Quarta-feira, 07 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 6 de março de 2022
Em 30 anos, o Brasil passou de uma safra de 100 milhões para quase 300 milhões de toneladas de grãos. Consolidou-se como um dos mais importantes produtores e exportadores agrícolas globais, uma potência em segmentos como soja, milho, café, cana-de-açúcar e laranja, entre outras culturas. Mas a capacidade de produção de fertilizantes não acompanhou esse salto. Na verdade, até recuou – em 2017, o País produzia 8,2 milhões de toneladas, número que caiu para 6,5 milhões em 2020.
Para sustentar o avanço das lavouras, foi necessário ampliar a importação dos fertilizantes. Segundo dados da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda), em 2020 o mercado brasileiro consumiu 40,6 milhões de toneladas. Desses 32,9 milhões (81%) vieram de fora. Uma boa parte disso, da Rússia. E, com o mercado russo fechado por causa das sanções provocadas pela guerra na Ucrânia, o Brasil tem um problema de razoáveis proporções para ser resolvido.
“Precisamos fomentar a produção aqui dentro”, diz Ricardo Tortorella, diretor executivo da Anda. “O governo está anunciando um plano nacional de fertilizantes, pois temos o insumo debaixo da terra, mas precisa de muita coisa para colocar esse produto no mercado, como logística, regras e licenças. O plano é oportuno, mas foi desenhado para os próximos 30 anos (leia mais abaixo). Não é a solução para o problema que temos agora.”
Segundo ele, o Brasil vai precisar de 10 milhões de toneladas de cloreto de potássio para a próxima safra, e a expectativa é de que 3 milhões venham da Rússia. “Se não vierem, vamos ter de comprar de outros países, como o Canadá. O problema é que o mundo inteiro se abastece na Rússia, e muitos países vão procurar alternativas, não só o Brasil.”
Segundo dados da associação, o Brasil é o quarto maior consumidor de fertilizantes, atrás da China, da Índia e dos Estados Unidos, mas é o maior importador mundial desses insumos – basicamente nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K). Isso se explica pela composição dos solos brasileiros, pobre em nutrientes, devido à sua característica tropical, principalmente na região do cerrado, onde se concentra a maior produção de grãos.
Riscos
Para a safra atual, por conta dos preços, que já vinham altos antes mesmo de começar o conflito no Leste Europeu, os produtores não anteciparam as compras de fertilizantes no volume de anos anteriores. “O que os agentes do mercado comentam é que a antecipação foi em torno de 30% este ano”, disse Tortorella.
“No ano passado, na mesma época, estava acima disso. E a guerra pode impor riscos para a próxima safra. Se o conflito acabar de hoje para amanhã, os fluxos de insumos da Rússia para o Brasil vão continuar. Se demorar até três meses, temos de buscar soluções que ajudem nossa safra a manter seu ritmo, que tem sido crescente.”
Para o especialista em questões globais do agronegócio e sustentabilidade, Marcos Jank, faltou investimento nas últimas décadas na produção nacional de fertilizantes. “Houve muitos projetos que não foram aprovados por falta de licenciamento. Nos tornamos o maior importador mundial.”
Ele lembrou que o avanço na produtividade de grãos do País implicou maior consumo de adubos. “Passamos a fazer duas safras anuais, a ter mais produtividade sem aumento de área, a fazer a integração pecuária-agricultura, tudo com um consumo maior de fertilizantes. Só que não houve política para aumentar a produção interna e, sem esse incentivo, ficava mais caro produzir aqui. Era mais fácil importar, e o Brasil passou a recorrer ao mercado externo, gerando a dependência que temos hoje.”
Jank não vê possibilidade de reversão desse quadro em um prazo curto. “O pessoal está falando que agora precisa ter o plano nacional de fertilizantes, mas isso não vai resolver o problema imediato”, disse. “Nessa altura, a melhor solução é diversificar a importação para não depender de um mercado só, como acontece com a dependência da Rússia.”