Quinta-feira, 25 de abril de 2024

CADASTRE-SE E RECEBA NOSSA NEWSLETTER

Receba gratuitamente as principais notícias do dia no seu E-mail ou WhatsApp.
cadastre-se aqui

RECEBA NOSSA NEWSLETTER
GRATUITAMENTE

cadastre-se aqui

Agro Em missão no Uruguay, empresários e profissionais do meio rural buscam técnicas e conhecimentos para a melhoria de cadeias produtivas com foco na ovinocultura leiteira 

Compartilhe esta notícia:

Visitação teve início na Estância El Caminho, próximo a Montevideo, com a demonstração da ordenha mecanizada pelo proprietário rural Cláudio Fuentes.

Foto: Divulgação

O Uruguay é referência na criação de gado, ovinos e caprinos, extensivo à sua produção de queijos, conquistando a cada dia novos e exigentes consumidores.  Foi isto que motivou o médico veterinário Fernando Beccon Nerva, com mais de 40 anos de experiência no
setor, a  reunir um grupo de produtores rurais, estudantes e profissionais do meio gastronômico  e turístico para uma missão ao país vizinho, numa verdadeira imersão sobre as práticas e técnicas utilizadas nestas cadeias produtivas.

Fernando Nerva, Auguntín Batellini e o chef Jorge Nascimento que acompanhou a missão com foco nas riquezas da gastronomia local

O desafio passa pelo fortalecimento e desenvolvimento de padrões mais sustentáveis  nas propriedades rurais do Rio Grande do Sul, com ampliação de suas potencialidades  e qualidades, no rastro do interesse e ressurgimento principalmente da ovinocultura leiteira, depois de um período de quase 30 anos de desaquecimento setorial. “A ovinocultura está ressurgindo de uma forma bem madura e o produtor cada vez mais quer trabalhar “ com o objetivo de melhorar a qualidade de vida com o aumento de renda, através da ovinocultura leiteira, respeitando o meio ambiente, o bem estar animal, possíveis de começar com baixo investimento inicial”, aponta Fernando, otimista com os projetos que vem alinhavando. “O rebanho reduziu muito nos últimos anos. Já chegamos a ter 17 milhões de cabeças de ovinos e hoje estamos ao redor de seis milhões”. Segundo ele, falta organização na cadeia e a proposta de capacitar o mercado para a entrega de produtos de maior valor agregado integram seus objetivos que alçaram voos a partir desta primeira missão. “Muitas outras virão, em diferentes localidades, no País e no exterior”, aposta.

Ana Bridi

O grupo, com cerca de 50 integrantes de diversas cidades do RS e do Brasil, saiu de ônibus da serra gaúcha em direção ao Uruguay na sexta-feira (06) de dezembro, com retorno na segunda-feira (09). A primeira visita foi na estância El Caminho, na região de Canelones, próximo a Montevideo.

Apreço e dedicação ao campo

Cláudio Fuentes é um jovem produtor rural e a atividade vem sendo exercida em paralelo ao emprego em uma empresa pública de fornecimento de água. O mesmo acontece com sua esposa Cecilia Cabrera, que divide as tarefas do campo entre as horas vagas no curso superior de medicina veterinária. Há quatro anos eles herdaram uma propriedade de 12 hectares, com um rebanho hoje de 34 cabeças de ovinos da raça Milchschaf, introduzida no Uruguay na década de 90 por sua alta produção leiteira e adaptação ao clima e terra. Destas, 16 estão no momento fornecendo leite, num total de 40 litros/dia. “Os animais precisam comer bem para produzir bem”. O pasto é natural e este é um dos fatores que diferenciam a propriedade, somado aos cuidados com os cordeiros que todos os dias à tarde são separados do restante do rebanho solto no campo. “Podemos fazer bastante com poucos recursos”, diz ele, enquanto mostra o equipamento para a ordenha, fundamental para uma produção de leite em equilíbrio com questões sanitárias e bem-estar animal.

Claudio e Hernandez mostrando aos visitantes o processo da ordenha na estância El Caminho

O plano do casal é a dedicação total à propriedade em torno de três anos, intensificando a produção de carne e queijos, que hoje supre a demanda da família e de moradores das proximidades, também com outros produtos como doce de leite e lã. “Nossa venda cresce no boca a boca”, diz ela. O curioso é que esta veia empreendedora surgiu por acaso. Logo após a mudança para a propriedade, uma ovelha havia perdido o cordeiro e o casal precisou fazer a ordenha, descobrindo assim seu gosto, apreço e dedicação ao campo. “O mundo inteiro luta por coisas naturais e nós estamos tentando uma vida no campo. É isto o que queremos. Os animais são de fácil adaptação e a produção é bem maior se comparada ao gado leiteiro”, conclui Cláudio.

