Sexta-feira, 20 de junho de 2025
Por Redação O Sul | 20 de agosto de 2022
O fato de o bolsonarista Roberto Jefferson (PTB) ter se registrado para disputar a Presidência da República mesmo cumprindo prisão domiciliar e respondendo ao inquérito dos atos antidemocráticos no Supremo Tribunal Federal não é a única bizarrice da chapa do PTB.
O candidato a vice-presidente, que levará nas urnas o nome de Padre Kelmon, também é um personagem enrolado sobre o qual pairam suspeitas.
O baiano Kelmon Luís da Silva Souza, de 45 anos, se diz ortodoxo, mas nunca foi sacerdote das igrejas da comunhão ortodoxa no Brasil. Ainda assim, celebra missas e batismos na Bahia e ganhou notoriedade em grupos conservadores graças ao discurso bélico contra a esquerda.
A despeito de suas frágeis credenciais, já foi recebido pelo Arcebispo do Rio de Janeiro, o cardeal Dom Orani Tempesta, participou de convocações para os atos golpistas do 7 de setembro no ano passado na condição de religioso e até recebeu um desagravo da deputada Carla Zambelli (PL-SP) nas redes sociais.
A suposta vinculação com a Igreja Ortodoxa é propagandeada nas em suas redes sociais e no texto que anunciou sua candidatura a vice-presidente no site oficial do PTB.
Kelmon inclusive aparece de batina na foto que deve figurar na urna eletrônica. Segundo o partido, o baiano foi uma escolha pessoal de Roberto Jefferson.
O suposto padre ortodoxo se diz admirador dos falecidos políticos Levy Fidélix e Enéas Carneiro, usa seu canal no YouTube para denunciar a “islamização” e a “perseguição” a cristãos no Brasil e já foi filiado ao PT.
O padre Gregório Teodoro, membro da Arquidiocese de São Paulo e todo o Brasil da Igreja Ortodoxa Antioquina, assegurou que Kelmon não guarda qualquer conexão com a comunhão ortodoxa, reiterando não ser atual que questionamentos ao ordenamento de Kelmon chegam à sua instituição.
“Posso dizer com absoluta certeza que ele não pertence à Igreja Ortodoxa Antioquina e nem a qualquer das igrejas canônicas do antigo patriarcado ortodoxo”, declarou o sacerdote à equipe da coluna por telefone.
“Na legislação brasileira, cumprindo poucos requisitos necessários, pode-se registrar um CNPJ de uma igreja com qualquer nome, em respeito à liberdade de culto e de organização. Daí a ser uma igreja que pertença à comunhão ortodoxa é algo completamente diferente”, explicou Teodoro.
O fato de Kelson nada representar para a comunidade ortodoxa causa espanto, já que o PTB informa no seu site que o baiano foi eleito bispo pelo Santo Sínodo, autoridade suprema da Igreja Ortodoxa, no ano passado.
A informação, porém, não procede, uma vez que a única vinculação conhecida do bispo é com uma controversa instituição que se autoproclama Igreja Católica Apostólica Ortodoxa del Peru.
Trata-se de uma entidade não reconhecida pelas igrejas canônicas do antigo patriarcado ortodoxo, por fazer uso indevido de elementos religiosos e até vestimentas facilmente encontradas na internet.
É o líder dessa igreja, Angel Morel Vidal, quem assina os dois comprovantes de escolaridade entregues por Kelmon ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), alegadamente emitidos em São Paulo. O mais recente, de 2006, refere-se a um bacharelado em teologia. O outro, de 2003, confere o grau de “licenciatura em filosofiando”.
Os dois diplomas trazem informações conflitantes: no mesmo documento, o comprovante é atribuído ao “Mosteiro São Basílio e São Tomé” e ao “Mosteiro São Basílio e Santo Efrém”. Não existem instituições com esse nome na capital paulista.
Os dois documentos também carregam o emblema da igreja peruana, ao lado do brasão da República brasileira.
Ainda assim, a despeito das frágeis credenciais, Kelmon conseguiu ser recebido por uma importante autoridade religiosa: o Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani Tempesta, que também é cardeal da Igreja Católica.
A página da “Arquidiocese Siro Ortodoxa Malankara da Diáspora” publicou fotos do petebista com Dom Orani no dia 22 de junho, quando Kelmon ainda não era candidato a vice-presidente. A igreja peruana se diz ligada à vertente ortodoxa Malankara, mas não existe um braço da Igreja na América do Sul.
A legenda descreve o encontro como uma “visita ecumênica”. Indagada sobre a natureza do encontro, a Arquidiocese do Rio não respondeu até o fechamento do texto.
A mesma página publicou, no último dia 6, um comunicado de Morel Vidal felicitando Kelmon pela indicação para a vice na chapa de Jefferson e liberando seu integrante para fazer campanha.