Sexta-feira, 04 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 28 de março de 2022
Mário, um brasileiro residente em Roma (Itália), enviou uma sucinta mensagem para os amigos na tarde da última sexta-feira (25): “Chegou uma carta da companhia de gás. Adivinha quanto foi o aumento para julho: 343%! Inacreditável”.
Usuário do gás para cozinhar, aquecer a casa e o banho, Mário, que prefere não ter seu nome inteiro publicado, sabia que seria atingido pela espiral do custo do gás, em meio às tensões crescentes entre o Ocidente e a Rússia com a invasão russa na Ucrânia — mas não que seria tanto assim.
Na correspondência, a companhia Acea Energia faz proposta de modificação
unilateral de contrato, pela qual aumenta o metro cúbico de gás de 0,16 euro para 0,71 euro a partir de julho, por 12 meses. Ele pode eventualmente mudar de companhia, mas a tarifa não tem muito como ser diferente em meio ao que pode vir a ser a maior crise de abastecimento em décadas.
A invasão russa da Ucrânia trouxe a segurança energética de volta ao centro as
agendas políticas com o aumento dos preços das commodities. A avaliação da Agência Internacional de Energia é de que, embora ainda seja cedo para saber como os eventos podem se desenrolar, a crise resulte em mudanças duradouras nos mercados de energia.
O gás natural representa 40% das necessidades energéticas italianas, e 40% desse gás vem justamente da Rússia, numa dependência que não cessou de aumentar nos últimos anos. O país importa também mais de 10% de sua eletricidade de centrais nucleares de outros países, sobretudo da França.
Os altos preços da energia estão freando as perspectivas para a economia da
Europa. E a Itália, como a Holanda, Bélgica, Irlanda, Grécia, Suécia e Chipre, procura adotar medidas temporárias para atenuar o peso sobre o consumidor. O governo italiano anunciou baixa de 5% na TVA (imposto indireto) sobre o gás e outras ajudas por um total de 16 bilhões de euros. O governo diz ter planos de taxar os lucros das companhias de energia.
Os países da União Europeia continuam divididos sobre as soluções para combater a alta dos preços do gás. Os países do sul, como Itália, Espanha, Portugal e Grécia querem ixação de um preço máximo para o produto e dissociar seu custo ao da
eletricidade. Mas um grupo de países liderado pela Alemanha e Holanda é contra a intervenção e uma reforma do mercado de eletricidade. Estimam que intervenção no mercado de energia coloca em risco o abastecimento e não haveria efeito sustentável sobre os preços.
Apesar das divisões entre os 27 Estados-membros, os líderes europeus acertaram continuar a “discutir se e como as opções de curto prazo da Comissão podem ajudar a reduzir os preços do gás e abordar seu efeito de contágio nos mercados de eletricidade, levando em conta as circunstâncias nacionais”.
Certa mesmo é a decisão de reduzir a dependência de energia em relação à Rússia. A Itália é um caso exemplar: o chefe da diplomacia, Luigi Di Maio, comanda uma equipe que age como uma grande central de compras, e partiu em direção da Argélia, Catar, Congo e Angola para tentar fechar novos contratos maiores de importação de gás.
No novo cenário geopolítico, a Itália volta também a discutir o aumento de sua
própria produção de gás. Projetos nesse sentido no mar Adriático foram até agora barrados por causa de forte oposição e mobilização de entidades ecológicas.