Quinta-feira, 08 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 22 de julho de 2023
A notícia de que o Uruguai estava em busca de um acordo comercial com a China provocou entusiasmo no rancho El Álamo, uma imensidão exuberante de pasto entremeado com cactos e rebanhos de gado nas planícies do leste do Uruguai. Entretanto, o país aprendeu sobre perigos do comércio ao negociar com os asiáticos e enfurecer os vizinhos do Mercosul.
A maior parte do gado do Uruguai tem como destino compradores na China, onde encara tarifas de 12% – mais do que o dobro da alíquota aplicada à carne da Austrália, o maior exportador de carne bovina para a China. Os criadores de gado na Nova Zelândia, o segundo maior exportador, usufruem da isenção de impostos no país asiático.
“Consigam o acordo comercial”, disse Jasja Kotterman, que administra o rancho da família. “Isso igualaria as condições para nós.”
No entanto, o entusiasmo predominante no país sul-americano ultimamente deu lugar à resignação da improbabilidade de que um acordo comercial com a China aconteça tão cedo. O que chamou a atenção como uma nova oportunidade para o Uruguai se transformou em um alerta das armadilhas da política comercial para nações pequenas tentando lidar com realinhamentos geopolíticos complexos.
O presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, apostou seu legado econômico na realização de um acordo comercial com a China. “Temos toda a intenção de alcançá-lo”, disse ele em julho do ano passado, ao anunciar o início das negociações formais. A China estava disposta a conversar sobre um acordo bilateral com o Uruguai.
Mas as aspirações do Uruguai provocaram a ira e acusações dos vizinhos Brasil e Argentina, assim como o que foi visto como retaliação econômica. Em conjunto com o Uruguai e o Paraguai, os dois países pertencem ao Mercosul, uma aliança formada há mais de três décadas para promover o comércio na região.
Nos últimos meses, o Brasil passou por cima do Uruguai enquanto tentava conseguir um acordo mais amplo com a China em nome do bloco.
“Queremos sentar à mesa (como Mercosul) e discutir com nossos amigos chineses um acordo Mercosul-China”, disse o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, durante uma visita em janeiro à capital uruguaia, Montevidéu.
Em abril, Lula viajou para a China, onde foi recebido com tratamento especial, e participou de uma reunião com o principal líder do país, Xi Jinping. “Ninguém vai proibir que o Brasil aprimore a sua relação com a China”, disse Lula.
Qualquer interesse que o governo chinês tenha tido em fechar um acordo com o Uruguai logo foi substituído pelo foco no Brasil, uma decisão explicada por um cálculo básico de matemática: o Uruguai é um país com 3,4 milhões de pessoas, enquanto o Brasil é a maior economia da América do Sul e tem 214 milhões de habitantes.
Entretanto, apesar do presidente do Brasil ter declarado interesse em intermediar um acordo comercial, a probabilidade de um acordo entre Mercosul e China parece ser mínima ou inexistente.
O Mercosul, uma organização notoriamente lenta, repleta de discórdias internas, passou mais de 20 anos tentando concluir as negociações de um acordo comercial com a União Europeia. Um dos seus membros, o Paraguai, não tem qualquer relação com Pequim. Em vez disso, mantém relações com Taiwan. Só isso tornaria quase inimaginável a possibilidade de um acordo entre o Mercosul e a China.
Tudo isso aumentou a probabilidade do Uruguai acabar prejudicando suas relações com os vizinhos e não alcançar conquistas econômicas.
“O Uruguai está sendo usado como moeda de troca para a China negociar com o Brasil”, disse Kotterman, supervisor do rancho Álamo, enquanto uma lua cheia iluminava o pasto.