Domingo, 07 de setembro de 2025
Por Redação O Sul | 15 de dezembro de 2019
Comandante do Exército nos governos Dilma Rousseff e Michel Temer, o general Eduardo Villas Bôas faz em entrevista exclusiva ao Jornal O Globo a avaliação de que o país correu risco institucional entre o impeachment e a divulgação dos diálogos da JBS. “Fiquei bem preocupado”, disse, a respeito das reações dentro e fora dos quarteis quando os áudios com Temer vieram a público. O general de 68 anos conta que elaborou teses baseadas na Constituição e na estabilidade dos Poderes para circunscrever a ação do Exército em uma eventual crise institucional. Vítima de uma rara doença neuromotora de caráter degenerativo, Villas Bôas respira com ajuda de aparelho e se locomove em cadeira de rodas. Confira melhores momentos da entrevista.
1) Houve algum risco de decretação de “Estado de Defesa” durante o impeachment da presidente Dilma Rousseff?
Esse episódio ganhou uma versão que não é totalmente verdadeira. Ao longo do processo de impeachment, dois parlamentares de partidos de esquerda procuraram a assessoria parlamentar do Exército para sondar como receberíamos a decretação de um “Estado de Defesa” (possibilidade constitucional na qual o presidente decreta por 30 dias situação emergencial restringindo direito de reunião e de comunicação). Confesso que fiquei preocupado, porque vi ali uma possibilidade de o Exército ser empregado contra as manifestações. Contudo, corre uma versão de que a presidente Dilma teria me chamado e determinado a decretação do “Estado de Defesa”, e eu teria dito que não cumpriria. Isso não aconteceu. Mas que houve a sondagem, ela de fato houve.
2) Houve algo além da sondagem?
Não. Absolutamente.
3) Em abril de 2018, quando o Supremo discutia a possibilidade do habeas corpus para evitar a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o senhor escreveu no seu Twitter: “Nessa situação em que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do país e das gerações futuras e quem está preocupado com interesses pessoais”. O STF acabou concluindo por recusar o HC do ex-presidente. O senhor acha quer alterou a votação do Supremo?
Sinceramente, não acredito que a ministra Rosa Weber tenha mudado o seu voto em função da minha declaração. Foi uma preocupação que se desencadeasse um processo de impunidade, que a palavra-chave desse tuíte foi impunidade. E também teve a intenção, primeiro de manifestar o pensamento do Exército e, segundo, também de conformidade com a vontade da população. Eu sabia que havia riscos desse tuíte, tanto que no dia seguinte o ministro Celso de Mello (decano do STF) nos chamou de “pretorianos”. Eu sabia que alguma reação corporativa deveria haver e até achei que ficou barato.
4) Quando o senhor revê esses episódios encadeados, havia risco de retrocesso institucional?
Acho que risco de retrocesso institucional, pelo menos naquele momento (julgamento de Lula), não havia, mas temia que aqueles acontecimentos desencadeassem uma instabilidade de ordem pública que, aí sim, pudessem levar para… Nós tínhamos na memória as manifestações de 2013, algo que esteve na iminência de fugir ao controle. Então o Twitter teve um caráter preventivo.
5) Em outubro, o deputado Eduardo Bolsonaro falou em AI-5 como reação a uma suposta radicalização da oposição e, em novembro, o ministro Paulo Guedes foi na mesma toada. Qual a sua avaliação?
O Brasil hoje é um país que conta com instituições amadurecidas, portanto dispensa o uso de mecanismos não constitucionais.
6) O governo Bolsonaro tem muitos militares e o próprio presidente tem uma persona militar. Como fazer agora a distinção entre as Forças Armadas e o governo?
Temos que distinguir bem os militares que estão no governo do Exército. O atual comandante do Exército, general Edson Pujol, tem adotado postura muito adequada de baixo perfil. Isso faz marcar bem o espaço que existe entre governo e Exército.