Segunda-feira, 08 de setembro de 2025
Por Redação O Sul | 7 de setembro de 2025
O cientista político Fernando Schüler avalia que o Supremo Tribunal Federal (STF) se tornou um “Poder Moderador”, instância da época do Império que tinha a prerrogativa de interferir nos demais Poderes. Ele considera que o Supremo tem tomado decisões que cabem ao Congresso Nacional.
“O Brasil precisa reencontrar o caminho institucional de retomada do Estado de Direito. O Estado de Direito é a nossa proteção”, afirmou Schüler.
O cientista político avalia ser inegável que houve movimentos para uma virada de mesa após a eleição de 2022, mas vê problemas na condução do processo contra Jair Bolsonaro (PL) feita pelo STF, assim como no caso dos condenados pelo 8 de Janeiro.
“Tudo isso cria um caldo, digamos assim, jurídico e político para uma discussão como a da anistia.”
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Pela primeira vez temos um ex-presidente sendo julgado no STF por uma tentativa de golpe. O que isso nos diz sobre a democracia brasileira?
Passamos por um momento de instabilidade, de tensão na nossa democracia. Efetivamente, no final de 2022, houve movimentações na direção de uma virada de mesa. Isso é inegável. O próprio advogado do ex-presidente Bolsonaro reconhece isso. E os fatos são conhecidos. Muita gente, não só as pessoas que acampavam na frente dos quartéis, pedindo generais, uma virada de mesa.
Isso vem muito da tradição autoritária brasileira. Você tem essa ideia de que, de alguma maneira, o general vai resolver o problema. Nós vamos ter um atalho autoritário para corrigir a democracia. Houve, dentro do próprio Palácio, conversas nesse sentido. Aquela conversa do então presidente com comandantes militares, a consulta, a ideia de um estado de defesa, a ideia de uma GLO. Tem algumas questões a partir deste fato. E este fato vai ser objeto de muita análise durante muito tempo.
Como chegamos nesse ponto? Óbvio que teve problemas nas eleições. Óbvio que há um processo de muita flexibilização das normas do Estado de Direito, teve muita censura no País. E teve esse lado de tentativa, especulação ou cogitação de virada de mesa.
Também há problemas no processo. Aquelas pessoas, especialmente o ex-presidente, não têm foro por prerrogativa de função. Isso parece um detalhe. No Brasil, a gente talvez tenha uma tradição de não nos preocuparmos devidamente, ou darmos a devida atenção, às formalidades republicanas. E as formalidades republicanas são essenciais numa democracia liberal-constitucional. Na minha impressão, e eu me lembro até da avaliação feita pelo ex-ministro Marco Aurélio Mello, o próprio ministro Fux. Primeiro, deveria ter sido respeitada a instância devida. Me parece básico isso.
Há uma discussão jurídica, que eu acho que é o cerne da discussão do julgamento do Bolsonaro. Que houve articulações, cogitações, conversas, consultas, é inegável. Que isto configure crime no sentido da tipificação no Código Penal, da Lei de Defesa da Democracia? O presidente faz uma consulta aos comandantes militares. A Procuradora-Geral da República interpreta, no fundo, a consulta já como o curso do golpe, o curso da virada de mesa. Há outros juristas que encaram isso como atos preparatórios, atos preliminares. Não teria sido dada a ordem, teria havido um recuo.
Isso não está em questão objetiva no julgamento, porque acho que a decisão está tomada. A Primeira Turma tem uma posição fixada, seja por maioria ou unanimidade. Mas será objeto de muita reflexão no direito, na historiografia, na ciência política brasileira por muito tempo. Com informações do portal Estadão.