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Edson Bündchen Anti-iluministas do século XXI

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O tempo avança e a frase inscrita no Oráculo de Delfos adquire cada vez maior propriedade. Conhece a ti mesmo passou a ser uma premissa essencial para a nossa correta inserção no mundo atual. Esse pré-requisito, herança da filosofia grega, desponta com vigor redobrado a partir da atordoante velocidade com que as informações circulam pelas redes de comunicação. A combinação da celeridade cibernética com a ausência de criticidade, aliada a uma crescente polarização política, tem levado a efeito uma afirmação de Umberto Eco, ao declarar que o drama da internet é que ela promoveu o tolo da aldeia a portador da verdade. A ignorância sem freios, contudo, não é inofensiva, a exemplo de uma conversa entre néscios esquecidos num rincão qualquer. Ao contrário, sem autoconhecimento, a autocrítica enfraquece, e a propagação indiscriminada de inverdades torna cada vez mais difícil discernir os fatos das narrativas fantasiosas, muitas delas altamente nocivas. O problema se agrava se houver, por trás da indigência intelectual, também pendores intolerantes ameaçando os direitos individuais e a própria democracia.

Bertrand Russsell advertia que o problema da moderna sociedade é que as pessoas inteligentes estão repletas de dúvidas, enquanto os idiotas estão cheios de certezas. Cegos por ideologias que muitos nem conseguem interpretar, os negacionistas de plantão abraçam teses anticiência, antidireitos humanos, e antiagenda ambiental com um fervor inquietante. Nesse contexto, a direita radical intempestivamente ressuscita os piores atributos de um mundo separado por muros ideológicos, no qual imperam a truculência verbal, a intolerância, o desprezo à ciência e uma visão obtusa e simplista da realidade. Um exemplo desse quadro obscurantista é a crítica que se faz ao chamado globalismo, que na visão da vanguarda do atraso seria uma enorme conspiração da ONU, da OMC e de outros organismos multilaterais para implementar uma política de esquerda no planeta. Ora, a defesa do meio ambiente, da diversidade cultural, da pesquisa e da ciência, do antirracismo e de muitas outras bandeiras pluralistas, não deve ser atrelada a um espectro ideológico ou outro, pois se trata de um consenso duramente arquitetado em favor de toda a humanidade. Ao admitir que essa pauta seja ideologicamente de esquerda, a ultradireita comete um grave erro de avaliação, fazendo uma leitura equivocada do contexto e condenando-se a ocupar um espaço bastante restrito do ponto de vista político-partidário, a exemplo das últimas eleições municipais ocorridas no Brasil.

Esse conjunto de teses, ditas globalistas, combatidas pelos extremistas de direita, não foi construído de uma hora para outra, mas gradualmente, a partir de um desejável processo evolutivo, de concepções baseadas em evidências, no progresso cultural da sociedade, e de muito esforço científico. Desconstruir esses avanços, defendendo teorias da conspiração, sem nenhum fundamento concreto, não é apenas desonesto intelectualmente, mas bastante perigoso em termos políticos. Os episódios recentes envolvendo a Anvisa, que colocaram em dúvida a credibilidade do Instituto Butantã, bem como as frequentes polêmicas na área do meio ambiente e na condução da pandemia da Covid-19, dão a dimensão trágica que o negacionismo pode promover. Todos também sabemos que o resultado político de arroubos inconsequentes e mentiras irresponsáveis, invariavelmente repercutem nos mais vulneráveis e no desgaste da própria democracia. Ao contrário de uma visão reacionária do mundo, precisamos valorizar a autodeterminação do indivíduo, o direito à liberdade, o respeito aos direitos humanos, o incentivo à ciência, e à sustentabilidade do nosso desenvolvimento, equilibrando as agendas econômica, social, ambiental e cultural. Sem isso, o Brasil não se habilita a ingressar competitivamente na moderna comunidade global, inexoravelmente cada vez mais integrada, multicultural e complexa.

 

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https://www.osul.com.br/anti-iluministas-do-seculo-xxi/ Anti-iluministas do século XXI 2020-12-10
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