Sábado, 08 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 9 de dezembro de 2021
"Mas eu tenho a consciência de que não foi o meu ato que tirou a vida desses jovens", declarou Luciano Bonilha Leão
Foto: Juliano Verardi/TJ-RSO produtor da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Bonilha Leão, foi o primeiro réu interrogado no nono dia do julgamento dos acusados pelo incêndio na Boate Kiss, nesta quinta-feira (09), no Foro Central de Porto Alegre.
Chorando em vários momentos, ele confirmou que fazia a compra dos artefatos pirotécnicos que eram usados pelo grupo musical em suas apresentações. Luciano afirmou que foi ele que acionou o artefato que, em contato com a espuma aplicada no teto da boate, provocou o incêndio que matou 242 pessoas em Santa Maria em 27 de janeiro de 2013.
Segundo Luciano, o pedido de compra do artefato partiu de Danilo Jaques, o líder da banda, falecido no incêndio. O produto foi comprado na loja Kaboom. “Nunca tive essa informação”, declarou o produtor ao ser questionado se a pirotecnia poderia ser usada em ambientes fechados.
O réu explicou como foram montados os efeitos especiais para o show na Kiss na noite do incêndio. “Foram colocados dois [fogos de artifício], um em cada ponta do palco, e um terceiro era dado para o vocalista Marcelo de Jesus dos Santos”, revelou. Foi Luciano quem colocou a luva na mão do vocalista e pôs o artefato na mão dele. “Fui eu que acionei”, declarou.
Alguém avisou Luciano que estava pegando fogo na boate. Ele disse que tentou apagar o foco das chamas com água, mas o fogo se propagou. Uma pessoa pegou um extintor de incêndio debaixo do palco, tentou usar, mas não funcionou. Marcelo fez o mesmo, mas sem sucesso. Luciano disse que o extintor “não tinha lacre e parecia vazio”.
Ele afirmou que não ouviu ninguém da banda anunciar o fogo. “Eram 26 microfones no palco. Se os microfones estivessem abertos, lá do fundo teriam percebido o desespero”, declarou. Quando o tumulto já tinha se generalizado, Luciano disse que Danilo queria proteger a gaita. Mas Luciano aconselhou que seguissem em fuga.
Ele disse que as pessoas gritavam: “Abre a porta que está pegando fogo”. Luciano não soube dizer por que estava fechada. Quando a porta se abriu, veio uma força de vento, e a fumaça baixou. “Daí, eu fui indo e me prendi em um ferro no chão, rente ao bar. Pensei que seria esmagado.”
Luciano disse que não conseguia mais enxergar nem respirar e usou a camiseta para proteger o nariz. “Pedi a Deus, que me tirasse dali”, declarou. O produtor foi arrastado para fora da boate. Luciano disse que os bombeiros já estavam chegando. “Todo mundo se ajudando. Se não fosse isso, a tragédia seria muito maior.”
Ele também relatou que a boate estava cheia naquela noite: “Era muito apertado mesmo”. Luciano revelou que participou de cerca de 14 shows da banda e que houve uso de artefatos pirotécnicos em nove dessas apresentações. “Na Boate Kiss, foram de três a quatro shows. No palco novo, foram duas vezes usando artefatos pirotécnicos, se não me engano”, afirmou.
Luciano disse que não conhecia Elissandro Callegaro Spohr, o Kiko, sócio da casa noturna. Só foi conhecer o empresário no dia anterior à festa onde ocorreu no incêndio. Ele declarou que não acredita que Danilo não tenha comunicado o uso dos artefatos para o sócio da Kiss.
Ele não soube dizer qual era a relação de Mauro Londero Hoffmann com a boate. Luciano informou que a banda Gurizada Fandangueira já tocou na Absinto Hall, mas que não sabia que a casa noturna também era de Mauro.
Vítimas
“Eu sei que o coração dos pais não entende a minha dor. Se eu tivesse morrido lá, hoje aqui sentado, tenho a maior joia da minha vida, minha mãe. Ela está ali sentada com eles. Esses pais não têm mais o abraço, o carinho dos filhos. É legítimo deles lutar por justiça. Mas eu tenho a consciência de que não foi o meu ato que tirou a vida desses jovens. Se for para tirar a dor dos pais, estou pronto, me condenem”, disse.
Luciano afirmou que alguns familiares de vítimas o procuraram e o consolaram, por entenderem que ele também é uma delas. Emocionado, contou sobre os momentos em que passou na prisão e mostrou aos jurados a quantidade de medicamentos que toma após a tragédia. “Hoje, moro em um lugar em que ninguém me conhece. Meu choro é em casa.”
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