Terça-feira, 15 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 24 de abril de 2023
O Parlamento Europeu aprovou por ampla maioria uma lei que fecha a porta para importação de produtos originários de áreas desmatadas após dezembro de 2020. Na lista, estão itens como carne, soja, madeira e café. Para especialistas, a nova legislação pode reduzir a competitividade das exportações brasileiras, pois o cumprimento das regras representará um custo para as empresas.
A nova lei, aprovada com 552 votos a favor, 44 contra e 43 abstenções, engloba ainda produtos que usam matéria-prima de área desmatada em sua fabricação como chocolate, borracha, óleo de palma e papel.
O Parlamento Europeu e os estados-membros da União Europeia (UE) chegaram a um acordo sobre o assunto em dezembro passado. O texto foi proposto em novembro de 2021 pela Comissão Europeia, mas os eurodeputados votaram para fortalecê-lo, expandindo a gama de produtos.
Embora nenhum país ou mercadoria seja banido, as empresas só serão autorizadas a vender produtos na União Europeia se o fornecedor tiver emitido a chamada declaração de “due diligence” (investigação prévia para se assegurar da inexistência de problemas) confirmando que este não vem de terras desmatadas ou de degradação florestal, ocorridas após 31 de dezembro de 2020.
Conforme solicitado pelo Parlamento, as empresas também terão que verificar se esses produtos cumprem a legislação do país quanto ao respeito aos direitos humanos e de povos originários no processo produtivo.
Os produtos abarcados pela nova legislação são: gado, cacau, café, azeite de dendê, soja e madeira, inclusive produtos que contenham, sejam alimentados ou elaborados com essas commodities (como couro, chocolate e móveis). Durante as negociações, os parlamentares adicionaram com sucesso borracha, carvão vegetal, produtos de papel impresso e vários derivados de azeite de dendê.
O Parlamento também garantiu uma definição mais ampla de degradação florestal, que inclui a conversão de florestas primárias ou florestas em regeneração natural em plantações florestais ou em outras terras arborizadas.
O texto terá de ser ratificado formalmente pelo Conselho Europeu e entrará em vigor 20 dias após sua publicação. Mas os fornecedores terão um tempo para se adaptar.
Na avaliação de Welber Barral, consultor de comércio internacional e sócio da BMJ Consultores Associados, “esse projeto de lei deve estar em vigor até o fim do ano.”
Impactos para o Brasil
Vera Kanas, sócia na área de comércio internacional do escritório TozziniFreire, afirma que as exportações brasileiras não serão impactadas de imediato com a aprovação da lei proibindo produtos oriundos de áreas consideradas de desmatamento ilegal. Mas, quando a legislação entrar em vigor, alguns produtos brasileiros poderão perder competitividade no mercado europeu.
“Qual o grau de risco de um produto da Amazônia ter vindo de área de desmatamento ilegal? Provavelmente, será maior. Então, será preciso fazer uma due diligence para averiguar não só o produtor, mas toda a cadeia, e essa documentação tem custo e é um processo burocrático. Isso vai reduzir a competitividade de alguns produtos brasileiros na Europa”, afirma Vera.
Ela observa que, por outro lado, como o mundo todo está buscando uma pegada mais verde, a aprovação dessa lei pode ser um incentivo para evitar o comércio de áreas ilegais. Mas isso não significa que o problema vai acabar:
“Pode haver uma distorção no mercado. O europeu impõe barreiras, mas outros países não. Nada impede que produtos oriundos de áreas de desmatamento ilegal sejam vendidos em um mercado paralelo, e até mais baratos.”
Segundo a advogada, há quem duvide que a lei vá pegar. Isso porque os europeus dependem muito da soja, do café e do gado brasileiros. Mas a lei sempre será “uma espada na cabeça” dos produtores. Isso significa que, se a Europa não precisar mais dos produtos brasileiros, em algum momento, pode endurecer a lei, exigindo todos os certificados necessários.
“Então será preciso observar essa flexibilização. Se isso acontecer com frequência, o intuito ambiental não estará sozinho. Haverá também um viés econômico”, diz a especialista em comércio internacional.
Já Barral, da BMJ, observa que a nova norma europeia pode ter efeito negativo sobre exportações que hoje são legais, de setores como café ou madeireiras, que são muito dispersos e terão de passar pela certificação que será exigida pela UE.
Por outro lado, diz Barral, há setores que já são certificados internacionalmente e são grandes exportadores, como papel e celulose, nos quais os produtos são oriundos de áreas de reflorestamento. Mas o consultor aponta preocupação com a classificação dos países com risco de desmatamento:
“O Brasil, ao lado da Indonésia, deve ser classificado como país de alto risco”, afirma Barral.
O projeto de lei faz parte do chamado Green Deal, ou Acordo Verde Europeu, que é um conjunto de políticas e estratégias articuladas pela Comissão Europeia a fim de conter a ameaça do aquecimento global. Essa política ambiental estará presente também nos acordos de livre comércio que os europeus estabelecerem, como o acordo Mercosul-UE.
“Independentemente do que foi aprovado hoje, os europeus estão colocando em cada acordo comercial cláusulas ambientais. O acordo Mercosul-UE é um exemplo disso”, afirma Barral. As informações são do jornal O Globo e de agências internacionais de notícias.