Terça-feira, 04 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 3 de novembro de 2025
				A CPI do INSS colheu nessa segunda-feira (3) o depoimento de Abraão Lincoln Ferreira da Cruz, presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA), apontada como relevante no ecossistema de fraudes a aposentados e pensionistas. Durante a sessão, o relator, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), acusou Abraão Lincoln Ferreira de tentar incluir “40 mil mortos em descontos associativos”. Amparado por habeas corpus do ministro Alexandre de Moraes (STF), Lincoln recusou-se a responder sobre fraudes investigadas pela Operação Sem Desconto e negou que a CBPA seja uma “instituição fantasma”. Parlamentares apontaram contradições.
A decisão de Moraes manteve a convocação dele na condição de testemunha (com dever de se manifestar sobre os fatos), mas garantiu a ele o direito ao silêncio e à não autoincriminação. No entanto, Lincoln concordou em responder parte dos questionamentos.
Entre as perguntas feitas pelo relator e não respondidas pelo depoente, estão algumas sobre o crescimento repentino no número de filiados da confederação. Alfredo Gaspar afirmou que a CPBA passou de 4 tentativas de inclusão de cadastro, em maio de 2023, para 64 mil em junho. Depois, em julho, o número de tentativas de inclusão foi de mais de 196 mil cadastros. Em 2025, apontou o relator, a entidade chegou a 757 mil cadastros.
Além disso, o relator apontou tentativas de incluir como filiados 40 mil pessoas que já morreram. Não houve resposta do depoente sobre a estratégia usada pela entidade para conseguir filiações.
O relator também apontou o recebimento, pela CBPA, de R$ 221 milhões em descontos associativos, numa média de R$ 10 milhões a R$ 11 milhões mensais. Gaspar questionou para onde ia o dinheiro. O depoente disse não ter de cabeça o detalhamento sobre os dados e afirmou que poderia mandar os contratos, notas e extratos para a comissão depois.
De acordo com o presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), 99,5% dos filiados à CBPA não reconheceram os descontos. O depoente afirmou que, após auditoria, mandou suspender todos os descontos que estavam com suspeitas.
A cúpula do colegiado avalia que, apesar de a CBPA não estar na lista das maiores beneficiadas com descontos associativos ilegais, ela tem elos com diversos outros núcleos do esquema investigado e pode servir para que novos caminhos de apuração sejam desvendados.
A confederação teve, ao mesmo tempo, negócios com empresas de Antônio Camilo Antunes, o Careca do INSS, e relações financeiras com políticos de Estados como Rio Grande do Norte, Paraíba e Maranhão.
Além dos elos regionais, a confederação tem forte atuação em Brasília. Ela conta com assento no Conselho Nacional de Aquicultura e Pesca (Conape), do governo federal. O representante é o deputado estadual Juscelino Miguel dos Anjos (Republicanos-PB).
A CBPA diz que “reitera seu total apoio às instituições de controle brasileiras, que buscam proteger os aposentados de práticas fraudulentas com as quais não compactua e as quais condena veementemente”.
O relatório de inteligência financeira do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontou uma série de movimentações suspeitas por parte da CBPA entre 2024 e 2025.
Uma delas foram os repasses de R$ 20,3 milhões para a Plataforma Consultoria, empresa ligada ao Terra Bank, da Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer). A suspeita dos investigadores é de que a fintech seria usada para operacionalizar o esquema de fraudes no INSS.
Outra suspeita apontada no relatório do Coaf diz respeito à movimentação de R$ 410 milhões na conta aberta em uma agência do Banco do Brasil em Ceilândia, periferia de Brasília, entre maio de 2024 e maio de 2025. No período, foram R$ 205,5 milhões em entradas e R$ 204,4 milhões em saídas.
O documento sigiloso também aponta indícios de lavagem de dinheiro na relação da CBPA com a Federação das Colônias de Pescadores e Aquicultores do Rio Grande do Norte (Fecopesca-RN).
Há ainda o apontamento, em inquérito da Polícia Federal, de movimentações suspeitas com o deputado estadual Edson Cunha de Araújo (PSB-MA). Ele é o líder da federação do Maranhão e teria recebido pelo menos R$ 4,5 milhões da entidade. A CPI do INSS acredita que o repasse pode ser o dobro desse montante.
A CBPA é uma das investigadas pela Polícia Federal na Operação Sem Desconto, deflagrada em abril. A entidade e seu presidente tiveram bens bloqueados.
Para a CPI do INSS, a confederação de pesca é um dos “eixos da arquitetura criminosa desvelada pela Operação Sem Desconto e responsável por um impacto financeiro estimado em R$ 221,8 milhões subtraídos de forma contumaz e sistêmica dos benefícios de aposentados e pensionistas”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo e da Agência Senado.