Sexta-feira, 31 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 16 de novembro de 2018
O governo do presidente eleito Jair Bolsonaro nem começou e já é palco de uma crise de relacionamento entre os seus núcleos militar, político e econômico. Segundo fontes ligadas à transição, o estopim foi a desistência do general da reserva Oswaldo Ferreira de ocupar um ministério.
Ferreira se tornou um dos mais próximos aliados do agora presidente eleito e trabalha desde 2017 na coordenação de infraestrutura, a pedido do próprio Bolsonaro. Naquele momento, o político do PSL procurava apoio entre os militares para decolar a sua campanha ao Palácio do Planalto.
A decisão do ex-general é reflexo de um racha na equipe de transição pela disputa de cargos no governo. Ele afirmou à imprensa, porém, ter motivos pessoais para não ficar.
Nesse jogo de interesses, em diferentes lados estão a equipe do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, os generais ligados a Bolsonaro e o futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS) – que comanda a transição junto com seu braço-direito, Paulo Tatim.
No processo de arranjo dos ministérios, a ala política tenta ocupar mais espaço, tirando ex-oficiais de alta patente do círculo mais próximo de Bolsonaro e criando fórmulas para deixar Paulo Guedes refém de futuras articulações políticas.
Ferreira, que participa da transição desde o primeiro dia, embora sem um cargo formal, apresentou um plano a Bolsonaro para o que seria o superministério da Infraestrutura. O presidente eleito deu aval ao plano mas não nomeou o general da reserva para o cargo que, no desenho proposto, estaria vinculado à Presidência da República.
No dia seguinte, Bolsonaro limitou a três os cargos de ministros vinculados à Presidência. Serão eles: GSI (Gabinete de Segurança Institucional), que será comandado pelo general da reserva Augusto Heleno, Casa Civil (com Onyx Lorenzoni) e a Secretaria-Geral da Presidência, que pode ficar com o advogado Gustavo Bebianno, ex-presidente do PSL e um dos nomes com mais força ao longo da campanha.
Pessoas que participaram das conversas afirmam que Bolsonaro não se deu conta que, com três ministros no Planalto, Ferreira ficaria fora. Pelo plano de Ferreira, os ministérios dos Transportes e de Minas e Energia seriam preservados. O general coordenaria essa área como uma espécie de ministro supervisor ligado diretamente ao Palácio do Planalto.
Esse plano ruiu quando Onyx e Tatim, que coordenam o enxugamento dos ministérios, passaram a contar com Ferreira no Ministro de Transportes, pondo fim à ideia do superministério. O general então recusou permanecer no futuro governo.
À imprensa, o ex-oficial disse que tomou a decisão por uma questão pessoal. “Desde o início eu disse ao presidente Bolsonaro que não fazia questão de ser ministro. Tenho minhas coisas para tocar. Ajudei um amigo em um momento importante.” Ferreira afirmou que continuará participando das reuniões de transição.
Interesses políticos
Integrantes da ala dos generais e da equipe de Paulo Guedes afirmam que a decisão de Ferreira é uma forma de alertar Bolsonaro para os interesses políticos de Onyx e Tatim – o segundo foi levado pelo primeiro à equipe de transição e pleiteia o segundo cargo da Secretaria-Geral da Presidência, coordenando o PPI (Programa de Parcerias em Investimentos) no lugar do vice-presidente eleito, ex-general Hamilton Mourão.
Com a reviravolta na Infraestrutura, o mais cotado para assumir os Transportes é o general da reserva Jamil Megid Júnior, que foi indicado por Tatim. Megid Júnior foi vice-chefe do Departamento de Engenharia e Construção do Exército e coordenador-geral do Comitê Organizador dos Jogos Mundiais Militares, em 2011.
Os generais também podem ceder espaço em outra área estratégica. Na planilha original dos militares, o PPI ficaria com Mourão. Isso porque o programa será um dos principais pilares da agenda econômica do governo e, para ter agilidade de decisões, precisa ter a autonomia de um ministério. Nem isso mais está previsto.
Essa reconfiguração de forças e choque entre civis e militares, culminado com a desistência de Ferreria, pode afetar a área econômica. Paulo Guedes quer acelerar o cronograma de privatizações do PPI como umas das primeiras medidas para gerar receitas e assim fazer frente ao quadro de aperto fiscal. Sob o controle da ala política, pode haver problemas.
O futuro ministro da Casa Civil afirmou à imprensa que desconhece a decisão de Ferreira de desistir de ser ministro e negou desentendimentos com o núcleo militar do novo governo. Segundo ele, ainda estão avaliando o arranjo das secretarias e ministérios do Palácio do Planalto:
“Não tem nada definido, recém colocamos a transição para funcionar. Quem falar que tem definição, falta com a verdade”, disse. “Minha relação com os generais e os demais militares é de parceria e compromisso com o projeto de mudar o Brasil. Quem falou isso [de desentendimentos] é, no mínimo, desinformado ou mal-intencionado”.