Sexta-feira, 24 de outubro de 2025
Por Redação O Sul | 16 de agosto de 2020
O Jornal Nacional do sábado (15) mostrou a história de um dos vários pesquisadores que migraram seus estudos para tentar entender melhor o coronavírus, o mestre em microbiologia Rômulo Neres, que ganhou uma bolsa para estudar o vírus por uma organização dos Estados Unidos.
A trajetória de Rômulo na ciência foi possível graças aos esforços e do incentivo de seu pai, Robson Castro Neres, que trabalha há 22 anos como bilheteiro do sistema de trens do estado do Rio.
Robson ganha R$ 1106 de salário – pouco mais de um salário mínimo – mas se revela um investidor quando o assunto é o incentivo à educação da família.
“Acho que o investimento é a melhor coisa que tem. A própria pessoa saber que tem alguém que acredita nele, investe nela sem a cobrança que tem que fazer, tem que vencer. Eu como pai eu tenho que acreditar nos meus filhos. Se eu não acreditar nos meus filhos quem vai acreditar?”, reflete.
O filho Rômulo é resultado desse investimento. “Ele sempre discutiu muito abertamente com a gente sobre os nossos rumos, sobre a possibilidade de um impacto que a educação poderia ter nas nossas vidas”, lembra Rômulo.
Rômulo está concluindo o doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro. E, no ano passado, ficou nove meses nos estados unidos a convite da Universidade de Davis, na California, pesquisando chikungunya, tema de sua tese.
Trabalhando como bilheteiro em uma estação da Baixada Fluminense, seu Robson foi fundamental para que o filho seguisse o caminho da pesquisa. A falta de condições materiais criou dificuldades, mas não impediu que Rômulo fosse sempre muito estimulado a se dedicar aos estudos. A principal herança que ele recebeu dos pais foi o amor pelos livros e pela ciência.
Todos na família do Jardim Primavera, em Duque de Caxias, dão prioridade aos estudos. A mãe, a pedagoga Helenita Silva Neres, passou no vestibular aos 40 anos e hoje trabalha numa escola com crianças especiais.
“Sempre tive sede e vontade de estudar de ter uma formação mas nunca tive condições. Aí quando surgiu a possibilidade eu ingressei na faculdade de Pedagogia e a trajetória deles de educação já estava encaminhada”, lembra, referindo-se aos filhos.
A outra filha do casal, Ana Elisa Neres, é formada em direito e acaba de passar na prova da OAB, que permite atuar como advogada.
“Meu pai, quando fui fazer a prova da OAB, via alguma coisa na internet, alguma coisa de Direito [e falava]: ‘Olha tal coisa, você pode usar tal artigo’.
A busca pelo conhecimento é um drible nas estatísticas. Dona Helenita lembra que jovens negros de baixa renda na Baixada Fluminense muitas vezes acabam nas páginas policiais.
“Quando eu falei assim para o jornaleiro: ‘O jornal não pode ter acabado porque saiu meu filho no jornal’, ele arregalou os olhos. Aí eu vi que a notícia era sobre chacina aí eu disse: ‘Meu filho é esse aqui. Ele é cientista e está na mesma página, dividindo ali os noticiários”, lembra.
“Todas as vezes que íamos comprar novos livros, tanto meu pai quanto minha mãe eles faziam esforço, compravam parcelado, entregavam e falavam pra tomar cuidado porque o livro tinha sido caro, investimento de alguns meses
Em junho, Rômulo ganhou uma bolsa de estudos da Dimension Sciences, organização americana de estímulo à ciência, para estudar a genética do coronavírus e suas mutações. Mas devido à pandemia, ele está desenvolvendo a pesquisa nos laboratórios da UFRJ.
Uma conquista que teve participação especial do seu Robson, que ajudou o filho a escolher entre a paixão pela música e a ciência.
‘Ele falou uma vez pra mim que queria ser musico, ele tinha uma banda. Eu falei: ‘Rômulo, o mundo se acabando em doença’… Não que eu fosse contra isso, mas assim, o mundo acabando em doença .[Eu disse]: ‘Você pode fazer a diferença’. Aí acho que ele meio ouviu e hoje ta ai né”, lembra Robson.