Sexta-feira, 17 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 1 de novembro de 2019
O homem que esfaqueou Jair Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018, Adélio Bispo de Oliveira, disse em depoimento à PF (Polícia Federal) que se recusa a fechar acordo de delação premiada porque não tem nada a falar além do que já relatou.
Adélio foi ouvido na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS), onde está preso, pelo delegado Rodrigo Morais, da superintendência da PF em Belo Horizonte. Ele é o responsável pelo inquérito que apura a existência de comparsas ou mandantes do ataque ocorrido em Juiz de Fora (MG).
Ao fim do interrogatório, Morais ofereceu a Adélio a chance de fechar um acordo de colaboração premiada, caso tivesse algo a revelar, mas o esfaqueador rejeitou a hipótese. Ele manteve a versão de que agiu sozinho e negou que o atentado tenha sido encomendado.
O delegado da PF foi a Campo Grande tomar também o depoimento de um interno que disse ter ouvido Adélio confessar que teria conexões com uma facção criminosa e com políticos.
O preso é o iraniano Farhad Marvizi, que enviou uma carta a Bolsonaro narrando ter dados que poderiam ajudar a esclarecer o episódio. O informante, no entanto, é considerado pelos investigadores uma fonte de baixa credibilidade, por ser afeito a contar histórias mirabolantes.
No depoimento, agendado havia cerca de 15 dias, Marvizi disse que ouviu os detalhes do próprio Adélio, num período em que estiveram juntos na ala médica da penitenciária, mas avisou que só contará o que sabe em troca de perdão judicial do presidente da República.
O iraniano afirmou que o esfaqueador recebeu a promessa de ganhar R$ 500 mil para matar o então presidenciável, mas não revelou quem seria a pessoa responsável pelo pagamento.
O candidato a colaborador não citou até agora nenhum nome de facção ou de político supostamente ligado ao atentado nem indicou ter provas. A suspeita de envolvimento do PCC (Primeiro Comando da Capital) no caso já foi derrubada pelos policiais.
Diante do pedido para entregar dados concretos que pudessem corroborar sua versão, Marvizi falou que não pode dizer mais nada e que teme ser morto.
A PF descartou aceitar algum tipo de acordo com o estrangeiro, por desconfiar da veracidade de suas palavras. O iraniano tem o hábito de mandar correspondências para personalidades — já teria escrito ao apresentador Silvio Santos e ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Em 2014, Marvizi espalhou a notícia de que o PCC queria sequestrar o advogado Carlos Araújo, ex-marido da então presidente Dilma Rousseff (PT). Após o alerta, a PF chegou a monitorar Araújo, mas concluiu se tratar de alarme falso.
A carta sobre Adélio mencionada por Bolsonaro não chegou às mãos dos agentes que conduzem o inquérito, que desconhecem seu teor na íntegra. No dia 6 deste mês, o presidente disse que entregou o documento “às autoridades competentes”, mas não especificou quais eram elas.
Segundo pessoas que presenciaram o depoimento, Marvizi é visto na cadeia como alguém em busca de uma estratégia para conseguir liberdade ou redução de pena. Por isso, teria se aproveitado do contato que teve com Adélio para dizer que sabe de algo importante.
O próprio iraniano afirmou ao delegado que buscou “puxar papo” com o outro preso e mentiu, dizendo conhecer pessoas influentes em Minas Gerais, para ganhar a confiança dele.
O autor da facada negou ao delegado ter feito qualquer revelação ao colega de penitenciária, empregou tom de descrédito e lembrou que ele insistia em convencê-lo a delatar mandantes, chegando a sugerir nomes como os dos ex-presidentes Dilma e Lula (PT) e do deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG).
Adélio contestou ainda a existência da promessa de pagamento de R$ 500 mil.
Marvizi foi condenado a 20 anos de prisão por ordenar um atentado contra um auditor da Receita Federal no Ceará.
O chefe do inquérito na PF ouviu ainda outros dois presos que poderiam corroborar as informações do iraniano e também teriam ouvido relatos de Adélio, durante banhos de sol, sobre o planejamento do ataque a Bolsonaro.
Os dois depoentes disseram desconhecer as supostas revelações feitas por Adélio no presídio e puseram em xeque as afirmações do autor da correspondência.
Um dos interrogados foi Felipe Ramos Moraes, apontado como piloto de helicóptero do PCC. Ele foi ouvido porque havia a expectativa de que pudesse confirmar as alegações de Marvizi, o que acabou não acontecendo.
Transferência
Como a Folha mostrou, Adélio pediu à Justiça que seus atuais advogados sejam destituídos e que ele passe a ser representado pela DPU (Defensoria Pública da União) na ação penal originária, que corre em Juiz de Fora. A solicitação ainda está sendo analisada.
O preso é defendido hoje pelo escritório do advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, que também é o curador (representante legal) dele. Nesta sexta-feira (1º), Zanone confirmou que deixará de atuar no caso.
Segundo ele, a representação se tornou muito trabalhosa e onerosa. “Nós já tínhamos falado com o Adélio que seria melhor a Defensoria assumir a assistência dele na execução. O processo da facada em si já foi concluído.” Zanone disse que continuará como curador.
O processo que trata da punição pela facada foi encerrado em julho sem que houvesse contestação. Os pontos que podem ser discutidos agora são relacionados à execução da medida de segurança.
Adélio reiterou a vontade de deixar a penitenciária no Mato Grosso do Sul e ser transferido para uma cadeia em Montes Claros (MG), onde moram seus parentes, ou mais próxima da cidade.