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Você viu? Conheça o brasileiro negro que desafiou o racismo nos Estados Unidos há quase 200 anos

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A família Mundrucu não aceitou ser barrada de uma área exclusiva para brancos no navio Telegraph. (Foto: BBC)

Era um dia frio e chuvoso de novembro de 1832 quando o imigrante brasileiro Emiliano Mundrucu entrou no barco a vapor Telegraph com sua mulher Harriet e sua filha Emiliana, de apenas um ano. Segundo registros históricos, a família acompanhava o brasileiro em uma viagem a trabalho da costa de Massachusetts, no Nordeste dos Estados Unidos, até a ilha de Nantucket.

Durante a travessia, Harriet, que se sentia mal, tentou buscar abrigo com sua filha numa área do navio exclusiva para mulheres — mas as duas foram barradas. O motivo? Eram negras, e a “cabine de senhoras”, um ambiente confortável com beliches privativos, só permitia mulheres brancas.

Naquele momento, práticas segregacionistas separando brancos das pessoas “de cor” cresciam no Norte dos Estados Unidos, onde a escravidão já não era permitida como no Sul do país. O objetivo era manter a ideia de inferioridade dos negros mesmo após sua libertação, preservando a estrutura de privilégios e dominação em favor dos brancos.

Esse sistema se intensificou pelo país após a completa abolição da escravidão em 1865, em um regime formal de segregação que só foi proibido pelo Congresso americano um século depois, em 1964, após intensa luta negra por direitos civis.

Muito antes, porém, a família Mundrucu, de pele parda, não aceitou passivamente ser barrada e o episódio acabou dando origem a um processo judicial pioneiro contra a segregação racial nos Estados Unidos.

A ação impetrada em nome do brasileiro repercutiu amplamente na época, mas depois caiu no esquecimento e apenas nos últimos anos foi redescoberta por historiadores.

O caso foi parar na Justiça depois que Harriet insistiu em entrar no local com sua bebê, enquanto Mundrucu discutia com o capitão do barco, Edward Barker.

“Sua mulher não é uma senhora. Ela é uma N*”, disse o capitão a Mundrucu, usando uma expressão extremamente ofensiva para denominar pessoas negras.

O impasse chegou a ser momentaneamente interrompido porque uma tempestade obrigou o barco a retornar à costa. Ao voltar à embarcação no dia seguinte, no entanto, o casal tentou mais uma vez que Harriet e Emiliana viajassem protegidas, ao invés de usarem a cabine da parte da frente do navio, um ambiente comum para homens e mulheres em que os passageiros tinham que dormir em colchões, direto no chão molhado.

Mundrucu argumentava que elas tinham direito ao local mais confortável porque ele havia pago a tarifa mais cara para a viagem. Diante da irredutibilidade do capitão, que mandou a família descer do barco, o brasileiro anunciou que levaria o caso à Justiça.

De acordo com os arquivos do processo, Mundrucu prometeu “go and get a writ out immediately” — expressão que poderia ser traduzida na linguagem atual para: “Nos vemos no tribunal”.

Foi assim que teve início em Boston, capital de Massachusetts, um processo movido por Emiliano Mundrucu contra o capitão Edward Barker, por quebra de contrato, caso que recebeu cobertura na primeira página de jornais de Estados como Nova York, Pensilvânia, Maryland e Carolina do Norte e repercutiu até na Europa.

O renomado abolicionista inglês Edward Abdy, por exemplo, condenou a “aristocracia da pele” de Boston ao reportar o caso para a imprensa britânica, conta o historiador sul-africano Lloyd Belton, que em dezembro publicou um artigo sobre a batalha judicial de Mundrucu na revista acadêmica Slavery & Abolition.

Belton estudou a vida de Mundrucu em seu mestrado na Universidade de Columbia (EUA) e agora aprofunda sua pesquisa em um doutorado na Universidade de Leeds (Reino Unido).

Embora pouco conhecido hoje, ele diz que o processo movido pelo brasileiro é a ação mais antiga contra segregação racial que se tem informação até o momento nos Estados Unidos. Até essa descoberta, a historiografia sobre o tema indicava que esses processos começaram mais tarde, no início dos anos 1840.

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