Sexta-feira, 26 de abril de 2024
Por Redação O Sul | 12 de abril de 2019
A disposição do governo de flexibilizar as leis para ampliar a validade da CNH (Carteira Nacional de Habilitação) e dobrar a margem de pontos permitidos para infrações provocou reação de parlamentares e especialistas em segurança de trânsito.
A principal preocupação é que os novos parâmetros propostos pelo governo aumentem a violência no trânsito, por permitir a circulação nas ruas e estradas de um grande contingente de motoristas que frequentemente infringem as leis.
O Brasil é um dos países mais inseguros do mundo em vias expressas, com uma média anual de cerca de 40 mil mortes em acidentes automobilísticos, segundo o SIM (Sistema de Informações sobre Mortalidade), ligado ao Ministério da Saúde.
Somente no ano passado, em São Paulo, mais de 540 mil motoristas excederam os 20 pontos na carteira, o atual limite para a suspensão da CNH. No Rio, segundo o Detran informou em 2018, um em cada quatro condutores já haviam estourado o máximo de pontos no período de um ano.
Professor de psicologia do trânsito, Hartmut Günther avalia que as mudanças podem ser um sinal de liberalidade excessiva:
“É lastimável, um sinal para a população: ‘olha, agora vocês podem fazer o que quiser’. O que está em jogo é a segurança de todos. Nos países desenvolvidos, há políticas de baixar índices de acidentes de trânsito. No Brasil, estamos na contramão. Ao afrouxar a pontuação o governo está sinalizando que não está interessado em fazer nada.”
“Indústria da multa”
Desde sua atuação como deputado federal, e também na campanha eleitoral do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro faz críticas contra o que considera ser uma “indústria das multas” gerada pela legislação de trânsito e a atuação dos órgãos de fiscalização.
Na terça-feira, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, anunciou a decisão de enviar ao Congresso uma proposta de projeto de lei elevando de 20 para 40 pontos o limite imposto por lei para a suspensão da CNH. A proposta também prevê dobrar o prazo de validade da carteira de cinco para dez anos.
Ainda de acordo com a equipe do ministro, outras alterações estão previstas na minuta que será apresentada a Bolsonaro antes de ser enviada ao Congresso. Uma delas prevê acelerar o processo de suspensão da habilitação em casos de infrações mais graves, como dirigir sob o efeito de álcool.
O ministro quer ainda dar rapidez aos processos administrativos referentes às infrações graves e gravíssimas que tramitam nos Detrans. Atualmente, um processo de suspensão da habilitação tem que passar por até seis instâncias. Com a proposta, esse processo cairia para três instâncias.
Antes mesmo de chegar à mesa de Bolsonaro, no entanto, a proposta recebeu críticas da Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro, que solicitou uma audiência com o ministro para discutir as mudanças. Vice-presidente da Frente, a deputada Christiane Yared (PR-PR) critica as propostas e defende maior rigor na legislação de trânsito:
“Infelizmente todos nós precisamos de regras. Quando flexibilizamos essas regras nós podemos colher mais mortes. Já temos um País que não educa, não fiscaliza e não pune. Nossa luta é para tentar ser mais rigoroso”, disse Yared, mãe de um filho morto em um acidente de trânsito.
70 mil acidentes em 2018
Somente no ano de 2018, a Polícia Rodoviária Federal registrou um total de 69.114 acidentes nas rodovias federais do País, que resultaram num total de 58.825 feridos e 5.259 mortos.
As mortes no trânsito geram um custo aos cofres públicos de pelo menos R$ 50 bilhões ao ano, segundo dados do Observatório Nacional de Segurança Viária. Para Maria Alice Prudêncio Jacques, especialista em trânsito e professora aposentada da UnB (Universidade de Brasília) o comportamento dos condutores de veículos é um elemento determinante para se chegar a esses números alarmantes.
“O condutor não está bem orientado. Quando nosso trânsito tiver mais seguro, pode-se pensar em alterar alguma coisa. Por enquanto não justificaria haver uma flexibilização no rigor do trânsito. Os órgãos gestores precisam acompanhar o desempenho dos condutores para evitar que as pessoas se sintam liberadas”, disse a especialista.
A proposta também não foi bem vista por entidades da sociedade civil. Coordenador-geral da Ong Rodas da Paz, Bruno Leite avalia que o motorista que descumpre a lei com frequência deveria voltar a estudar.
“Se você é um motorista que está descumprindo a lei com certa frequência, você precisa voltar a estudar as regras de trânsito, rever seus conceitos e não deixar de ser punido.”