Sexta-feira, 26 de abril de 2024
Por Lenio Streck | 5 de dezembro de 2020
Um néscio é um sujeito tolo, alienado, que nem sabe que não sabe das coisas do mundo. Néscio, digamos assim, é uma espécie de estúpido. O estúpido (uso, agora, o conceito epistemológico de dois autores: Carlo Cipolla e Mauro Mendes Dias) é um sujeito perigoso. Inclusive contra si.
O estúpido é regido por cinco leis fundamentais, conforme ensina Cipolla:
1. Sempre e inevitavelmente, cada um de nós subestima o número de indivíduos estúpidos que circulam pelo mundo jurídico.
Com efeito, ao ver políticos dizendo que esquerdistas são a favor de churrasco de carne de cachorro, a lei n. 1 está demonstrada. Quod erat demonstrandum constante.
2. A probabilidade de que uma determinada pessoa seja estúpida é independente de qualquer outra característica da mesma pessoa.
De fato, essa segunda lei também é verificável, já que nas diversas camadas da sociedade, a distribuição do IE — índice de estupidez é quase igual. Nesta época de pandemia isso fica mais visível. Basta uma olhada rápida no mundo das lives. Todo mundo virou “artista”, com o que todos gatos se tornaram pardos. E as redes sociais são a parte mais visível do IE. As neocavernas – assim denomino esse fenômeno – desafiam o desgosto de Platão. Aliás, foi Platão quem, pela primeira vez, denunciou fake news e tuitamentos idiotas. Leia o Mito da Caverna e saberá.
3. Uma pessoa estúpida é aquela que causa dano a outra pessoa ou grupo sem, ao mesmo tempo, obter um benefício para si mesmo ou mesmo causar prejuízo.
Perfeito. Cipolla não considerou a estupidez como uma questão de quociente intelectual, mas sim uma falta de inteligência relacional. Ele parte da ideia de que, ao nos relacionarmos uns com os outros, podemos obter benefícios e proporcionar benefícios aos outros ou, pelo contrário, podemos causar danos ou prejudicar os outros. Ao ler alguns posts nas redes sociais, vejo que não é assim. O néscio dá um tiro no pé.
Isto é, uma pessoa estúpida é aquela que prejudica os outros e muitas vezes também ela mesma. Basta ver nas redes sociais. Se você posta algo sofisticado, o estúpido vem e faz como o pombo no jogo de xadrez: esculhamba as pedras e faz cocô no tablado. E sai dizendo que venceu. De peito estufado. Orgulhoso de sua vencedora estupidez. Por que um néscio quer esculhambar o discurso que ele não entende ou nunca se esforçou para entender?
Está comprovada a terceira lei: o néscio não se importa com soma zero. Há ainda o supernéscio: aquele que esculhamba os não-néscios e ainda se prejudica, sendo processado pelo que postou. Ou seja, só prejuízo.
4. Os não-estúpidas sempre subestimam o potencial prejudicial de
estúpidos.
Essa quarta lei de Cipolla é autoexplicativa. Por vezes, eles atacam à socapa e à sorrelfa. E nem conseguimos reagir. Estupefatos com a estupidez dos estúpidos.
5. O estúpido (ou néscio) é o mais perigoso.
Por último, a quinta lei. Como diz Cipolla, “Todos os seres humanos estão incluídos em quatro categorias fundamentais: o
desavisado, o inteligente, o malvado (ou ladrão) e o néscio. De onde: (i) A pessoa inteligente sabe que é inteligente; (ii) o malvado está ciente de que ele é mau; (iii) o desavisado é dolorosamente imbuído do senso de sua própria sinceridade e, (iv) ao contrário de todos esses personagens, o néscio não sabe que é estúpido. Ele não sabe que não sabe.
Ufa. Enfim, não inventei as cinco leis. Foi Cipolla. E Mauro Mendes Dias as aperfeiçoou.
Saludo!