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Por Redação O Sul | 16 de agosto de 2019
O projeto de lei contra abuso de autoridade contém trechos que têm relação direta com alguns dos principais métodos usados pela Operação Lava-Jato e que geraram intensas críticas sobre supostos abusos e ilegalidades.
Há, por exemplo, dois “artigos Lula”, um que veda condução coercitiva sem prévia intimação e outro que trata da divulgação de gravações, e um “artigo Cabral”, que proíbe algemar presos quando não há resistência à prisão ou risco de fuga.
O artigo 10º do projeto aprovado prevê pena de detenção de um a quatro anos e multa para o juiz que decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado de forma “manifestamente descabida ou sem prévia intimação de comparecimento ao juízo”.
Em 4 de março de 2016, o então juiz federal de Curitiba, o hoje ministro Sérgio Moro (Justiça), expediu um mandado de condução coercitiva contra o ex-presidente Lula (PT) sob o argumento de que, assim, evitaria tumultos.
“Esse é o primeiro ‘artigo Lula’. Parece um componente bem objetivo, se a pessoa não foi intimada antes, não pode sofrer a condução coercitiva. Isso vai exigir dos magistrados uma atenção maior”, disse o advogado criminalista Luís Henrique Machado, que atua em casos da Lava-Jato no STF (Supremo Tribunal Federal).
No sentido contrário, Victor Hugo Azevedo, presidente da Conamp, entidade que representa cerca de 15 mil membros do Ministério Público no país, entende que as conduções coercitivas são “um instrumento importante nas investigações criminais e têm produzido resultados importantes”.
“Retirar, na prática, essa possibilidade do sistema judicial criminal vai prejudicar as investigações. E também poderá ter um efeito colateral contrário, que é fazer aumentar os casos de prisão provisória”, disse o promotor no Rio Grande do Sul.
Outro artigo do projeto aprovado, o 28º, prevê detenção de um a quatro anos e multa para a autoridade que “divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado ou acusado”.
Em 16 de março de 2016, por ordem de Moro, foi tornada pública uma série de telefonemas trocados entre Lula e outras pessoas de seu convívio, como a sua mulher, Marisa Letícia (1950-2017), e filhos.
Na ocasião, o então ministro relator da Lava-Jato STF, Teori Zavascki, considerou a divulgação indevida e anulou determinadas escutas. Moro pediu “respeitosas escusas” ao tribunal — depois ele voltaria a defender sua decisão.
Desde que começou, em 2014, e a exemplo de todas as grandes operações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, a Lava-Jato utilizou em larga escala a prática das prisões temporárias e preventivas. Em alguns casos, se arrastaram por meses e até mais de um ano, sem uma condenação.
No projeto aprovado pela Câmara, o artigo 9º prevê detenção de um a quatro anos e multa para o juiz que decretar “medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade com as hipóteses legais”.
“O mais importante no projeto aprovado é a imprecisão dos tipos penais, das expressões utilizadas”, disse o promotor Azevedo. “Por exemplo, o que é ‘manifesta desconformidade’, o que é ‘manifesta ilegalidade’? Veja o pepino com que fica o juiz”, diz.
Para Machado, advogado criminalista, “o problema nesse ponto do projeto é que abre uma margem de interpretação muito grande”. Segundo ele, o STF vai ser provocado para definir melhor pontos como esse.
O artigo 17º do projeto parece ter relação direta com um dos episódios mais criticados da Lava-Jato, quando a Polícia Federal em Curitiba colocou algemas nos pés e nas mãos do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB-RJ) para transportá-lo até o IML (Instituto Médico Legal), onde passaria por exame de corpo de delito.
O artigo do projeto aprovado agora prevê detenção de seis meses a dois anos e multa para a autoridade que submeter o preso ao uso de algemas quando manifestamente não houver resistência, ameaça de fuga ou risco à integridade física do próprio preso.