Domingo, 05 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 4 de outubro de 2025
Dados em poder da CPMI e apurações da Polícia Federal (PF) sobre um esquema de fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) mostram transações e ações suspeitas de entidades-alvo das investigações.
Conforme um relatório enviado à CPMI do INSS pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), suspeita de aplicar descontos ilegais a beneficiários do instituto, movimentou R$ 2 bilhões em um ano – entre maio de 2024 e maio de 2025.
Outra entidade investigada, a Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), por sua vez, usou uma falsa parceria com o INSS para montar uma rede de atendimentos com apoio de três mil prefeituras.
Em nota, a Contag informou que não teve acesso ao documento e que pauta sua atuação pela transparência, legalidade e responsabilidade social. A Conafer não se manifestou.
No caso da Contag, os R$ 2 bilhões movimentados no período de um ano se deram da seguinte forma: R$ 1,017 bilhão em receitas e R$ 1,015 bilhão em pagamentos. Uma parte das transações da entidade no período foi classificada como “suspeita de irregularidades, podendo caracterizar desvio com fraudes”.
Uma das suspeitas apontadas se deu em regiões de fronteira com outros países. São citados os municípios de Rodeio Bonito (RS), Cruzeiro do Sul (AC) e Tangará da Serra (MT). Os três não são imediatamente vizinhos de cidades estrangeiras, mas estão localizados em faixas consideradas fronteiriças.
Os valores que chamaram a atenção do Coaf nessas regiões não estão discriminados no relatório. O documento cita apenas que nesses locais foram registradas “operações de cheques viagens”.
Além disso, o relatório de inteligência financeira aponta transações “para terceiros cuja relação comercial com a entidade” não foi identificada. E, ainda, uma “elevada movimentação nas contas em curto período”, como em abril de 2025, quando R$ 46,4 milhões foram depositados.
O relatório aponta também que a Contag operou “valores elevados em Fundos de Renda Fixa de longo prazo” de forma “incompatível com a declaração de rendimentos”.
Faturamento
O faturamento anual da Contag, segundo os dados bancários, foi de R$ 507 milhões, apurados em 2023. As informações foram prestadas por uma agência do Banco do Brasil no Distrito Federal onde a Contag mantém conta desde 1976.
“Movimentação realizada muito acima da declarada para o período em regiões de fronteira, com pessoas sem aparente vínculo comercial. Incluindo denúncias externas em apuração. Diante do exposto, comunicamos, por suspeitas de irregularidades, podendo caracterizar desvio com fraudes”, diz o documento do Coaf.
A Operação Sem Desconto, da PF, foi deflagrada em abril deste ano. A Contag é uma das entidades investigadas. Criada nos anos 1960, é a que mais arrecadou com descontos.
Entre 2016 e janeiro de 2025, foram R$ 3,4 bilhões, segundo dados levantados pela Controladoria-Geral da União (CGU). A entidade é politicamente próxima ao PT, com quadros do partido entre seus dirigentes e ex-dirigentes. Um de seus ex-presidentes é Aristides Veras, irmão do deputado Carlos Veras (PT-PE), primeiro-secretário da Câmara.
A Contag informou que não teve acesso ao documento mencionado, mas comentou trechos do relatório que foram apresentados em pedido de manifestação à sua assessoria de imprensa. Disse que os R$ 2 bilhões movimentados são “resultado de transferências, repasses e pagamentos referentes ao funcionamento de toda a estrutura sindical nacional”.
Sobre as movimentações em áreas de fronteira, disse que “possui sindicatos filiados em todas as regiões do País” e que as “únicas movimentações possíveis existentes são transações bancárias rotineiras de sindicatos locais e de atividades sindicais legítimas nessas localidades”. Também afirmou que jamais emitiu cheques viagens. “Todos os recursos movimentados possuem origem identificada e são registrados em conformidade com as obrigações legais e fiscais da entidade”, frisou.
Já a Conafer, que é alvo da PF e da CPI do INSS, simulou ter o aval do órgão federal para se apresentar em localidades distantes como se fosse uma representante oficial do instituto que cuida de aposentados e pensionistas. A entidade tinha a pretensão de funcionar como “agências do INSS”.
A Conafer se apresenta em comunidades indígenas, quilombolas e outras regiões afastadas como braço do órgão público capaz de viabilizar benefícios e, ainda, oferecer insumos agrícolas em parceria com prefeituras. Estes acordos são anunciados pelas gestões como políticas públicas municipais.
Entre 2019 e 2024, a Conafer faturou R$ 688 milhões com descontos associativos aplicados sobre aposentadorias e pensões de mais de 620 mil associados. Entre eles, há pessoas que já morreram e crianças, conforme documentos expostos durante a reunião da CPI do INSS. A CGU fez uma análise sobre a adesão de associados a entidades como a Conafer e apontou falta de concordância dos beneficiados. (Com informações de O Estado de S. Paulo)