Sexta-feira, 07 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 20 de janeiro de 2019
As críticas internacionais ao modelo de investigação criminal no Japão têm sido proporcionais ao período de detenção de Carlos Ghosn. O ex-presidente do conselho de administração da Nissan está desde 19 de novembro no Centro de Detenção de Tóquio, e teve sua prisão prorrogada por mais dez dias após nova denúncia apresentada pela Promotoria japonesa.
Os dois primeiros pedidos de prisão foram por violação da Lei de Instrumentos Financeiros e o mais recente, por crime de abuso grave de confiança. Ghosn é acusado de má conduta no comando da Nissan.
As suspeitas são de que tenha ocultado parte de sua renda e temporariamente transferido à empresa perdas por investimentos pessoais e, mais recentemente, foi acusado de ter recebido, de modo impróprio, US$ 9 milhões da joint-venture entre a Nissan e a Mitsubishi Motors. Ele tem negado todas as acusações. No último dia 15, o executivo de origem brasileira teve um recurso por pedido de liberdade condicional rejeitado pela Justiça de Tóquio.
“Em que pese a Justiça japonesa ser considerada leniente por especialistas em termos de penas e encarceramento [menos de 5% dos suspeitos formalmente identificados chegam a cumprir pena de prisão, por exemplo], a fase investigatória tem sido criticada dentro e fora do país há décadas”, afirmou o advogado Eduardo Mesquita, mestre e doutorando em Direito Comercial na Universidade de Tóquio e membro do Grupo de Pesquisa em Direito Comparado Brasil-Japão.
Os críticos questionam o longo período que o suspeito pode ficar preso sem ser formalmente acusado, o acesso bastante restrito aos advogados e os métodos utilizados no interrogatório. “Eles destoam dos procedimentos criminais na maioria dos países desenvolvidos e são vistos por muitos como violações de direitos humanos”, diz Mesquita.
Antes de oferecida a denúncia, a polícia tem 48 horas para enviar o acusado à Promotoria, que terá então 24 horas para pedir a prisão do suspeito. O período de detenção de dez dias geralmente é prorrogado, pois os tribunais costumam autorizar os pedidos da Promotoria em 95% dos casos, como aconteceu com Carlos Ghosn. “No Japão, interrogam o suspeito até obter uma confissão”, afirmou Mesquita.
A mulher de Ghosn enviou uma carta à ONG Human Rights Watch com a intenção de expor as condições de prisão de seu marido. No texto de nove páginas, Carole Ghosn classifica o modelo judicial japonês como “sistema de reféns, e afirma que detenções prolongadas para extrair confissões são uma das principais táticas de investigação da Promotoria”. “O tratamento ao meu marido é um caso digno de estudo sobre a realidade deste sistema draconiano”, disse.
“Durante horas, todos os dias os promotores o interrogam, intimidam e repreendem longe da presença de seus advogados, a fim de conseguir uma confissão”, destacou.
Na semana passada, o ex-presidente do conselho da Nissan não compareceu à segunda audiência devido à febre alta. Segundo Carole, o marido perdeu quase três quilos em duas semanas, com refeições principalmente à base de arroz e cevada.
Carlos Ghosn não pode receber familiares, mas tem se encontrado com representantes diplomáticos do Brasil, França e Líbano. Em resposta às críticas, o vice-procurador-chefe japonês, Shin Kukimoto, disse em entrevista coletiva que “cada país tem seu próprio sistema [judicial] baseado em sua história e cultura. Não acho que seja apropriado criticar outra jurisdição só por ter um sistema diferente”.