$ 1,755 bilhão em carne bovina – categoria mais afetada negativa pela Operação Carne fraca. Por ordem de importância, os principais importadores são China, Hong Kong, Rússia, Irã, Egito, Arábia Saudita, Chile, EUA e Holanda. (AG)