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Por Redação O Sul | 12 de novembro de 2017
O cliente chega à farmácia para comprar o relaxante muscular, a vitamina C e, até mesmo, a pomada de assadura para o bebê e só em casa percebe que levou “gato por lebre”. A utilização de cores e elementos gráficos na embalagem de um produto, no intuito de fazê-lo parecer com a marca dominante no mercado, se multiplica e, segundo especialistas, é um risco para a saúde do consumidor, inclusive o de morte, pois é grande o número de problemas causados por erros relacionados à medicação.
“Nomes de medicamentos levam a questões sérias de erros, que podem causar lesões ou até matar. São nomes e embalagens parecidas, rótulos ruins. O consumidor não consegue identificar de pronto o que precisa”, ressalta Mário Borges Rosa, presidente do Instituto para Práticas Seguras no Uso de Medicamentos (ISMP) e membro do Conselho Federal de Farmácia (CFF).
Rosa lembra que o Desafio Global de Segurança do Paciente para 2017, proposto pela OMS (Organização Mundial da Saúde), tem como tema o “Uso Seguro de Medicamentos (Medication Without Harm)”. O objetivo central é promover estratégias que reduzam em 50% os erros de medicação e os danos graves relacionados ao uso de medicamentos nos próximos cinco anos.
O advogado David Nigri, especialista em direito do consumidor, pondera ainda que a utilização das mesmas cores e desenhos gráficos em embalagens de produtos diferentes pode ser considerada propaganda enganosa. Nestes casos, diz, aplica-se o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor, por induzir o consumidor em erro.
A farmacêutica Elida Cordeiro diz que é muito comum as pessoas confundirem produtos por causa da embalagem: “Às vezes, é preciso orientar os clientes, e alertar: ‘olha, esse remédio que você pegou não é o que você quer’”. É muito fácil se confundir.
A Anvisa, que regulamenta o setor, ressalta que a norma vigente de rotulagem de medicamentos — a RDC 71/2009 — traz em seu artigo 17 algumas proibições, entre elas a rotulagem em layout semelhante ao de um medicamento registrado anteriormente. A norma diz ainda que o nome deve guardar suficiente distinção gráfica e fonética em relação a outros do mercado.
No entanto, completa a agência, o layout do rótulo da embalagem — cores, diagramação e fontes, por exemplo — é de escolha da empresa e, em algumas situações, pode ser alterado sem aprovação prévia da Anvisa. No caso de dúvidas, a reguladora aconselha que o consumidor consulte o farmacêutico da drogaria antes da compra.
A enfermeira Juliana Singh admite já ter se confundido ao comprar medicamentos, por conta da semelhança das embalagens. Porém, não vê grandes problemas quando os dois produtos têm o mesmo componente: “O problema maior é quando são medicamentos diferentes, um à base de dipirona e outro de paracetamol, por exemplo. Aí pode até ser perigoso. Imagina quem for alérgico? E quem não souber ler?”.
Um caso envolvendo produtos da Bayer acabou nos tribunais. Há alguns meses, a Justiça determinou a suspensão da venda do remédio Cepon Zinco, do Laboratório Lapon, e do creme para assaduras Depantex, do Nativita, que utilizavam elementos gráficos na embalagem que os tornavam parecidos com o Redoxon Zinco e o Bepantol Baby, produtos similares e mais antigos do mercado, ambos da Bayer.
De acordo com advogado Luiz Edgard Montaury Pimenta, do escritório Montaury Pimenta, Machado & Vieira de Mello, que defende os direitos de propriedade industrial da Bayer no Brasil, foram reclamações de consumidores que levaram ao conhecimento da empresa a existência desses produtos similares. A advogada Ana Paula Brito, que trabalha com Pimenta, afirma que a empresa que copia a embalagem de um concorrente comete concorrência desleal: “A intenção é induzir o consumidor a erro, ao copiar cores e embalagens de produtos conhecidos. E esta intenção fica ainda mais evidente, uma vez que os produtos regularmente estão apresentados lado a lado nas prateleiras das farmácias”.
Procurada, a Nativita não respondeu. O Laboratório Lapon informou que o Cepon Zinco foi descontinuado logo que foi observada semelhança com o Redoxon Zinco. Já a Bayer afirma que, por ter diversos produtos referência no mercado, enfrenta com frequência este tipo de situação. Segundo a empresa, combater copycats (imitações) é conduta que busca garantir a integridade da imagem da empresa e evitar confusão ao consumidor.
Segundo Rosa, do ISMP, o Brasil está muito atrasado em comparação com outros países quanto aos parâmetros referentes às embalagens de medicamentos. Ele defende que nossa lei seja atualizada. Para isso, ressalta, é preciso que Anvisa, indústria farmacêutica, profissionais de saúde e representantes do consumidor se envolvam no debate.
“São erros plenamente evitáveis. A segurança depende de vários fatores e um deles é melhorar o nome dos medicamentos, que devem passar por processo bem rigoroso para que não se confundam com outros já existentes.”