Quarta-feira, 15 de maio de 2024
Por Redação O Sul | 26 de abril de 2018
Contrário à descriminalização de maconha, favorável à internação em casos graves e defensor das comunidades terapêuticas, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, condena o “maniqueísmo” do debate sobre drogas no Brasil.
Desde que parte significativa de sua pasta foi absorvida pelo novo Ministério da Segurança Pública, sobrou espaço para se dedicar à política nacional sobre entorpecentes, que teve suas bases aprovadas recentemente em resolução assinada por ele. Em entrevista, Torquato anuncia ações futuras, como a realização de uma campanha em junho, e se posiciona sobre as principais controvérsias em torno do tema.
1) Qual é a política do governo em relação às drogas?
O que eu encontrei foi um maniqueísmo pró e contra a intervenção do Estado, pró e contra a legalização. Sou contra os dois polos. Há uma política nacional a ser pensada, sem partidarismo, sem sectarismo, sem ideologia. Temos que conjugar todos os esforços harmonizáveis para combater a questão da droga. Se é internação compulsória, se é redução de danos, se é comunidade terapêutica, eu não entro nesse debate. Meu jargão não é o deles.
2) E qual será o foco da política de atendimento?
Minha preocupação é harmonizar os diversos métodos de recuperação porque não posso crer que a sociedade queira a liberdade total de uso, como alguns pretendem. Mas acho que esse confronto intelectual não cabe dentro da administração pública. O Estado tem que agir para preservar a vida. Há dependentes que não reagem com outros métodos de tratamento, com apoio psicológico e psiquiátrico, apoio da família, com terapia, redução de danos, porque algo falhou. Então, ao invés de morrer, interna. Qual o período? O médico é que vai dizer.
3) Há muita crítica à internação compulsória quando se fala de uma política sobre drogas.
O médico que não internar compulsoriamente quem está em risco de vida comete o crime de omissão de socorro, está no Código Penal desde 1940. O Estado tem que intervir para salvar a vida. Qual será o método? Os médicos é que vão decidir. Não é uma decisão acadêmica ou filosófica nossa. Não é uma política de solução geral.
4) Existe consenso no uso de medidas extremas para salvar vidas, mas é uma minoria dos dependentes que se encontra em risco de morrer. O que fazer com a maioria?
A política do ministério é ser eficaz caso a caso. Para uns, a comunidade terapêutica será suficiente. Outros precisarão de psicólogo, outros de psiquiatra e outros vão precisar de internação. Cada setor do governo vai fazer o seu pedaço. Meu pedaço, com o apoio de outros ministérios, é o das comunidades terapêuticas. Vamos financiar 20 mil vagas, buscando entidades públicas e privadas que se proponham a tratar cientificamente e responsavelmente os dependentes químicos. E também fazer uma campanha em meados de junho de prevenção, voltada aos adolescentes.
5) O senhor não teme focar a política em comunidades terapêuticas, que são frequentemente denunciadas por maus-tratos e tratamentos sem embasamento científico?
O edital para seleção vem detalhado, com critérios para aferir e mensurar a competência, a correção do trabalho que está sendo feito. E os médicos vão supervisionar, sejam os da comunidade terapêutica ou contratados. Tem o Ministério Público para supervisionar, os agentes das secretarias de Saúde e outros envolvidos.
6) O uso de maconha deveria ser descriminalizado no Brasil?
Não. Nenhum país resolveu descriminalizando. Há uma imensa literatura pró e contra. Quem tem que fazer essa discussão é o Congresso Nacional.
7) Por que o senhor é contra a descriminalização?
Nenhum país reduziu o consumo de drogas descriminalizando. Há uma grande experiência nos Estados Unidos que precisa ser observada. O Estado de Washington, que perdeu muitas empresas, liberou a maconha para atrair turistas. A Califórnia recentemente liberou a maconha para entretenimento. Temos que ver quais são as consequências de médio e longo prazo nesses países. No Uruguai, só aumentou o tráfico e a violência. Não há receita pronta. Tem que ver o que funcionou aqui, o que não funcionou ali.
8) Então o consumo deve continuar sendo crime?
Tem que continuar havendo a repressão, a figura criminógena. Agora não é definir o crime dessa ou daquela maneira, o mais importante é ter uma política firme de apoio e recuperação das pessoas. E implica também, do lado da segurança pública, uma repressão eficaz ao tráfico.