Terça-feira, 07 de maio de 2024
Por Redação O Sul | 19 de janeiro de 2021
O chamado “kit cloroquina” teve uma explosão de buscas em 2020. Com o presidente Jair Bolsonaro, que não é médico, indicando equivocadamente um tratamento precoce – que não existe – contra a covid-19, as pesquisas por hidroxicloroquina, ivermectina, azitromicina e annita lideraram o interesse de compra na plataforma Consulta Remédios.
De acordo com o site, que conta com mais de 120 milhões de usuários cadastrados, a ivermectina somou 9.293.076 buscas no ano passado e foi seguida pela azitromicina, com 3.590.608 buscas.
A hidroxicloroquina aparece em terceiro lugar, com 2.768.334 buscas. Em quarto lugar, vem o Dexametasona, com 2.682.689 buscas; em quinto, aparece a Prednisona, com 2.249.605 buscas e na sexta colocação vem o vermífugo annita, com 2.232.544 buscas.
Para Francielle Mathias, farmacêutica responsável pela plataforma, a explicação para a liderança da ivermectina nesse ranking está no fato de ser um medicamento de fácil acesso e o baixo custo nas farmácias, além da ampla divulgação feita pelo governo.
Sem comprovação científica
O comportamento dos brasileiros em busca de medicamentos sem nenhuma comprovação científica contra covid-19 mostra como a desinformação propagada pelo governo tem o poder de mobilização.
Em julho do ano passado, após inúmeros estudos alertarem para o perigo de tomar hidroxicloroquina, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) afirmou que era urgente abandonar o uso da droga no tratamento de pacientes com covid-19, em qualquer fase da doença, inclusive na sua prevenção.
Evidências científicas mostraram que o remédio não só não possui benefício contra a doença, como também pode agravar quadros de pacientes internados e causar a morte.
Apesar disso, o governo Bolsonaro insistia em prescrever a droga, chegando a enviar um ofício à Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) pedindo que a instituição indicasse e promovesse amplamente no SUS o tratamento com uso de cloroquina e hidroxicloroquina para pacientes de covid-19, já nos primeiros dias de sintomas.
O documento dizia que a medicação fazia parte de estratégia do Ministério da Saúde para reduzir o número de casos de internação hospitalar.
Médico admite ineficácia
Um dos primeiros e mais influentes médicos defensores do uso da hidroxicloroquina no tratamento da covid-19 mudou de ideia. Didier Raoult, microbiologista francês, agora afirma que o emprego do medicamento em nada influi na redução de mortes ocasionadas pela doença.
“As necessidades de oxigenoterapia, a transferência para UTI e o óbito, não diferiram significativamente entre os pacientes que receberam hidroxicloroquina com ou sem azitromicina e os controles feitos apenas com tratamento padrão”, disse em carta enviada ao Centro Nacional de Informações de Biotecnologia da França. O documento, originalmente publicado em 4 de janeiro, foi obtido pelo jornal francês Le Figaro.
No início da pandemia, entre março e maio de 2020, um estudo conduzido por Raoult serviu de base para que muitos chefes de estado adotassem o uso da cloroquina como tratamento e também na prevenção da covid-19.
O estudo em questão, porém, não obedeceu a padrões técnicos e contava com apenas 42 participantes, indo em contraste com diversas outras pesquisas – com recortes maiores de população –, que revelaram que o medicamento não influi em nada e, se aplicado em excesso, pode trazer mais efeitos colaterais nocivos. Raoult chegou até a ser investigado pelo conselho federal de medicina na França.