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Por Redação O Sul | 8 de maio de 2019
O Ministério da Saúde emitiu um despacho em que defende abolir de políticas públicas e normas o uso do termo “violência obstétrica”, citado frequentemente para definir casos de violência física ou psicológica praticados contra gestantes na hora do parto. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.
A medida, que indica uma mudança de posicionamento da pasta, tem gerado reação entre especialistas e grupos de defesa das mulheres. Nos últimos anos, o debate em torno de casos de violência obstétrica ganhou força no país em meio a campanhas a favor do parto normal e do atendimento humanizado – algumas delas abraçadas pelo próprio Ministério da Saúde.
Texto publicado pela pasta em 2017, por exemplo, já citava a existência do problema. “Você sabe o que é violência obstétrica? Pois saiba que até mesmo muitas vítimas desse tipo de abuso também não. Esse tipo de violência atinge boa parte das mulheres e bebês em todo o país.”
Em seguida, o próprio Ministério da Saúde passava a definir a violência obstétrica como aquela que ocorre na gestação ou parto, podendo ser “física, psicológica, verbal, simbólica e/ou sexual, além de negligência, discriminação e/ou condutas excessivas ou desnecessárias ou desaconselhadas, muitas vezes prejudiciais e sem embasamento em evidências científicas”.
Entre os exemplos, estão restringir o direito de acompanhante e ao alívio da dor, impedir que mulher se movimente, beba água ou coma alimentos leves durante o trabalho de parto e realizar episiotomia (corte feito entre a região do ânus e da vagina durante o parto normal) quando não há indicação. Entram na lista também ameaças, piadas ou frases desrespeitosas como “na hora de fazer não reclamou”.
Despacho emitido na última sexta-feira (3), porém, adota outra orientação. No documento, o ministério diz avaliar que o termo “tem conotação inadequada, não agrega valor e prejudica a busca do cuidado humanizado no continuum gestação-parto-puerpério.”
A justificativa, informa, estaria na definição do termo violência pela Organização Mundial de Saúde, que “associa claramente a intencionalidade com a realização do ato, independentemente do resultado produzido.”
“Percebe-se, desta forma, a impropriedade da expressão ‘violência obstétrica’ no atendimento à mulher, pois acredita-se que tanto o profissional de saúde quanto os de outras áreas não têm a intencionalidade de prejudicar ou causar dano”, informa.
No despacho, a pasta afirma ainda trabalhar para qualificar o cuidado das mães e diminuir os índices de mortalidade materna e infantil. Por conta disso, defende adotar estratégias para abolir o uso da expressão “com foco na ética e na produção de cuidados em saúde qualificada”.
A divulgação do posicionamento, no entanto, tem gerado polêmica entre especialistas e grupos em defesa das mulheres.
Para a médica Sônia Lansky, que foi uma das coordenadoras regionais da pesquisa Nascer no Brasil, da Fiocruz, que entrevistou mais de 23 mil mulheres sobre a assistência ao parto no Brasil, excluir o uso do termo pode soar como uma forma de censura institucional.
Ela lembra que o termo violência obstétrica está consolidado em literatura científica — neste sentido, diz, não haveria como aboli-lo. Alguns países, como Venezuela e Argentina, possuem legislações sobre o tema desde 2007.
“Não há como cercear a liberdade de informação e como as mulheres identificam esse tipo de violência. É um problema de grande relevância em saúde pública. O ideal seria discutir porque esse incômodo tão grande e esclarecer que não é dirigido a ninguém em específico mas à situação da violência obstétrica. É uma violência estrutural”, diz.
Segundo ela, dados da pesquisa dão pistas do tamanho do problema no país. Um exemplo é que, entre as entrevistadas que tiveram parto normal, 53,5% sofreram episiotomia – enquanto registros na literatura apontam que esse procedimento seria necessário em menos de 10% dos casos. Outras 36% sofreram manobra de Kristeller, pressão no útero para saída do bebê, a qual é contraindicada pelo Ministério da Saúde.
Também foi alto o índice de mulheres sem acesso à presença contínua de acompanhante, assegurada por lei.
Para Débora Diniz, do Instituto Anis Bioética, Direitos Humanos e Gênero, organização que atua em defesa dos direitos das mulheres, o novo posicionamento do ministério representa uma tentativa do governo de negar a existência do problema.
Em nota, o Ministério da Saúde diz que o posicionamento foi feito a pedido de entidades médicas e segue pareceres destas entidades.