Quinta-feira, 06 de março de 2025
Por Redação O Sul | 11 de agosto de 2024
Na véspera da eleição presidencial de 28 de julho na Venezuela, o presidente Nicolás Maduro convocou embaixadores estrangeiros e convidados internacionais para um evento na base militar de La Carlota, em Caracas. Na primeira fila, estavam sentados, entre outros, os embaixadores da Rússia e China no país, Sergey Mélik-Bagdasárov e Lan Hu, respectivamente. Imagens dos canais de TV locais mostraram Maduro cumprimentando os dois com grande efusividade. Bem mais no fundo, quase despercebidos, estavam os representantes de países da região, como Brasil e Colômbia, atualmente à frente da única iniciativa da comunidade internacional para tentar mediar uma negociação entre o Palácio Miraflores e a oposição após a contestação dos resultados eleitorais.
A cena reflete a forte guinada da Venezuela em sua política externa desde 2018, quando passou a ser alvo de quase mil sanções dos EUA, Canadá e vários países europeus após a primeira reeleição não reconhecida de Maduro. Parceiros que já existiam desde a Presidência de Hugo Chávez (1999-2013) se tornaram uma base essencial para a sobrevivência de Maduro. Enquanto Rússia, China, Turquia e Irã ampliaram sua influência no país, o Brasil, entre outros vizinhos, optaram pela estratégia de isolamento, juntamente com EUA e União Europeia (UE). Foi a época do chamado Grupo de Lima, que exerceu forte pressão contra Maduro, liderado, entre outros, pelo Brasil governado por Michel Temer e, posteriormente, Jair Bolsonaro. A estratégia, impulsionada pelo governo do ex-presidente e agora candidato presidencial republicano Donald Trump, fracassou.
Com a volta de Luiz Inácio Lula da Silva ao poder, o Brasil reatou as relações bilaterais no início de 2023, mas nada voltou a ser como antes. Hoje respaldado pelos países que o ajudaram a driblar sanções, reabastecer os supermercados venezuelanos, conseguir investimentos para os setores de petróleo, gás e energia elétrica, treinar militares, fortalecer sistemas de segurança internos, extrair ouro em jazidas locais e vendê-lo no exterior, entre outros tipos de parcerias econômicas e militares, Maduro indica avaliar ter boa margem de manobra para recrudescer a repressão interna mesmo sob contestação de parte da comunidade internacional – enquanto EUA não o reconhecem como vencedor, Brasil e Colômbia reivindicam, com o México, a apresentação das atas eleitorais.
“Maduro se aliou a países não ocidentais, nos quais valores democráticos têm pouco peso na hora de tomar decisões sobre comércio ou investimentos econômicos”, explica o advogado e especialista em temas internacionais venezuelano Mariano de Alba, apontando que, na lista de aliados, entrou a Hungria de Viktor Orbán: “[Ele] tem conseguido impedir consensos dentro da Comissão e Parlamento da UE sobre a Venezuela.”
Apesar do novo apoio, o eixo da política externa de Caracas está sob controle de Pequim e Moscou, para os quais a Venezuela interessa por sua localização geográfica na América Latina, em uma estratégia de longo prazo alimentada pela rivalidade e disputa de poder com os Estados Unidos.
“A geopolítica explica”, resume o analista venezuelano Piero Trepiccione. “Por parte dos russos, o recado aos americanos é claro: vamos fortalecer nossa presença na Venezuela e, por meio dela, na América Latina, assim como vocês se envolveram na Ucrânia, em nossa região.”
Para a China, aliada da Rússia no conflito contra a Ucrânia, a aliança com a Venezuela faz parte de um plano de consolidação de sua influência numa região que, até há pouco tempo, era zona de atuação quase exclusiva dos EUA, afirma Trepiccione.
Quando Chávez ainda era vivo, relata Alba, “a China concedeu empréstimos de cerca de US$ 60 bilhões ao governo venezuelano. Pelas dificuldades de pagamento da Venezuela, o socorro financeiro diminuiu com Maduro, mas não foi cortado”. Segundo Trepiccione, o dinheiro de Pequim hoje entra “mais por meio de investimentos de empresas privadas, por exemplo no setor automobilístico”.
Outras parcerias
Irã e Turquia também são relevantes. Segundo os analistas, além da parceria política, Teerã e Caracas têm uma aliança de ajuda mútua, em que compartilham táticas para driblar bloqueios externos já que os dois enfrentam sanções econômicas. Segundo Andrei Serbin Pont, presidente da Coordenadora Regional de Pesquisas Econômicas e Sociais (Cries), “Irã e Turquia formam parte de um mecanismo criado pela Venezuela para extrair minerais como o ouro e comercializá-los fora do país”. Mas, apesar da presença de Teerã no instrumento, Ancara tem um papel mais relevante:
“A extração e venda do ouro venezuelano com a ajuda da Turquia, como tantas outras operações comerciais feitas com sócios estrangeiros, funciona de uma maneira informal e obscura”, afirma Pont. As informações são do jornal O Globo.