Sexta-feira, 06 de junho de 2025
Por Redação O Sul | 4 de junho de 2025
Aprovada no ano passado por um Congresso dominado pelo governo, a controversa reforma do Judiciário no México teve, no último fim de semana, seu capítulo mais relevante até agora.
Em todo o país, mexicanos foram às urnas para, num evento sem precedentes no mundo, eleger centenas de juízes e magistrados de tribunais regionais e federais, bem como os nove membros da Suprema Corte. Mais de 2,6 mil cargos estavam em jogo.
O resultado desse experimento insólito só deverá ser conhecido em 15 de junho, quando a complexa contagem de votos do processo for concluída.
Por ora, a presidente do México, Claudia Sheinbaum, afilhada política do ex-presidente Andrés Manuel López Obrador (Amlo), o líder populista por trás da reforma do Judiciário, classificou a eleição de “êxito”, “impressionante” e “democrática” e festejou os 13 milhões de mexicanos que participaram do processo.
Ocorre que esses 13 milhões equivalem a apenas 13% dos 99 milhões aptos a votar para juiz. Ou seja, o experimento não tem respaldo popular.
Motivos para o desinteresse não faltam. A maioria dos milhares de candidatos era totalmente desconhecida para a população. A qualidade dos postulantes também era bastante duvidosa – em vídeos que viralizaram nas redes sociais, vê-se que os candidatos a juízes protagonizaram momentos constrangedores dignos da tradição política latino-americana. Por fim, as cédulas eleitorais abarrotadas de nomes não eram nada estimulantes aos votantes.
Por mais que Sheinbaum afirme que tudo foi “maravilhoso” e será aperfeiçoado para a nova rodada de eleições judiciais, agendadas para 2027, esse processo é um desatino do início ao fim.
Para além da baixa participação popular e do caráter anedótico da campanha, a eleição direta para magistrados, como corretamente apontaram a oposição e especialistas, põe em risco o Estado Democrático de Direito, já que os freios para que o Morena (partido de Amlo e Sheinbaum) influa na escolha dos magistrados tornam-se inexistentes.
Também é grande a preocupação com a possibilidade de que o crime organizado mexicano, conhecido pelo enorme poderio financeiro, eleja juízes simpáticos à sua causa, o que, em vez de promover “justiça para o povo” e o fim da corrupção no Judiciário, como prometeu Amlo marotamente, apenas facilitará a vida de bandidos sanguinários.
Não se desconhece o fato de que mundo afora há um movimento de insatisfação popular com o Poder Judiciário, não só porque é papel da Justiça fazer valer a lei, o que muitas vezes contraria interesses poderosos, como porque em países como o Brasil não são raras as situações em que os juízes extrapolam suas competências. Mas o experimento mexicano, amplamente ignorado pela população, em nada melhorará a sensação de que a lei é seguida e de que a Justiça, como se espera, é cega.
A eleição direta de magistrados apenas exacerba o poderio econômico daqueles que, por terem recursos, podem comprar a lei. Pior, abre as portas para que barões do crime não sejam incomodados por absolutamente ninguém. (Opinião/Jornal O Estado de S. Paulo)