Terça-feira, 09 de setembro de 2025
Por Redação O Sul | 15 de dezembro de 2019
Apesar da manutenção da tendência de queda dos homicídios, o primeiro ano da segurança pública sob a presidência de Jair Bolsonaro foi marcado por uma sucessão de propostas legislativas e poucas ações práticas.
Os exemplos estão no pacote anticrime, no vaivém de oito decretos de armas, na lei que prioriza internação compulsória de usuários de drogas e no texto que tenta emplacar o excludente de ilicitude – mecanismo que exime policiais que matem em serviço de responderem à Justiça.
Balanço do Instituto Sou da Paz considerou que houve mais retrocessos do que avanços na área. De 24 medidas anunciadas, 15 devem ter impacto negativo na avaliação da entidade; 6 são vistas como positivas e 3 ainda não têm efeito claro.
Na lista dos que acendem o alerta vermelho estão os decretos que flexibilizam o porte e a posse de armas. Em um dos textos, Bolsonaro dava o direito de andar armado a 20 categorias profissionais, como advogados, caminhoneiros e jornalistas. Mas, sob críticas, o governo recuou de parte das propostas.
Segue em vigor, no entanto, norma que permite a compra de pistolas que antes eram de uso restrito das forças de segurança, como a 9 mm e a .45. Também foi autorizado que proprietários rurais andem armados em toda a extensão de sua propriedade e que adolescentes a partir de 14 anos pratiquem tiro desportivo sem autorização judicial.
Outra marca do governo foi o discurso de estímulo ao confronto e à repressão policial, e a aposta em projetos de lei para conceder presunção de legítima defesa a policiais. A tentativa apareceu no pacote anticrime, apresentado pelo ministro Sergio Moro. O agente estaria isento de pena se o ato fosse cometido por “medo ou violenta emoção”.
O trecho acabou retirado pelos deputados e o projeto foi aprovado no Congresso, mas sem as principais bandeiras bolsonaristas. Um novo texto enviado pelo governo federal ao Congresso quer que policiais não sejam punidos caso matem durante operações de GLO (Garantia da Lei e da Ordem). A pauta deve ser votada em 2020.
A insistência no excludente de ilicitude é criticada por Arthur Trindade, professor da UnB e conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “Ao invés de prestigiar as polícias pelo profissionalismo, o presidente defende que a polícia precisa de autorização para matar. Por ano, já são mais de 6.000 mortes provocadas pela polícia. Quantas resultaram em prisão?”
No saldo do ano, diz Trindade, “o que vimos foram discursos do Bolsonaro defendendo abusos da polícia”. Para ele, o Ministério da Justiça e Segurança Pública tinha o cenário mais favorável para propor novas ideias, pois, além de o combate à violência e à corrupção serem as principais bandeiras eleitorais de Bolsonaro, Moro é o ministro mais bem avaliado pela população —em pesquisa do Datafolha, o índice do ex-juiz supera o do presidente.
Entretanto, diz o professor, “pouco esforço foi feito para além da pauta legislativa, quando o mais urgente era formular políticas públicas”. A pasta também foi acusada de práticas de tortura em presídios do Pará e do Ceará. Três relatórios de órgãos oficiais apontaram uma série de violações que estariam sendo praticadas por agentes da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP), enviados pelo ministro aos estados.
A FTIP foi criada em 2017, mas sua ação foi intensificada neste ano, na gestão de Moro. Os agentes federais já atuaram no Amazonas, em Roraima e no Rio Grande do Norte. O ex-juiz e o diretor-geral do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), Fabiano Bordignon, defendem a atuação da força-tarefa e negam que tenha havido tortura. O balanço do Sou da Paz mostra ainda que, nos primeiros dez meses de governo, o ministério só gastou 13,4% do orçamento anual do Fundo Nacional de Segurança Pública. Desse percentual, 77% foi destinado à Força Nacional, ou seja, a operações emergenciais ostensivas e repressivas. Ações de prevenção da violência carecem de recursos.