Sábado, 14 de junho de 2025
Por Redação O Sul | 28 de agosto de 2015
A Anistia Internacional está preparando uma campanha para a descriminalização total do comércio do sexo, defendendo o fim das punições, multas, ou perseguições para prostitutas, clientes e donos de bordel. Após dois anos de pesquisas e consultas, a prostituição foi reconhecida como um direito humano, compatível com o princípio de igualdade dos sexos e da livre escolha. No mais perfeito estilo ONU (Organização das Nações Unidas), o voto de cada um dos 400 delegados de 80 diferentes países foi disputado por celebridades, militantes, feministas e lobistas em uma feérica troca de manifestos contra e a favor da nova política. “É o melhor meio de reduzir os riscos para a prostituição”, defende a Anistia.
Estamos todos falando, claro, de sexo consensual entre adultos. Mesmo assim, o tema desperta sentimentos fortes. Foram contra as atrizes Meryl Streep e Kate Winslet. O ex-presidente dos EUA Jimmy Carter, antes de iniciar o tratamento do câncer, defendeu em carta a punição aos “compradores” de sexo, mesma posição de Marisol Touraine, ministra da Saúde da França, país onde o Senado votará em setembro a criação de multa para os clientes das meninas ou meninos.
“Prostituição é tráfico, exploração sexual, violência. Com frequência demais damos uma imagem de glamour às call girls que se anunciam na internet para ganhar um pouco mais de dinheiro. A realidade é mais sórdida e humilhante”, disse.
O mal-estar é evidente entre os franceses. Em um país em que a glorificação do bordel faz parte da cultura nacional, é destaque nos museus e inspirou personagens deliciosos na literatura, esta intromissão na sexualidade dos outros parece coisa de regimes muçulmanos, duramente criticados no Ocidente por transformarem a vida privada em assunto de Estado. As feministas dividiram-se, tornou-se impossível identificar posições de esquerda e direita. Os envolvidos diretamente na história – prostitutas, médicos e policiais – ficaram contra por uma razão bem prática: ao precisarem se esconder, elas/eles ficarão mais frágeis, menos protegidos da violência e pouco acessíveis a cuidados médicos.
“Touche pas à mon client [Não toquem no meu cliente]”, disseram as moças, reciclando uma palavra de ordem dos anos 1990 contra o racismo.
“Em uma sociedade democrática, cobrar para fazer sexo e pagar pelo sexo não devem ser crimes, são atividades privadas”, defende Laurie Shrage, professora de filosofia e estudos de gênero da Universidade da Flórida (EUA), onde, como em todos os Estados americanos, a prostituição dá cadeia.
O mundo vive uma onda conservadora e uma ânsia de legislar sobre as novas configurações das relações sexuais e amorosas, na esperança talvez de dar mais previsibilidade à vida cotidiana. A tese capitalista de que a demanda estimula a oferta no caso do sexo provou-se simplista demais para ser verdade. Por que o direito das mulheres de dispor do seu corpo, uma das palavras de ordem da luta pela igualdade de gênero, só vale para as brancas e bem-sucedidas?
Fala sério. No caso de prostitutas e “desnudas”, o alvo é o mesmo: as mulheres vindas dos países pobres para trabalhar ou pedir dinheiro e, mais do que protegê-las, os Estados querem torná-las invisíveis. Descriminalizar o comércio do sexo é a melhor maneira de evitar prisões arbitrárias, extorsão, assédio e violência contra elas. (Helena Celestino/AG)