Terça-feira, 16 de dezembro de 2025
Por Redação O Sul | 4 de junho de 2020
Há quase um ano fora do governo, o general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz, exonerado da função de ministro-chefe da Secretaria de governo da Presidência em 13 de junho de 2019, observa um ambiente no País que é prejudicial para a imagem das Forças Armadas.
Em entrevista ao jornal O Globo, Santos Cruz considerou recentes declarações do Procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras, sobre o suposto “papel moderador” das Forças Armadas em eventuais conflitos entre poderes uma “interpretação perigosa, que dá margem para derivações e interpretações por conveniência”.
Santos Cruz enfatizou na necessidade de esclarecer que posições de ministros e autoridades que vêm do mundo militar “não representam a posição das Forças Armadas” e admitiu que a expressiva presença de militares no governo cria confusão.
1) O PGR, Augusto Aras, disse esta semana que as Forças Armadas teriam um papel moderador em um eventual conflito entre poderes. O que o senhor opina sobre isso?
Essa interpretação de que Forças Armadas são um poder moderador é completamente equivocada. O nosso elemento moderador é a Constituição federal, não são as Forças Armadas. Essa interpretação é extremamente perigosa, porque ela dá margem até a derivações e interpretações por conveniência etc. Então eu não acho conveniente e acho equivocado esse tipo de interpretação. Causa confusão. A harmonia dos Poderes é uma obrigação da Constituição. A população quer segurança, que assistir as ações do governo com tranquilidade e não com esse tipo de possibilidade de interpretação. A harmonia entre os Poderes não tem nada a ver com Forças Armadas, ela deve partir da boa vontade. Eles (os Poderes do Estado) são os que têm que resolver. A população espera uma discussão de alto nível. Discordância faz parte da democracia, por que se tem uma discordância já tem que falar em Forças Armadas?
2) A referência permanente às Forças Armadas está relacionada, entre outros motivos, à presença expressiva de militares no governo Bolsonaro. São quase três mil militares em cargos públicos, algo inédito desde 1985, incluindo nosso atual ministro interino da Saúde que, aliás, não tem experiência na área, ou tem?
Não, nenhuma. Ele é especializado em outra área, na de logística.
3) E acaba de ser confirmado como ministro interino da Saúde…
Essa situação é temporária, ao menos é o que diz o governo. Mas é uma área muito importante, para especialistas, espero que essa interinidade seja temporária. É uma função que exige muita especialização, contato com a comunidade científica, médica, protocolos de saúde, medicamentos, equipamentos médicos, é uma coisa muito especializada.
4) Essa presença expressiva dos militares no governo, em momentos em que um setor da sociedade fala em intervenção militar nas ruas, em manifestações nas quais o presidente participa e também alguns de seus ministros militares, isso gera confusão…
Sem dúvida, pelo número de pessoas e pelas atitudes isso pode confundir e existe essa confusão. É preciso desmanchar isso. Essa confusão de imagem institucional com assuntos de governo. A associação da imagem das Forças Armadas com os assuntos corriqueiros de governo, essas discussões todas de Executivo com STF, não está acontecendo nada de excepcional. Então acho até leviandade associar as Forças Armadas com assuntos que são corriqueiros. O processo democrático é feito desse jogo de pressões. Mas compete somente a eles arrumar uma solução. Essas pessoas (militares que exercem funções no governo) não representam a instituição, não interessa o grau hierárquico. Quem representa politicamente as Forças Armadas é o ministro da Defesa e os comandantes. O pessoal da reserva pode ter a sua opinião, mas não tem nenhuma representatividade institucional.