Quarta-feira, 24 de abril de 2024
Por Redação O Sul | 26 de novembro de 2020
Mais quatro estudantes com idades entre 13 e 14 anos foram indiciados na quarta-feira por envolvimento no assassinato do professor francês Samuel Paty, decapitado no dia 16 de outubro em Conflans-Sainte-Honorine, cidade próxima a Paris. Três dos adolescentes serão investigados por “cumplicidade em assassinato terrorista”: eles teriam indicado quem era Paty ao agressor, Abdoullakh Anzorov, em frente ao centro educacional onde o professor lecionava.
Já a quarta adolescente foi indiciada por “denúncia caluniosa”. De acordo com o jornal Le Monde, ela era aluna de Paty e filha de Brahim C., que começou uma campanha contra o professor. O pai também foi processado e preso por causa do assassinato.
Paty foi morto após mostrar caricaturas do profeta Maomé durante uma aula sobre liberdade de expressão — o uso de imagens de profetas é considerado idolatria e vetado na religião muçulmana. O professor, de 47 anos, foi decapitado ao sair do trabalho por Anzorov, um extremista religioso de origem russo-chechena. O agressor foi morto pela polícia após o crime.
Segundo Le Monde, a filha de Brahim não estava na aula em que Paty mostrou as caricaturas, no dia 6 daquele mês, mas esteve na véspera, quando o professor anunciou qual seria o conteúdo da aula seguinte. A adolescente afirmou que Paty teria dito que os alunos muçulmanos poderiam se ausentar, se quisessem, da aula seguinte. Depois, ela e o pai foram à delegacia prestar queixa contra o professor, no dia 7 de outubro.
Os quatro adolescentes foram detidos na segunda-feira e na terça, sob ordem de um juiz de instrução antiterrorista do Tribunal de Paris. Depois, foram liberados, mas vão continuar sob supervisão judicial até serem apresentados formalmente perante o tribunal, segundo informou uma fonte do Judiciário ao jornal francês.
Com esses quatro novos indiciamentos, sobe para 14 o número de pessoas acusadas de envolvimento na morte de Paty. Entre elas, seis são menores de idade — dois alunos de 14 e 15 anos já tinham sido indiciados por “cumplicidade em assassinato terrorista”, no dia 21 de outubro, por terem indicado o professor ao assassino em troca de “300 a 350 euros”, de acordo com o promotor antiterrorista, Jean-François Ricard.
O ataque, somado ao atentado em Nice em que três pessoas foram mortas a facadas, incluindo a brasileira Simone Barreto Silva, levou a França a elevar o estado de alerta a seu nível máximo, com o presidente Emmanuel Macron anunciando novas medidas antiterror e o deslocamento de milhares de soldados para aumentar a segurança de centros religiosos e escolas pelo país. As medidas geraram protestos em países de maioria muçulmana, com manifestantes defendendo o boicote de produtos franceses.
Os atentados também reforçaram projetos de Macron que têm causado controvérsia, como o que pretende “consolidar os princípios republicanos” — inicialmente apresentado como um projeto contra os “separatismos”, incluindo o islamista—, que será apresentado ao Conselho de Ministros em 9 de dezembro. O projeto inclui medidas como o recrudescimento dos controles das mesquitas e associações muçulmanas, dos apelos à violência e ao ódio nas redes sociais e do compromisso com os princípios da laicidade na educação nacional.
Um segundo projeto, já aprovado em duas votações na Assembleia Nacional, é chamado de Lei de Segurança Global e prevê medidas de incremento da segurança interna e de proteção aos policiais. A lei sofreu críticas principalmente por causa de seu artigo 24, que cria um novo delito: proíbe, sob risco de um ano de prisão e € 45 mil de multa, a exibição de imagens de policiais em ação com o propósito de “comprometer sua integridade física ou psíquica”.
Diante dos protestos de organizações de direitos humanos e jornalistas, o artigo foi aprovado com um adendo que diz que sua aplicação ocorrerá “sem prejuízo ao direito de informar”.