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Comportamento Especialista em ignorância, historiador inglês analisa como ela é perigosa e enfraquece a democracia

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Burke escolheu como epígrafe uma frase do político brasileiro Leonel Brizola: “A educação não é cara. Cara mesmo é a ignorância.”

Foto: Reprodução
Burke escolheu como epígrafe uma frase do político brasileiro Leonel Brizola: “A educação não é cara. Cara mesmo é a ignorância.” (Foto: Reprodução)

Por mais de duas décadas, o historiador britânico Peter Burke, de 87 anos, investigou a origem do conhecimento e escreveu obras fundamentais sobre o tema, como “O polímata: uma história cultural de Leonardo da Vinci a Susan Sontag”. Com o tempo, passou a se interessar pela agnotologia – termo que descreve o estudo da ignorância – e, em 2023, lançou “Ignorância”, livro no qual analisa os impactos da ausência de conhecimento em diversos campos, como política, ciência, religião e negócios.

Na obra, Burke escolheu como epígrafe uma frase do político brasileiro Leonel Brizola: “A educação não é cara. Cara mesmo é a ignorância.” O livro traz vários exemplos ligados ao Brasil, como a destruição de florestas para o plantio de soja e políticos que desconhecem o preço do pão. Sobre Jair Bolsonaro, escreve que ele “sofre de ignorância em sua forma aguda, a de nem mesmo saber que ele nada sabe”.

Burke conhece bem o Brasil. É casado com a historiadora brasileira Maria Lúcia Pallares, também professora de Cambridge, com quem escreveu um livro sobre o sociólogo Gilberto Freyre. Há quarenta anos, visita o país duas vezes por ano.

Depois de mais de 20 anos estudando a história do conhecimento, o historiador percebeu que era possível estagnar ao insistir sempre no mesmo tema. Em busca de uma nova abordagem, decidiu inverter a lógica e investigar a história da ignorância. Definiu-a como ausência de conhecimento, o que apresentou desafios metodológicos – afinal, como escrever a trajetória de uma ausência?

A ignorância, segundo Burke, pode ter efeitos profundos na sociedade. Quando presente nos detentores do poder, é particularmente perigosa. E quando se alastra entre os cidadãos, tende a enfraquecer a democracia. A falta de informação adequada sobre os problemas do país ou sobre as diferenças entre partidos políticos pode levar o eleitor a fazer escolhas imprudentes, das quais talvez se arrependa mais tarde.

Ele alerta que assumir que determinados grupos – como os eleitores de Donald Trump – são ignorantes não explica suas escolhas. Trump se apresenta como um homem comum, que usa boné de beisebol, gosta de hambúrguer e promete reindustrializar o país. Muitos eleitores o veem como alguém que representa seus interesses. Segundo Burke, todos tendem a votar de acordo com o que consideram ser melhor para si. Intelectuais, por vezes, classificam essas decisões como irracionais, desprezando preferências que não compartilham.

Ao longo de suas mais de cinco décadas de atuação, Burke também observou mudanças no papel do intelectual. Historicamente, esperava-se que intelectuais provocassem reflexões e até choques. Hoje, no entanto, há mais pessoas tentando desempenhar esse papel, nem sempre com a formação necessária. Para ele, não basta causar impacto – é preciso oferecer ideias novas.

Burke também destaca a valorização crescente de conhecimentos antes marginalizados, como os saberes de povos não europeus. Ele prefere usar o termo no plural – “conhecimentos” – para abarcar diferentes culturas e formas de saber, acadêmicas ou não. Reconhecer que o outro também possui conhecimento é, segundo ele, um exercício de humildade que se impõe a todos, inclusive aos próprios intelectuais. Avaliar diferentes formas de saber a partir de um único ponto de vista é problemático e revela uma postura arrogante.

A ignorância, aponta o historiador, pode ser intencionalmente produzida. Embora concorde com o conceito de “produção da ignorância” usado por sociólogos, discorda de alguns exemplos. Um deles é o caso das empresas de tabaco que esconderam a relação entre cigarro e câncer. Para Burke, o público não criou a ignorância por si só, mas foi mantido nela. A discussão sobre como as elites mantêm os trabalhadores na ignorância é antiga. No século XVII, o protofeminismo já falava sobre como os homens impediam o acesso das mulheres ao conhecimento como forma de controle. Esse tipo de estratégia ainda é adotado por governos atualmente.

As fake news, embora pareçam um fenômeno recente, têm raízes históricas profundas. A expressão é contemporânea, mas a prática de disseminar informações falsas existe desde que os humanos começaram a se comunicar. Na Grécia Antiga, já se questionava a confiabilidade de Heródoto como historiador. A diferença está nos meios: redes sociais possibilitam que mentiras se espalhem pelo mundo com uma velocidade jamais vista antes.

(Com O Globo)

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