Terça-feira, 01 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 9 de novembro de 2020
A construção de uma rede de organizações sociais de prateleira é a forma encontrada pelo PCC (Primeiro Comando da Capital) para ganhar contratos públicos e se infiltrar em administrações municipais de pelo menos três Estados. Empresas de prateleira são CNPJs formalmente constituídos, mas que não têm atividade. Em São Paulo, há indícios de que a facção atuava em busca de contratos em nove cidades.
Investigações da Polícia Federal (PF) e da Polícia Civil paulista mostram a ação do grupo em São Paulo, Paraná e Minas. Os contratos públicos teriam, segundo os investigadores, uma dupla finalidade: a construção de empresas respeitáveis para a lavagem de dinheiro do tráfico e o desvio de recursos públicos para a organização criminosa.
A rede de OSs mantida por grandes traficantes de drogas ligados ao PCC começou a ser desbaratada durante as investigações que levaram ao esquema que controlava a coleta de lixo e a saúde pública de Arujá, na Grande São Paulo. O centro do esquema teria sido criado, segundo a investigação, por Edson Rodrigues Peres, o Alemão, candidato a vereador em 2016 pelo PSDB em Barueri.
Gravações ambientais obtidas pela polícia mostram que o acusado chegou a pôr na direção de um dos institutos usados pelo grupo um morador de rua – o uso de laranjas para dirigir as OSs seria uma das práticas da organização criminosa. De acordo com as investigações, o grupo atuaria “fora do crime de tráfico de drogas na cidade de Barueri, executando serviços públicos através de contrato de gestão, por intermédio de organização social criada por sua organização criminosa, expediente que utiliza ou utilizou também nas cidades de Arujá, Guarulhos, Santa Isabel e Suzano”.
As investigações da Operação Soldi Sporchi (dinheiro sujo, em italiano) localizaram tentáculos da atuação do grupo em Guaíra, Itaquaquecetuba, Salesópolis, Biritiba-Mirim e Caraguatatuba, no litoral norte do Estado. Cópias do material reunido pela polícia foram enviadas ao Ministério Público Estadual de cada uma das cidades.
Nas conversas gravadas apreendidas pela polícia, Alemão contaria sobre sua relação com o megatraficante de drogas Anderson Lacerda Pereira, o Gordo, acusado de manter relações com o cartel mexicano Los Zetas e com mafiosos da “N’dragheta”, principal organização criminosa da Itália, para onde teria mandado toneladas de cocaína. A defesa de Gordo, que está foragido, nega os crimes.
O advogado Rafael Munhoz Ramos, que defende Alemão, também alega inocência do político. Segundo ele, houve um engano. A polícia o teria confundido com outra pessoa, um bandido da facção que também tem o apelido de Alemão. Os documentos da Operação Soldi Sporchi, porém, afirmam: “Para adquirir organizações sociais, Anderson se vale de um indivíduo de vulgo Alemão. Trata-se de Edson Peres, que foi candidato a vereador em Barueri”. Gordo teria comprado do esquema o Instituto Inovação de Gestão Pública. “Mais tarde também teria sido vendido parte do Inst. IDGT, no que concerne às atividades da O.S. em Arujá”, escreveu o delegado Fernando José Goes Santiago, que conduz a investigação da Polícia Civil.
Em outra conversa, Alemão participa de uma reunião de lavratura de ata para a criação da OS Instituto Referência de Gestão Pública, outra suposta organização de prateleira criada para trabalhar com prefeituras.
O esquema descoberto em São Paulo é semelhante ao investigado pela PF em um dos desdobramentos da ofensiva contra a lavagem de dinheiro do PCC. A apuração já levou a polícia a bloquear, só na Operação Rei do Crime, R$ 730 milhões em bens em nome de pessoas ligadas à facção.
“Eles levam vida de empresário, frequentam clubes, dão festas, enfim, têm uma vida luxuosa”, disse o delegado Elvis Secco, coordenador-geral de Repressão a Drogas e Facções Criminosas da PF. Secco afirmou que a primeira vez que se deparou com a facção infiltrada no poder público foi em uma investigação em Londrina, na Operação Ferrari, em 2013. “Eles tinham ligações com um coronel e com políticos locais.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.