Quarta-feira, 14 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 7 de outubro de 2022
A isenção da passagem de ônibus se insere na chamada reserva da administração, que reúne as competências próprias de administração e gestão, imunes a interferência de outro poder, por serem privativas do chefe do Poder Executivo.
Assim entendeu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao reconhecer a inconstitucionalidade de uma lei de São José do Rio Preto, de autoria parlamentar, que instituía o passe livre no transporte público para gestantes carentes.
A decisão se deu em ADI proposta pelo Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Passageiros do Interior do Estado de São Paulo (Interurbano). O sindicato alegou que a lei resultou em aumento de custos operacionais para o sistema de transporte público, trazendo como consequência o aumento da tarifa, em prejuízo aos usuários.
Para o desembargador Aroldo Viotti, relator da ação, ao conceder isenção da passagem de ônibus para as gestantes carentes, a lei configurou interferência na gestão administrativa. “Em ofensa ao princípio da separação dos poderes, trata-se de invasão às atribuições exclusivas do chefe do Poder Executivo de dispor sobre a concessão de benefícios fiscais”, disse.
O relator afirmou que a norma ainda criou despesas públicas sem indicar os recursos para a execução: “A consecução das medidas demandará a alocação de recursos municipais, para subsidiar a isenção tarifária concedida à parcela da população, o que certamente implicará no aumento de despesas. Nesse cenário, era de rigor a indicação da fonte de custeio das medidas impostas pela indigitada legislação.”
Houve, na visão de Viotti, “concreta intromissão” na esfera de atuação do chefe do Poder Executivo por parte da Câmara Municipal de São José do Rio Preto, sobretudo porque a lei trata de planejamento, direção, organização e execução de questões administrativas, configurando típico ato de governo.
“Projetos de lei que versam programas de governo consistem em matéria inserida na denominada reserva de administração, manifestação própria do princípio da separação e harmonia de poderes”, finalizou o relator. A decisão foi por unanimidade.
Como o legislador delegou a regulamentação do tema às instâncias administrativas, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região validou a restrição da gratuidade de passagem para idosos de baixa renda nos ônibus interestaduais executivos.
O colegiado considerou legais os decretos do Executivo federal e as resoluções da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que garantem tal direito somente no transporte convencional.
O Ministério Público Federal questionou a negativa da gratuidade nas linhas executivas. Segundo o órgão, o governo federal descumpriu o artigo 40 do Estatuto do Idoso.
Tal dispositivo estabelece, no sistema de transporte coletivo interestadual, a reserva de duas vagas gratuitas por veículo para pessoas idosas com renda igual ou inferior a dois salários mínimos e desconto de ao menos 50% no valor das passagens para idosos da mesma faixa de renda quando as vagas gratuitas já tiverem sido preenchidas.
No ano passado, a 5ª Vara Federal de Porto Alegre julgou a ação improcedente e o MPF recorreu ao TRF-4.
A desembargadora Marga Inge Barth Tessler, relatora do caso, lembrou que o artigo 40 do Estatuto do Idoso também diz que “caberá aos órgãos competentes definir os mecanismos e os critérios” para a gratuidade e os descontos.
“O MPF quer discutir os critérios adotados pela agência reguladora e pelo Poder Executivo, se imiscuindo na própria discricionariedade técnica que a legislação conferiu aos réus”, apontou a magistrada. “Em outras palavras, pretende discutir o próprio conteúdo das normas regulamentares, mas sem nada tecer comentários sobre a delegação conferida pela lei”, complementou ele.