Quinta-feira, 27 de novembro de 2025
Por Redação O Sul | 26 de novembro de 2025
Enquanto o Senado Federal e a Câmara dos Deputados debatiam proposições que criam regras para aposentadoria especial para agentes comunitários de saúde (ACS) e agentes de combate a endemias (ACE), o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva já rascunhava uma espécie de mapa da judicialização para a proposta.
Nota técnica do Ministério da Previdência obtida pelo jornal O Estado de S. Paulo afirma como a proposta sobre aposentadoria dos agentes de saúde contém “incoerências com o texto constitucional vigente e com sua evolução histórica, tanto em regras previdenciárias quanto financeiras”.
Entre os argumentos já apresentados pelo ministério, está o de que o novo sistema pode sugerir a interpretação de que as normas jurídicas do modelo excluem as normas constitucionais previdenciárias dos regimes públicos de previdência, tanto do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) quanto do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).
O ministério também citou a “violação e afronta” ao pacto federativo, sob a justificativa de que significará o esvaziamento completo da competência dos Estados, Distrito Federal e municípios em matéria de previdência dos agentes. A pasta sustenta que a proposta representa “grave restrição” da prerrogativa de cada ente federativo para tratar de regime funcional e aposentadoria de seus servidores.
Os técnicos também destacaram que a proposta sobre a aposentadoria dos agentes de saúde “contraria toda a motivação” da aprovação da PEC 66 – já transformada em emenda constitucional –, que posterga o pagamento de precatórios e trata do parcelamento de dívidas de Estados e municípios com seus RPPS, “justamente pelas crescentes limitações financeiras e orçamentárias”.
Na segunda-feira, o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, chegou a dizer que, no caso de aprovação no Congresso, o governo poderia vetar o projeto, levando o caso para o Supremo Tribunal Federal (STF).
“Caso uma matéria desse tipo, com esse tamanho de impacto, avance, nós vamos ser obrigados a fazer o veto e, se o veto cair, obrigados a ir ao Supremo, para que a gente restabeleça o precedente de exigir o cumprimento aqui das regras fiscais básicas do País.”
Avaliação
O advogado Wilton Gomes, doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), reforçou as teses da nota do Ministério da Previdência e avaliou que a PEC aprovada na Câmara “é, em síntese, inconstitucional”. “Retroagir os vínculos empregatícios sem concurso público desses servidores já afronta as regras constitucionais de acesso ao funcionalismo público”, afirmou.
O especialista disse ainda que, em sua avaliação, a proposta foi aprovada pelos deputados sem os devidos cálculos de despesas que comprovem a sua viabilidade. “Impor despesas sem fonte de custeio é inconstitucional”, afirma.
Na mesma linha, o advogado Rafael Cezar dos Santos, especialista em Direito Público, salientou como a proposta já aprovada na Câmara “atinge pontos sensíveis” da Constituição. “A PEC prevê a efetivação de agentes que hoje possuem vínculos precários ( indiretos ou temporários) com o SUS, equiparando-os a servidores efetivos. Isso significa que serão profissionais que passarão a integrar definitivamente os quadros da administração pública, porém, sem a prévia aprovação em concurso público”, disse. “Além disso, ao impor aos municípios a obrigação de absorver esses vínculos, a PEC toca no núcleo do pacto federativo, pois a União não detém competência para dispor sobre o quadro de pessoal das administrações locais.”
Impacto fiscal
Questionado sobre a estimativa do impacto fiscal da aposentadoria especial, o auxiliar do ministro Fernando Haddad citou “estimativas muito genéricas e pouco precisas”. “Então, eu prefiro não dizer aqui, até para não minimizar eventual impacto que pode ser maior do que colocado”, afirmou.
Em outubro, a Previdência estimou um acréscimo financeiro de R$ 24,72 bilhões nos gastos dos dois regimes previdenciários (geral e próprio) ao longo de dez anos. A pasta ressaltou que o cálculo era inicial e não definitivo, “uma vez que considera somente a regra permanente da PEC, e não os efeitos das regras de transição, nem a extensão aos atuais aposentados, em razão da paridade prevista na proposta”.
Segundo o deputado que relatou a proposta na Câmara, Antonio Brito (PSD-BA), o custo seria de R$ 5,5 bilhões até 2030, com todas as despesas custeadas pela União. Já um estudo da Confederação Nacional de Municípios (CNM) calculou impacto de R$ 103 bilhões nos regimes de prefeituras. Com informações de O Estado de S. Paulo