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| “E o deseja sorte nos próximos…”

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Arte: Marcos Cunha/O Sul

Na magistral letra de “Língua”, de Caetano Veloso (do disco “Velô”, de 1984), encontram-se os versos “Você e tu / Lhe amo”, que ocorrem num momento em que a letra faz uma bela colagem de exemplos dos diversos falares do português.

Pois bem. A que se referem esses dois versos? O primeiro (“Você e tu”) se refere às duas formas de tratamento íntimo direto que se alternam Brasil afora. Na cidade de São Paulo, por exemplo, o pronome “você” predomina, o que não ocorre em outra cidade paulista, Santos, na qual o pronome “tu” é frequente. Na cidade do Rio de Janeiro e em boa parte do norte, do nordeste e do sul, a forma predominante também é “tu”.

E o verso “Lhe amo”? Faz referência a um fato muito comum em diversos falares brasileiros: o emprego de “lhe” como complemento verbal direto, o que não ocorre no padrão formal escrito. Tradução: o verbo “amar” é usado sem preposição, tanto no padrão informal quanto no formal (se alguém ama, ama alguém: “Eu amo você”; “Você ama os seus filhos”; “Ela ama o namorado” etc.). No padrão formal, isso é razão para que o complemento de terceira pessoa de “amar” (e de todos os verbos diretos) seja representado pelos pronomes “o/s” e “a/s”.

No padrão formal da língua, os pronomes que representariam “você”, “os seus filhos” e “o namorado” nos exemplos vistos seriam “o/a”, “os” e “o”: “Eu amo você” = “Eu o/a amo”; “Você ama os seus filhos” = “Você os ama”; “Ela ama o namorado” = “Ela o ama”.

É bom que se diga que o verso de Caetano e a explicação que lhe dei não funcionam como “indicação de erro” ou “correção”, já que não há “erro”; o que há é simplesmente um uso (informal) diferente do formal.

Como já afirmei várias vezes neste espaço, o ideal é ser poliglota na mesma língua, o que implica conhecer o padrão formal da língua, além do informal, que não precisa de escola. Esse conhecimento do padrão formal obviamente implica o entendimento e o domínio do mecanismo que se verifica nesse padrão.

Curiosamente, tem ocorrido, especialmente no jornalismo, um fenômeno oposto ao que se nota com o “lhe”, isto é, o uso de “o” no lugar do “lhe”. Veja este trecho, tirado de uma nota oficial, publicada no site de um grande clube do País e transcrita pela imprensa Brasil afora: “Por todos estes números e conquistas alcançadas, o XXX agradece o treinador pelos serviços prestados à frente da equipe e o deseja sorte nos próximos desafios”.

Já sabe onde está o nó? Que lhe parece a passagem “e o deseja sorte nos próximos desafios”? Vamos lá: se alguém deseja sorte, deseja sorte a alguém, certo? Então, se eu desejo sorte A você, se eu desejo sorte Ao treinador, isto é, se esse complemento verbal é introduzido pela preposição “a”, o pronome de terceira pessoa adequado é “lhe”: “…e LHE deseja sorte nos próximos…”.

O leitor atento deve ter notado outro problema no comunicado oficial. Está na passagem em que se emprega o verbo “agradecer” (“o XXX agradece o treinador pelos serviços…”). No padrão formal, se alguém agradece, agradece A alguém: “…o XXX agradece Ao treinador pelos serviços prestados”. Também ocorre a construção sem a preposição “por” (“…o XXX agradece ao treinador os serviços prestados”).

Há algum tempo, comentei aqui um caso semelhante, que continua vivo na imprensa: “O parlamento não o permitiu invadir o Iraque”. Se alguém permite, permite algo A alguém, portanto, no padrão formal, teríamos “O parlamento não LHE permitiu invadir o Iraque”. É isso.

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