Sexta-feira, 24 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 11 de setembro de 2020
A morte do estudante de Direito e taxista Javier Ordóñez, de 46 anos, reacendeu o debate sobre o uso excessivo da força e a brutalidade policial na Colômbia. De acordo com Sebastián Lanz, codiretor da ONG Temblores, que monitora casos de violência institucional, nos últimos três anos houve um aumento nos casos de abuso e violência policial, principalmente após a aprovação de uma nova legislação para a atuação da polícia colombiana e a posse do presidente Iván Duque, do conservador Centro Democrático.
“Notamos que os casos [de violência policial] aumentaram drasticamente desde 2017, quando o Novo Código Policial entrou em vigor, e desde que Duque assumiu o poder, em 2018. Também notamos que as interações entre policiais e civis se tornaram mais letais, com a polícia passando a utilizar estratégias perigosas, como dar armas a civis, ou sair sem identificação no patrulhamento das ruas. Essas práticas põem em extremo perigo o Estado de direito e são comuns nas ditaduras”, afirmou Lanz.
A situação se agrava pela sensação de impunidade pela falta de julgamentos de crimes cometidos por agentes, segundo o codiretor da ONG. Apesar dos casos serem julgados tanto nos tribunais criminais quando em nível disciplinar, na própria corporação, são poucos os processos cujos resultados são a favor das vítimas e suas famílias.
“Nenhum deles garante que as vítimas tenham acesso efetivo à Justiça. A impunidade é regra quando se trata da busca pela Justiça para quem foi assassinado, agredido sexual ou fisicamente por policiais. E isso acontece em parte porque todos os casos são julgados pelo sistema de Justiça criminal militar, que já é projetado para que os criminosos escapem impunes”, afirma Lanz.
Javier Ordóñez morreu após receber diversos choques de dois agentes que usavam uma arma tipo taser, mesmo após já estar caído ao chão. O caso mobilizou protestos em diversas cidades colombianas, que resultaram na morte de pelo menos 10 pessoas e em centenas de feridos.
Nas manifestações também houve abusos por parte da polícia, segundo denunciaram organizações civis. De acordo com relatório da Temblores, mais de 150 atos de agressão física foram cometidos pela corporação entre a noite da última quarta-feira e a madrugada de quinta, além do “uso indiscriminado de armas de fogo; uso de equipamentos não convencionais (como cassetetes e paus); troca e entrega de armas de fogo a civis; a presença de agentes não identificados nas ruas, e a ocultação de placas de identificação por agentes da Polícia Metropolitana de Bogotá”.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) também condenou a polícia colombiana pela morte de Ordóñez e pela forma com que tentou conter os protestos no país, fazendo uso excessivo da força.
“A CIDH enfatiza que o uso da força pelas forças de segurança do Estado deve seguir os princípios da legalidade, necessidade, razoabilidade e proporcionalidade, colocando a proteção dos direitos de todas as pessoas em primeiro lugar”, disse a comissão em um comunicado divulgado no Twitter. “A CIDH lembra ao Estado seu dever de garantir o direito à vida, à integridade e à liberdade de manifestação. Atos isolados de violência não ameaçam a ordem pública do movimento social que exerce seus direitos de liberdade de expressão, reunião e associação.”
A própria prefeita da capital colombiana, Claudia López, recriminou o uso excessivo da força pela corporação e pediu uma reforma estrutural na polícia. A representante do partido progressista Aliança Verde informou que, só este ano, a prefeitura recebeu 137 denúncias de abuso policial cometido pela Polícia Metropolitana de Bogotá — entre os relatos, a maioria é de agressões físicas e morais, mas há também acusações de ameaças, abuso psicológico e até uma de homicídio.
Já no relatório da Temblore, a Polícia Nacional, força militar que atua em todo território colombiano, cometeu pelo menos 170 agressões a civis. Entre 2017 e 2019, a ONG teve o registro de 639 homicídios, 40.481 agressões físicas e 241 crimes sexuais cometidos pela corporação.