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Por Redação O Sul | 7 de março de 2021
Em seus oito anos de pontificado, as viagens do papa Francisco foram bastante diferentes das dos seus antecessores. Muitas delas não se destinaram aos grandes centros católicos do mundo — Europa, América do Sul e regiões da África.
Ele foi várias vezes a locais onde os cristãos são uma minoria: Tailândia, Emirados Árabes Unidos, Japão e Coreia do Sul.
Agora é a vez do Iraque: acredita-se que na região de Ur (na atual província de Dhi Qar) nasceu Abraão, considerado o pai das três principais religiões monoteístas do mundo (cristianismo, judaísmo e islamismo).
Atualmente, esse mesmo local é o lar de uma minoria cristã que está à beira da extinção por vários motivos, entre eles a perseguição de grupos radicais, como o autodenominado Estado Islâmico.
No que foi o ponto alto da visita, programada para durar três dias, estava o encontro do papa Francisco que se reuniu no sábado com o principal líder religioso xiita, o aiatolá Ali al-Sistani.
Este encontro entre as duas religiões foi descrito como “histórico”.
O papa Francisco viajou para a cidade sagrada de Najaf, cerca de 160 quilômetros ao sul da capital Bagdá. O local é um centro de peregrinação para xiitas de todo o mundo.
O aiatolá é uma das figuras mais poderosas do Islã e seus fátuas (pronunciamentos religiosos) levaram muitos muçulmanos a se mobilizarem em 2014 contra o Estado Islâmico.
Em janeiro de 2019, Ali al-Sistani pediu para investigar os “crimes atrozes” perpetrados por jihadistas sunitas contra algumas minorias na sociedade iraquiana. Durante o encontro, o papa agradeceu ao aiatolá “por erguer a voz em defesa dos mais fracos e perseguidos, afirmando que o sagrado é a importância da unidade do povo iraquiano”.
Ele também destacou “a importância da colaboração e da amizade entre as comunidades religiosas para que, cultivando o diálogo com respeito recíproco, se possa contribuir para o bem do Iraque, da região e de toda a comunidade”.
A viagem pastoral, que começou na sexta-feira (5), é a primeira em 15 meses devido à pandemia de covid-19.
O porta-voz do Vaticano, Mateo Bruni, destacou que a intenção da viagem é mostrar a proximidade do papa com as comunidades cristãs ameaçadas.
“É um gesto de amor por aquela terra, pelo seu povo e pelos cristãos”, declarou.
Mas por que a comunidade cristã residente no Iraque está à beira da extinção?
O alerta mais enfático sobre a iminente extinção foi feito várias vezes pelo reverendo Bashar Warda, o arcebispo de Erbil — uma das cidades que está na rota de visitas de Francisco.
“O cristianismo no Iraque é uma das religiões mais antigas, senão a mais antiga do mundo, e está perigosamente perto da extinção. Aqueles de nós que permanecerem devem estar preparados para enfrentar o martírio”, disse Warda.
A presença cristã no Iraque é praticamente tão antiga quanto a própria religião: de fato, há muito mais cidades e lugares mencionados na Bíblia que estão localizados neste país do que em Israel e nos territórios palestinos.
Seu ponto de partida histórico pode ser localizado no século V, quando o Concílio de Niceia registrou a presença de bispos da região mesopotâmica.
Em seguida, veio a criação da Igreja Oriental, com fortes raízes na parte norte do Iraque, e o estabelecimento do mosteiro de Santo Elias nas proximidades da atual cidade de Mosul, durante o século VI.
Em um artigo para o site The Conversation, Ramazan Kılınç, professor de ciência política da Universidade de Nebraska, nos Estados Unidos, escreveu que a maioria dos cristãos iraquianos são etnicamente assírios e pertencem à Igreja Oriental, um dos três grandes ramos do cristianismo no Oriente. “A adoração é feita num dialeto do aramaico, a língua em que Cristo supostamente falava.”
O professor Kılınç acrescenta que a maior dessas comunidades assírias pertence à Igreja Católica Caldeia, que reúne mais de dois terços de todos os cristãos que vivem no Iraque.
As constantes perseguições religiosas e políticas contra esses grupos aumentaram nos últimos cinco anos.
O bispo Warda resumiu isso em uma frase certamente polêmica: “Há um número crescente de grupos extremistas que afirmam que o massacre de cristãos e yazidis durante esses anos ajudou a espalhar o Islã”, disse o reverendo iraquiano.