Quarta-feira, 20 de agosto de 2025
Por Alexandre Teixeira de Castilhos Rodrigues | 20 de agosto de 2025
Jeep Romualdo
Foto: DivulgaçãoEsta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Entre Jeep, Fusca e Cadillac, cada veículo é testemunha de uma época, de uma aventura e de uma memória imortal. No próximo final de semana, o Pavilhão da Fenac, em Novo Hamburgo, abre as portas para o maior encontro de carros antigos em área coberta do Brasil,organizado há décadas pelo Veteran Car Club. Não se trata apenas de uma feira de automóveis, mas de um ritual de memória, história e emoção, onde cada veículo é testemunha viva de uma época, da tecnologia e do design que moldaram estilos de vida.
A paixão pelos carros antigos ultrapassa a simples questão material. Um automóvel não é apenas ferro, vidro e borracha: é um guardião de lembranças. Nos anos 70, embalados pela conquista da Copa do Mundo, os brasileiros começaram a reconhecer o valor de modelos das décadas de 1920 a 1940. Nasciam os primeiros colecionadores, que se dividiam entre os esportivos, os poderosos muscle cars, os clubes de Fusca, Jipe e Kombi e os clássicos de luxo, como Cadillac e Mercedes.
Encontrar um carro antigo é quase como caçar tesouros. Muitos surgem em garagens empoeiradas, esquecidos em leilões ou abandonados no fundo de quintais. O colecionador, paciente arqueólogo da estrada, os resgata, restaura
com peças originais quando possível e os mantém vivos com zelo e manutenção constante. O passeio com um carro de época é, antes de tudo, um mergulho em lembranças imemoriais.
No meu caso, a paixão nasceu cedo. Enquanto meu pai seu amor era pelo Jaguar, meu primeiro veículo foi um Jeep Willys-Overland 1968, de seis cilindros, que consumia 3 a 4 quilômetros por litro — mas que me dava quilômetros de felicidade. Batizei-o de Romualdo. Não era personagem de Simões Lopes Neto, mas companheiro das ruas de Bagé e da campanha gaúcha. Certa vez, exausto dos paralelepípedos irregulares, Romualdo incendiou em plena andança. Meu irmão caçula, que viajava na carona sem porta, saltou com destreza. A cena virou lenda familiar, contada e recontada até hoje.
Quem ama um carro antigo não se apega apenas ao ronco do motor ou ao brilho do cromado. Ama o que ele simboliza: juventude, liberdade, encontros e
despedidas. O automóvel é testemunha silenciosa de histórias de amor, viagens, vitórias e derrotas. O primeiro carro a chegar ao Brasil foi trazido em 1891 pelo imortal maçom Santos Dumont — um Peugeot, da França. Até então, reinavam as charretes, os cavalos e as marias-fumaças. Já a primeira fábrica de automóveis instalada em solo brasileiro foi a Ford, em 1919, em São Paulo. E o primeiro carro nacional fabricado foi a simpática Romi-Isetta, que ainda hoje desperta sorrisos.
Do carburador à injeção eletrônica, chegamos ao motor elétrico. Nos Estados
Unidos e na Europa, os elétricos já ocupam avenidas; no Brasil, engatinham. Vendem-nos a ilusão de ecologia, mas esquecem de dizer que a fabricação e o
descarte de baterias poluem muito mais do que o motor a combustão, que possui cerca de 20 mil peças, contra apenas 20 de um elétrico. O álcool, invenção genuinamente brasileira, segue sendo o combustível menos poluente.
O que entristece é ver os jovens de hoje desinteressados pelo volante. Muitos já não aprendem a dirigir: preferem o Uber. Não sobem em árvores para colher frutas, não conversam em rodas de chimarrão; vivem confinados às redes sociais.
É uma nau sem rima, sem vento e sem destino. Eu, por minha vez, sempre fui adepto das duas rodas. A bicicleta e a motocicleta foram minhas aliadas de aventura e liberdade. Elas me levaram a recantos do planeta, guardando na memória imagens que não se apagam. Mas essa, como digo, é outra história que merece ser contada em outro dia. No fim, o colecionador não é apenas dono de uma máquina antiga. É guardião de memórias, da cultura e da história de um tempo e de um povo. Mais que apaixonado por ferro e óleo, é um devoto da emoção que só um carro pode despertar.
* Alexandre Teixeira G. de Castilhos Rodrigues, advogado, escritor e associado do Veteran Car Club de Novo Hamburgo.
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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