Terça-feira, 01 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 9 de agosto de 2019
O ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), disse que as mensagens obtidas ilegalmente por meio de hackers podem ser usadas, em tese, em benefício do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em evento em São Paulo, Gilmar disse que o STF já debateu sobre o uso de provas obtidas de forma ilícita e que haverá a necessidade de a Corte voltar a tratar do tema.
“Há uma jurisprudência em alguns casos em que se diz: a prova, mesmo ilícita, em alguns casos serve para isentar determinada sanção ou inocentar alguém”, declarou.
Em seguida, o ministro foi perguntado se, em tese, isso caberia ao caso de Lula. “Em tese, pode ser”, afirmou Gilmar, que participou de evento da Aasp (Associação dos Advogados de São Paulo).
O ministro evitou dizer, no entanto, se a revelação das mensagens poderia levar à anulação de processos. Afirmou, por outro lado, que o conteúdo leva a tirar a legitimidade de sentenças.
“A mim me parece que o efeito [das mensagens vazadas] já é deslegitimador dessas sentenças. Quando a gente vai para o exterior, as pessoas perguntam: como é que vocês fizeram isto? Vocês lograram um sistema de combate à corrupção, agora estão com a credibilidade do sistema afetada. Como um juiz sai para integrar um governo de oposição àquele que está preso?”
As mensagens estão sendo divulgadas desde junho pelo site The Intercept Brasil e por outros veículos de imprensa. Fazem parte do material conversas em que o ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, aconselharia procuradores da Operação Lava-Jato — por lei, um juiz não pode ajudar uma das partes de um processo.
“Certamente juiz não pode ser chefe de força-tarefa”, disse Gilmar. “Ele trabalhou tanto que daqui a pouco pode reivindicar salário na Justiça do Trabalho, acumulou funções.”
Gilmar também aparece nas conversas dos procuradores, e como alvo deles. Na quarta (7), o UOL e o The Intercept Brasil noticiaram que a força-tarefa usou a Rede para entrar com uma ação no STF contra o ministro. Nas conversas, os procuradores da Lava-Jato também falaram sobre o impeachment do ministro.
Reportagem publicada pelo El País apontou que a Lava-Jato também cogitou buscar na Suíça provas contra o ministro.
Transferência de Lula
Gilmar falou ainda sobre a decisão do STF de suspender a transferência de Lula para a penitenciária de Tremembé (SP).
O julgamento no Supremo foi precedido por uma reunião em que parlamentares de diversos partidos foram reclamar da decisão da Justiça do Paraná ao presidente da Corte, Dias Toffoli.
Segundo Gilmar, o Supremo considerou que a transferência poderia afetar negativamente a “paz social” — daí a urgência do caso.
“Em questões de horas, o tribunal fez aquela reunião especial e deliberou sobre o tema, porque entendeu que, de fato, se estava diante de uma decisão de forte teor político. E que tinha repercussões negativas sobre todo o sistema, talvez inclusive sobre a própria paz social. De modo que foi essa a avaliação que se fez, e por isso a urgência da deliberação.”
Métodos
Ao falar com jornalistas, Gilmar voltou a fazer duras críticas aos métodos da Lava-Jato.
“Estado de Direito é um modelo em que não há soberanos. Todos estão submetidos à lei. Esse modelo que se desenhou, da chamada República de Curitiba, isso não tem abrigo na Constituição.”.
O ministro também declarou que o aparato judicial vive sua maior crise desde a redemocratização, mas disse acreditar que o país sairá mais forte da atual situação. O magistrado cobrou, no entanto, o fim do que caracterizou como a busca de “falsos heróis”.
“Eu tenho a impressão de que as instituições continuam funcionando. Aqui ou acolá temos debilidades e, se vocês olharem, nós temos ao longo desses anos uma tendência — e isso também a mídia ajuda — de criar modelos de estados policialescos”, afirmou, citando a operação Satiagraha, que acabou anulada na Justiça por ilegalidades na coleta de provas.
“A toda hora, nós temos a tendência de criar heróis de pé de barro, depois se revelam falsos. Esse é um aprendizado. Tenho dito a colegas de vocês em Brasília: vamos encerrar com esse ciclo de falsos heróis. Vamos reconhecer que as pessoas têm virtudes e defeitos. A democracia convive com isso.”
No entanto, quando questionado diretamente se considerava Moro e o chefe da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, como falsos heróis, Gilmar optou por não citar nomes.
“Não vou emitir juízo, não vou fulanizar o debate. Façam vocês mesmos a avaliação, qual o juízo que os senhores tinham sobre isso ontem e hoje.”