Domingo, 19 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 28 de março de 2020
Um dos criadores do programa Bolsa Família, o economista Ricardo Paes de Barros avalia que o Brasil tem os recursos necessários para ajudar a população mais afetada a superar a crise do coronavírus.
O economista afirma, no entanto, que o país tem de melhorar a sua rede de comunicação para que o governo consiga focar suas medidas nas pessoas mais prejudicadas economicamente e socialmente pelo vírus.
“Nós precisamos ter um novo sistema de informação que seja capaz de identificar quem são as pessoas que estão sendo afetadas e que precisam de ajuda. O país é suficientemente rico para garantir ajuda para essas pessoas”, diz Paes de Barros, também professor do Insper.
1) A crise atual tem aspectos sérios na saúde e na economia. Como lidar com ela?
Em primeiro lugar e, sem dúvida alguma, nós temos de proteger as pessoas. Em segundo lugar, temos que garantir o mínimo (de recursos) para todo mundo.
2) Como garantir o mínimo para todo mundo?
Para garantir o mínimo a todo mundo, é preciso saber quem são as pessoas que estão sendo mais afetadas por este evento (coronavírus). Como ele era imprevisível, a gente não necessariamente tem os mecanismos governamentais para identificar os brasileiros que estão sendo mais atingidos. Nós precisamos ter um novo sistema de informação que seja capaz de identificar quem são as pessoas que estão sendo afetadas e que precisam de ajuda. O país é suficientemente rico para garantir ajuda para essas pessoas.
3) Como criar toda essa rede de informação?
Nós precisamos do apoio das instituições comunitárias idôneas e do nosso serviço de assistência social, com o Cras (Centro de Referência de Assistência Social) funcionando de tal maneira que ele possa informar para municípios, estados e governo federal exatamente em quais locais estão as necessidades e qual é a magnitude de cada uma delas. É uma guerra contra o vírus e nós precisamos de informação local para poder direcionar a ajuda melhor.
4) O governo tem anunciado algumas medidas de ajuda, como uma renda para trabalhadores informais. Qual é a sua avaliação dessas medidas?
O que o governo está tentando fazer é uma ajuda meio generalizada, mas é uma boa ideia. Na falta de informação, é melhor ajudar todo mundo do que ser muito seletivo em um primeiro momento. Na medida em que isso for durar meses e, para gente conseguir lidar com essa crise no médio prazo, daqui a dois, três, quatro meses, nós temos que crescentemente ter mais informação sobre em quais locais estão as pessoas mais vulneráveis.
O país pode partir para mais uma frente. Mitigar os efeitos da crise tem a ver com a saúde pública, mas também tem a ver com que as pessoas consigam trabalhar o máximo possível, de uma maneira segura, dentro dos padrões que a saúde acha que são adequados. Todo mundo está precisando de ajuda, logo nós temos de trabalhar mais para ajudar todo mundo. O momento é importante para gente ter frentes de trabalho público, por exemplo.
5) Como isso pode ser feito?
Nas comunidades mais pobres, vamos precisar de apoio para manter a limpeza dessas áreas e ajudar a população mais idosa. Ou seja, uma série de serviços, de atividades, que a gente não dava muita atenção no nosso dia a dia até esse evento. E isso significa mais empregos. A única instituição capaz de contratar estes trabalhadores é o governo. O governo deveria criar frentes de trabalho voltadas para enfrentamento e atendimento da população.
Nós temos vários trabalhos produtivos a serem feitos. O mais importante deles é alimentar o setor público com informação de qualidade sobre o que realmente está acontecendo em cada comunidade. Com isso, nós vamos ser capazes de enfrentar o desafio (da crise). A gente não pode estar mal informado sobre o que acontece em cada local, da mesma maneira que a saúde pública não pode estar mal informada de quem tem ou quem não tem o vírus.