Quarta-feira, 19 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 2 de dezembro de 2019
O anúncio de que os EUA vão retomar as tarifas sobre o aço e o alumínio que chegam do Brasil e Argentina pegou de surpresa o governo brasileiro, enquanto analistas e integrantes da Casa Branca avaliam que o flerte entre Jair Bolsonaro e a China foi um agravante para a medida divulgada por Donald Trump.
Segundo membros do Itamaraty, não houve nenhum sinal nos últimos dias de preocupação por parte dos EUA sobre a situação do aço e alumínio importados do Brasil, nem mesmo durante passagem do ministro Paulo Guedes (Economia) por Washington, na semana passada.
Guedes esteve em reunião com empresários e o secretário de Comércio dos EUA, Wilbur Ross, na segunda-feira (25) e, de acordo com participantes dos encontros, o aço não foi um tema relevante nas conversas.
Em entrevista à rede de TV americana Fox Business, Ross disse nesta segunda (2) que “até nossos melhores aliados têm que viver sob as regras. Eu acredito que o presidente [Donald Trump] estava preocupado era com a a desvalorização do real e é justo considerar isso. Quanto menor o valor da moeda, mais barato as exportações. E ele achou que tinha que fazer algo à respeito”.
Desde a manhã desta segunda-feira (2), integrantes do governo brasileiro foram escalados para contatar a Casa Branca e o Congresso americano e tentar entender as razões que estimularam a decisão de Trump.
Além disso, pretendem explicar o funcionamento da política de câmbio e da indústria de aço no Brasil, na tentativa de fazer os EUA reverem a medida.
O presidente americano distorceu fatos nesta segunda ao dizer que Brasil e Argentina desvalorizam propositalmente suas moedas para tirar vantagem da alta cotação do dólar — o Banco Central brasileiro, porém, interveio na semana passada para tentar reduzir a desvalorização do Real.
A avaliação entre diplomatas brasileiros é que o anúncio de Trump é um novo — e forte — ingrediente que prejudica a imagem de boa relação que o Brasil tenta estabelecer com os EUA desde a eleição de Bolsonaro.
Antes da decisão do republicano, o USTR havia enviado à Casa Branca informações que tratavam da desvalorização das moedas de diversos países, inclusive no Brasil, e como isso poderia afetar produtores americanos.
O USTR é o escritório que cuida das relações comerciais dos EUA e o órgão do governo Trump mais reticente ao Brasil.
Em meio à guerra comercial que estabelece com a China e às vésperas da eleição em que tenta ser reconduzido ao comando da Casa Branca, Trump decidiu reforçar mais uma vez sua política econômica protecionista.
Setores exportadores do Brasil e da Argentina têm sido beneficiados com a alta do dólar e substituído americanos na venda de produtos para os chineses. Os argentinos, por exemplo, anunciaram recentemente que passarão a exportar farelo de soja para Pequim após duas décadas de negociação.
Bolsonaro esteve no mês passado com o líder chinês, Xi Jinping, em Brasília, para a reunião da cúpula do Brics, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Na ocasião, o presidente brasileiro afirmou que a potência asiática “cada vez mais faz parte do futuro do Brasil” e que pretendia diversificar as relações comerciais com o país.
Os EUA também têm pressionado o Brasil contra a entrada da empresa chinesa Huawei no mercado de 5G. Ainda em novembro, Bolsonaro se reuniu com o presidente-executivo da Huawei no Brasil, Wei Yao, e disse que a gigante havia mostrado interesse no país — o leilão de 5G deve ser realizado no segundo semestre de 2020.
O ministro Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia), por sua vez, disse em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que o Brasil não imporia restrições a nenhuma tecnologia, nem à chinesa.
Desde a eleição de Bolsonaro, criou-se em Washington uma espécie de guichê de boa vontade quando o assunto sobre a mesa tem o carimbo do Planalto, mas é consenso mesmo entre integrantes do governo brasileiro que a prática não vai se sobrepor a interesses políticos e econômicos dos EUA, muito menos às vésperas da eleição americana.