Domingo, 19 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 10 de março de 2022
Uma cortina de ferro econômica e cultural está caindo sobre a Rússia enquanto o presidente Vladimir Putin prossegue com sua invasão da Ucrânia, revertendo décadas de integração com as economias ocidentais e ameaçando isolar os russos em uma extensão nunca vista desde a era soviética.
O corte dramático é resultado de restrições punitivas impostas pelos Estados Unidos e pela Europa, incluindo proibições de aeronaves russas sobrevoarem o espaço aéreo ocidental e sanções ao banco central. Foi agravado por um êxodo voluntário de empresas internacionais do mercado russo.
Mas o isolamento também é uma função das medidas repressivas que Putin tomou em casa. Essas medidas restringiram o livre fluxo de informações on-line, abafaram protestos públicos e fizeram milhares de russos fugirem para o exterior, temendo a possibilidade de lei marcial, recrutamento ou fronteiras fechadas em um país que caminha para uma forma mais severa de autoritarismo.
“Enquanto Putin tenta reduzir a Ucrânia a escombros, ele também está transformando a Rússia em uma prisão”, disse a subsecretária de Estado para Assuntos Políticos, Victoria Nuland, durante depoimento ao Congresso na última terça-feira (8).
O resultado é a ascensão de uma versão de estado pária da Rússia, que rapidamente se tornou um lugar que muitos de seus próprios cidadãos nem reconhecem – onde o dinheiro está sujeito a controles de capital; onde as estações de rádio e televisão da intelectualidade russa não mais transmitem; onde o TikTok não aceitará uploads de vídeo; e onde a seleção russa não pode competir pela Copa do Mundo da FIFA.
“Durante décadas, até países párias como Coreia do Norte e Irã participaram das Olimpíadas e Copas do Mundo, e times da União Soviética participaram de copas europeias de futebol mesmo nos anos de maiores tensões”, disse ele. “Agora tudo isso acabou. É assim que o povo russo sabe que algo está terrivelmente errado.”
Da integração ao isolamento
Putin há muito apresenta seu governo como um antídoto estável para a turbulência econômica e a criminalidade que afligiu a Rússia na década de 1990 após o colapso da União Soviética. Aumentos significativos nos padrões de vida durante seus dois primeiros mandatos alimentaram grande parte de sua popularidade entre os russos.
A Rússia entrou na Organização Mundial do Comércio e trouxe empresários todos os anos para um fórum semelhante a Davos em São Petersburgo para divulgar o país como um mercado emergente atraente. Empresas de automóveis estrangeiras, varejistas, restaurantes e gigantes de bens de consumo disponibilizaram mais itens e serviços para os russos.
Mas agora uma grande ruptura está reordenando esse mundo.
A lista de empresas internacionais que cortam laços com a Rússia continuou a crescer, com as empresas de contabilidade KPMG e PwC anunciando que estão deixando o país e Mastercard e Visa dizendo que deixarão de oferecer suporte a cartões emitidos por bancos russos. De acordo com uma lista compilada pela Yale School of Management, cerca de 300 empresas suspenderam suas operações ou deixaram o mercado desde que Putin anunciou a invasão.
BP, Shell e ExxonMobil disseram que abandonarão investimentos multibilionários em energia. Bancos e companhias de seguros em todo o mundo estão cortando transações com contrapartes russas. Fabricantes de chips de computador, companhias de navegação e uma série de exportadores estão interrompendo as entregas à Rússia para cumprir as sanções.
As nações ocidentais estão fechando seus portos para navios russos. Os varejistas europeus estão fechando lojas na Rússia e a Microsoft e a Apple estão suspendendo as vendas no país. A Starbucks disse que interromperia todas as atividades comerciais na Rússia, e a Coca-Cola também suspendeu seus negócios no país.
A colaboração cultural da Rússia com o Ocidente também está sendo cortada. As elites culturais de Moscou e São Petersburgo, em muitos casos, fugiram para o exterior. O Garage Museum de Moscou parou de trabalhar em suas exposições devido à guerra na Ucrânia. O diretor artístico da Fundação V-A-C, que supervisiona o novo centro de artes GES-2 de Moscou, renunciou, assim como o vice-diretor do Museu Pushkin.
Efeitos na classe alta
Os maiores críticos de Putin na Rússia – que tendem a ser da classe alta urbana – podem, ironicamente, experimentar o isolamento mais profundamente do que outros russos, já que o país se vê cada vez mais isolado do Ocidente, disse Richard Connolly, professor que estuda o Economia russa na Universidade de Birmingham, no Reino Unido.
“O eleitorado que está mais alinhado com nossa visão de mundo é aquele que vai sofrer o pior”, disse Connolly. “A pessoa comum que trabalha em uma fábrica de tratores de Chelyabinsk ainda estará trabalhando e terá acesso às coisas que tinha antes.”
Ele observou que a Rússia não está sendo isolada do mundo, mas relegada a um bloco comercial liderado por Pequim. A China não anunciou sanções à Rússia e pode intervir para onde muitas empresas internacionais fugiram, mas também “extrairá um preço” por apoiar a Rússia com bens e investimentos, disse Connolly. A Turquia também não aderiu às sanções.
A retirada em massa do mercado russo por empresas internacionais veio junto com o aumento da repressão do Estado.