Sábado, 25 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 5 de setembro de 2022
Cristian Yanzer apresenta uma das partes do motor do F-5 recuperada na expedição.
Foto: DivulgaçãoEm 28 de julho de 1982, dois caças F-5 do Esquadrão Pampa da Força Aérea Brasileira decolavam para uma missão de combate aéreo, operação de rotina da unidade. As aeronaves voaram para uma das áreas de treinamento sobre a Lagoa dos Patos e começaram o combate.
Em um dos F-5, de matrícula FAB 4831, estava o Tenente Aviador Edson Luiz Chiapetta Macedo. Aquele seria seu último voo. Em algum momento do treinamento, por motivos ainda não bem esclarecidos, a aeronave mergulhou na Lagoa.
O outro F-5 regressou à Canoas e a FAB iniciou as buscas imediatamente. Durante duas semanas, a Força Aérea, a Polícia e o Corpo de Bombeiros procuraram pelo F-5, achando apenas pequenos pedaços. O destino do FAB 4831 e do Tenente Edson Chiapetta permaneceram um mistério por décadas.
O piloto comercial gaúcho Cristian Yanzer encontrou no esporte de velejar uma atividade complementar à profissional onde muito conhecimento se poder aproveitar: navegação, previsão do tempo, aero e hidrodinâmica entre outros muitos conceitos valiosos. Há mais de 8 anos, ele vem singrando as águas do Guaíba, da Lagoa dos Patos, da Lagoa do Casamento e da Lagoa Mirim no seu tempo livre simplesmente pelo prazer de explorar regiões pouco conhecidas no Rio Grande do Sul mas muito admiradas por navegadores. Por isto, ao construir seu veleiro atual, intitulado “Vikyng”, tomou todos os cuidados para que pudesse explorar as águas de nosso Estado com conforto e toda tecnologia possível. Um dos itens à bordo que permite uma navegação diferenciada é o sonar com tecnologia Side Scan.
Este recurso, o sonar com Side Scan, permite que através de ecos de ondas ultrassônicas, se possa literalmente enxergar o fundo do leito de rios, lagos, lagoas e até mesmo do mar. No meio náutico, Cristian é conhecido por sua grande contribuição espontânea na atualização dos levantamentos batimétricos da cartas de navegação (como os navegadores chamam os ‘mapas’ que utilizam), o que deixa as cartas mais atualizadas e a navegação mais segura. Justamente por esta dedicação em navegar por lugares que normalmente não estão tão bem cartografados e com os recursos de visualização do fundo, muitos naufrágios e outros itens submersos foram identificados ao longo de suas aventuras.
Conhecedor profundo de história, um mistério “local” sempre o intrigou, especialmente por ser piloto: o que teria realmente acontecido com o caça F-5 do Tenente Aviador Chiapetta em 1982? Onde estariam os destroços do avião?
Por mais de 5 anos, Cristian procurou com muito empenho os locais dos destroços na Lagoa dos Patos baseando-se em informações das mais diversas fontes, muitas delas apenas meras suposições. Ao longo deste tempo foi garimpando e estudando cada detalhe do fundo de uma enorme área de aproximadamente 180km2, com profundidades entre 2 e 10 metros. Como os fragmentos da aeronave submersa estiveram por 40 anos se acomodando no leito da lagoa, a visualização pelos equipamentos de sonar modernos não seria tão trivial. O que parecia promissor na análise visual muitas vezes se mostrou como sendo apenas alguns troncos de madeira ou outros tipos de matéria orgânica que são esperados neste ambiente.
Assim, ao longo do tempo, Cristian conversou com muitas pessoas explicando o acidente de 1982 e pedindo informações aos que tinham experiência em navegação na região, em especial aos pescadores que informavam que algumas vezes tinham redes rasgadas por algum objeto grande no fundo da lagoa. Com o local aproximado de tais episódios, Cristian e sua esposa Andrea Spöttl se deslocavam até os pontos informados e faziam mais uma expedição de busca. Inúmeras foram as situações em que isto aconteceu sem o tão esperado encontro com o F-5 da Força Aérea Brasileira.
No final de julho de 2022, um pescador de Palmares do Sul, Josoé Ortiz, amigo de Cristian, viu suas redes de tainha se prenderem em algum objeto submerso. Quando as trouxe para a superfície, encontrou pequenas peças que achou que poderiam ser do caça desaparecido. Sabendo que Cristian procurava por pistas do F5, Josoé mandou algumas imagens das peças que estavam na rede e a localização aproximada do local.
Na primeira oportunidade possível, dentro dos compromissos profissionais e das possibilidades da meteorologia, no dia 11 de agosto de 2022 o veleiro Vikyng mais uma vez se deslocou para a Lagoa dos Patos com sua tripulação preparada para mais uma expedição.
Reflexos metálicos visíveis na tela do equipamento indicavam muitas peças, algumas grandes, espalhadas pelo leito da Lagoa, em um local distinto do esperado e a cerca de 100m do local onde suas redes estavam colocadas. A própria recuperação da âncora do veleiro trouxe partes de um dos motores do F5 para a superfície, deixando ainda mais evidente o o sucesso desta última expedição.
Com as imagens de sonar, as peças coletadas pelo pescador Josoé Ortiz e pelo comandante Cristian Yanzer, o 5º Comando Aéreo Regional foi acionado e prontamente se organizou para dar continuidade na recuperação da aeronave em em ação conjunta com a Marinha do Brasil.
O grande resultado desta missão é resgate da memória do aviador e um alento ao coração dos familiares que nunca souberam com precisão o que ocorreu naquela triste ocasião. E o que permanecerá firme é a união entre os que navegam pelas águas do sul, correndo riscos e enfrentando os perigos que a mãe natureza impõe.