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Por Redação O Sul | 14 de outubro de 2023
Um dos supostos sintomas mais difundidos da disfuncionalidade do sistema político brasileiro é o da fragmentação partidária. Nesse sentido, têm sido recorrentes argumentos de que um sistema político em tal condição não possibilita uma clara conexão do eleitor com as siglas, e sim com parlamentares individualmente.
A individualização ou mesmo o personalismo seriam as características dominantes, o que supostamente enfraquece as legendas nas urnas. Além disso, argumenta-se que a alta fragmentação dificulta a governabilidade, uma vez que é mais difícil ao eleito contar com partidos coesos em suas coalizões.
Como a conexão na esfera eleitoral depende de vínculos individuais dos parlamentares com os eleitores, os parlamentares da coalizão de governo tenderiam a se comportar no Legislativo também de forma individual. E não partidariamente.
Em 2017 foram implementadas algumas reformas, como o fim das coligações nas eleições proporcionais e a cláusula de desempenho, que tinham justamente como objetivos a diminuição da fragmentação, o fortalecimento das siglas junto aos eleitores e o aumento da coesão partidária no Legislativo.
A primeira expectativa das reformas foi atingida, com a redução considerável do número de 16,4 partidos efetivos em 2018 para 9,27 neste ano. Mas a redução da fragmentação partidária não foi acompanhada de um fortalecimento das conexões dos partidos com os eleitores.
O índice de eleitores que votaram na legenda, algo que já era extremamente baixo (10,3%) antes das reformas de 2017, diminuiu especialmente nas eleições de 2022. Hoje, é de 4,1% dos eleitores.
Ou seja, a redução do número de partidos nem sempre os fortalece perante os eleitores. Na realidade, a individualização dos deputados foi fortalecida ainda mais em um sistema político já fortemente individualizado na esfera eleitoral.
Outro elemento que pode ter contribuído para a redução do voto de legenda foi a Lei 14.211 de 2021, que estabeleceu a obrigatoriedade de o candidato a deputado alcançar pelo menos 10% do coeficiente eleitoral para ter direito às sobras do partido, desestimulando assim o partido de puxar o voto de legenda e incentivando o voto individual.
A criação dos fundos eleitoral e partidário milionários, bem como a impositividade das emendas dos parlamentares, também podem ter contribuído com a individualização das conexões dos parlamentares com os eleitores, uma vez que legisladores ganharam mais autonomia do Executivo e dos líderes partidários para ter acesso a tais recursos.
Coesão
Por outro lado, ao contrário do que muitos analistas têm argumentado, a coesão partidária parece não ter sido afetada pelas reformas de 2017, especialmente a cláusula de desempenho que obrigou parlamentares de preferências supostamente distintas a conviver na mesma legenda.
Dados do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) mostram que a coesão partidária, medida pela diferença entre os votos nominais no plenário da Câmara entre a maioria do partido versus a minoria tem sido consistentemente muito alta entre os partidos que vêm ocupando assento na Câmara dos Deputados nos últimos 20 anos.
A coesão média dos 16 partidos que compõem a heterogênea super coalizão do terceiro mandato do presidente Lula é extremamente alta, 0,88. O partido menos coeso da coalizão governista, o União Brasil, tem apresentado uma coesão média de 0,8.
As dificuldades do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Legislativo durante os primeiros seis meses de seu terceiro governo podem ser, na realidade, consequência direta de sua decisão de montar uma coalizão muito grande e heterogênea, além de não compartilhar recursos de forma proporcional entre seus parceiros, especialmente em um ambiente político altamente polarizado.
As reformas de 2017, a impositividade das emendas e a criação dos fundos partidário e eleitoral, portanto, impactaram minimamente o comportamento partidário no Legislativo e, consequentemente, a governabilidade.
Apesar da redução do número de partidos não ter aumentado a identidade partidária junto aos eleitores, como se pretendia, em média as siglas continuam a ser muito fortes e coesas dentro do congresso. Mesmo que sejam – ou ao menos pareçam – paradoxalmente fracas na sociedade.