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Por Redação O Sul | 18 de junho de 2020
Ato do MEC, assinado por Weintraub, revoga portaria que estabelecia a necessidade de criação de políticas afirmativas nos cursos de pós-graduação.
Foto: Marcello Casal Jr./Agência BrasilA Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão do MPF (Ministério Público Federal), no Rio de janeiro, vai apurar a legalidade da Portaria do Ministério da Educação nº 45, de 16 de junho de 2020, publicada nesta quinta-feira (18) no Diário Oficial da União. O ato do MEC, ainda assinado por Abraham Weintraub, revoga a Portaria nº 13/2016, que estabelecia a necessidade de criação, naquele ano, de políticas afirmativas nos cursos de pós-graduação. O caso também gerou reação no Senado: a portaria já é alvo de três projetos que buscam a sua sustação e podem ser votados na próxima semana.
A portaria de 2016 estabelecia, que, em um prazo de 90 dias, as instituições federais de ensino superior deveriam apresentar propostas sobre inclusão de negros, indígenas e pessoas com deficiência em seus programas de pós-graduação (mestrado, mestrado profissional e doutorado), como políticas de ações afirmativas.
A portaria original ainda previa que Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) elaborasse censo discente da pós-graduação, para verificar o perfil dos alunos, e um grupo de trabalho dentro do MEC para acompanhar a implantação das ações previstas na portaria.
Em nota, o Ministério da Educação assinala que Portaria nº 13/2016 “foi revogada com base no artigo 8º, do Decreto nº 10.139/2019”, que obriga a anulação de normas “cujos efeitos tenham se exaurido no tempo”. Na nota o MEC acrescenta que a Lei nº 12.711/2012, em vigor, prevê a concessão de cotas e ações afirmativas exclusivamente para cursos de graduação.
De acordo com o IBGE, os estudantes negros (pretos e pardos) são maioria nas instituições de ensino superior federais, estaduais e/ou municipais. Conforme os dados da pesquisa “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, divulgada no ano passado, o Brasil tinha mais de 1,14 milhão de estudantes autodeclarados pretos e pardos em 2018, enquanto os brancos ocupavam 1,05 milhão de vagas, respectivamente, 50,3% e 48,2% dos matriculados na rede pública (total de dos mais de 2,19 milhões de brasileiros).
Segundo o Mapa das Ações Afirmativas, elaborado pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, em todos os Estados brasileiros há universidades adotando programas de cotas raciais ou sociais.
Repercussões
Para professores e especialistas ouvidos pela reportagem, a revogação da portaria feita pelo MEC tem caráter “simbólico”, mas é “inócua”. “As universidades têm autonomia para tomar determinadas decisões e não precisam estar atrelada a uma portaria do MEC”, lembra Nelson Inocêncio, doutor em artes, professor do Departamento de Artes da Universidade de Brasília, um dos poucos docentes negros da UnB.
“As universidades e institutos não precisam do MEC para dar continuidade a essas políticas”, concorda André Lázaro, ex-secretário de educação continuada alfabetização e diversidade do MEC, hoje diretor de Políticas Públicas da Fundação Santillana. Lázaro também é pesquisador da Flacso onde editou a coleção de estudos afirmativos. Em sua opinião, com a portaria o MEC “esvazia seu papel de coordenar as políticas educacionais brasileiras”.
Em nota, a reitora da UnB, Márcia Abrahão Moura, assinala que “não haverá impacto prático da medida na instituição”. A UnB foi uma das primeiras universidades a adotar políticas afirmativas no país.
A reitora lembra que recentemente, a universidade aprovou política para ampliar a presença de negros, indígenas e quilombolas nos cursos de mestrado e doutorado. “Serão destinadas 20% das vagas de cada edital para candidatos negros. Para indígenas e quilombolas, será criada ao menos uma vaga adicional, para cada um dos perfis, em todas as seleções dos programas de pós-graduação stricto sensu”. As regras passam a valer para ingressos a partir do primeiro semestre de 2021.
Entidades que combatem o racismo e defendem políticas afirmativas prometem entrar na Justiça para sustar a portaria. Esse é o caso da Coalizão Negra por Direitos, que em parceria com o Cadhu (Coletivo de Advocacia Estratégica em Direitos Humanos) deve impetrar um mandado de segurança.
A associação Educafro (Educação e Cidadania de Afro-descendentes e Carentes) também promete entrar com ações na Justiça até segunda-feira (22), “seis medidas já foram escritas por advogados voluntários”, informa Frei David, presidente da associação.
Senado
Os projetos para sustar a portaria foram apresentados pelo líder da Rede, senador Randolfe Rodrigues (AP), pela líder do Cidadania, senadora Eliziane Gama (MA), com a bancada do partido, e pelo líder do PT, senador Rogério Carvalho (PT-SE), com a bancada do partido e a senadora Zenaide Maia (Pros-RN).
Durante a sessão deliberativa remota desta quinta-feira, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do PDL 284/2020 classificou a atitude do ministro de “infame”. Para ele, a portaria é inconstitucional e ofende direitos de minorias.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, informou que os projetos apresentados nesta quinta-feira já haviam sido recebidos pela Secretaria Geral da Mesa e prometeu incluir os textos na pauta da próxima semana.
Ao apresentar o PDL 287/2020, o senador Rogério Carvalho disse considerar que o Ministério da Educação revelou mais uma vez “total descompromisso com políticas de redução das desigualdades educacionais e de promoção da igualdade racial”, além de desrespeito à luta histórica de negros, indígenas e pessoas com deficiência por igualdade e justiça social.