Fredi Hernandez é vizinho de Cláudio e foi presidente da Associação de Caprinos do Uruguay e hoje é seu vice-presidente. Ele representa a quinta geração de produtores de ovinos de uma família tradicional da Espanha. A paixão pela atividade transparece em seu rosto, ao falar de sua trajetória, ao mesmo tempo em que aponta técnicas da ordenha, mesclada a sua experiência de mais de 41 anos na cozinha, elaborando pratos e conservas que comercializa a base de carne e miúdos de ovelha, além de queijos e derivados. Acompanhado de Cláudio, ele ensina ao grupo que “durante a ordenha, o importante é o silêncio para que o animal se sinta tranquilo e assim possa produzir mais leite”. Na sua avaliação, “os jovens estão optando pela ovinocultura de leite para permanecer no campo, pois dá renda com baixo investimento. Pelo preço de uma cabeça de boi é possível adquirir cerca de 10 ovelhas leiteiras”.

Escuela de Lecheria referenda o segmento

A Escuela de Lecheria fica em Nueva Helvécia e foi o destino seguinte da missão. Localizada na região da Colonia, aonde chegaram em 1858 os primeiros imigrantes suíços. Em 1920 eles criaram a instituição a fim de transmitir conhecimentos e aprimorar a indústria produtiva local, com um olhar também aos países da América Latina. Com 130 alunos e cursos permanentemente sendo ofertados, a Escuela traduz tradição e referenda o segmento. O coordenador Roberto Betancourt explica que os cursos são para aqueles que visam atuar na indústria láctea, com duração de cinco semestres. Há opções no currículo para quem foca na produção de leite, com formação em dois anos, possibilitando ingresso em estabelecimentos primários, além de cursos para formação de agrários, também por um período de dois anos. “Temos alunos do Equador, Brasil, Bolívia, Costa Rica, Guatemala, Cuba, entre outros”.

Roberto Betancourt apresentando a Escuela ao grupo

Localizada em uma área de 102 hectares, a Escuela no momento mantém um rebanho de gado leiteiro de 65 animais, produzindo entre 25 e 26 litros/dia por vaca. Todos os processos acontecem em uma moderna planta industrial inaugurada em 2012 e a produção, nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, durante as férias escolares, é vendida à Conaprole. “O aluno sai da Escuela com um ensino global sobre toda a cadeia setorial”. O tambo, com capacidade para ordenhar simultaneamente cerca de 32 animais foi inaugurado este ano, exibindo cuidados com higiene e sanidade.

Um Museu, agregado à Escuela contempla o cenário cultural da instituição, preservando sua história e tradição, revelando o passado e a garra dos produtores rurais que ao longo do tempo foram desenhando a consolidação deste setor produtivo, responsável pela geração de emprego e desenvolvimento econômico.

Turismo de experiência

Para quem deseja ingressar na ovinocultura de corte e leite, tendo o turismo e a gastronomia como valor agregado, nada melhor do que vivenciar uma experiência que abriga tudo isto num único local. É a estância La Vigna, em Colonia Valdense, com pecuária sustentável, queijaria de padrão internacional e uma pousada boutique, com 5 suítes. Três delas ficam no corpo da casa, uma antiga sede de fazenda, datada de 1880, que Augustín Battellini e sua esposa Lucila Providente adquiriram há cerca de 20 anos. Outras duas ficam separadas, ocupando uma área onde antigamente ficava o escritório de Augustín, arquiteto especialista em bio construção. Ele brinca ao dizer que era um arquiteto que tinha por hobby a queijaria. Hoje é queijeiro e o hobby é a arquitetura.

Criatividade não falta ao casal. Ele pinta em tela, já produziu cervejas e adora criar receitas que diferenciem os sabores de seus queijos vendidos em todo o Uruguay. Mais do que isto, ele luta por seus princípios, valores e ideias, tendo a pecuária e a queijaria como pano de fundo na busca de processos que possam diferenciar e qualificar o setor, o que provocou, inclusive, seu afastamento temporário da diretoria da Associação de Produtores de Milchschaf, por diversidade de opinião e pensamento junto a seus pares. “Fui expulso da entidade por propor mudanças na genética dos animais e acabei fazendo uma melhoria no meu rebanho. Sou subversivo por natureza”. Augustín salienta que reinventou o melhoramento de animais adaptados ao meio ambiente, o que ele define como sendo a “uruguaização” da raça. “Reinventei o rebanho, reinventei a ordenha, reinventei a produção de queijos com fungos, inoculando o ambiente para maturação natural”.

Ele é conhecido como “afinador de queijos”, ou seja, queijeiro especializado no processo de maturação, utilizando fungos gerados naturalmente pela fermentação da própria flora do leite de ovelha. Mas não fica nisso, a sala de guarda do queijo na sede da La Vigna também se diferencia pelas prateleiras de madeira, tais como às usadas na fabricação do queijo serrano, aprovadas pela legislação sanitária. O custo baixo e a praticidade garantiram ao empresário maior adaptabilidade na instalação de sua indústria, a custos mais acessíveis, sem perda de qualidade.

Já, Lucila é psicóloga por formação. Adora artes plásticas, trabalha com cerâmica e é ela quem administra a logística e as finanças da La Vigna, que tem como diferencial o bem servir ao turista e aos clientes com excelência, começando pela apresentação do local, que reúne antiguidade e modernidade em cada peça e móvel da casa, com extremo bom gosto. “A La Vigna é uma experiência única”, como aponta Ana Maria Bridi, esposa de Fernando Beccon Nerva, que acompanhou a missão. Com formação em hotelaria e turismo, ela explana seu ponto de vista calcado em muita vivência e experiência na atividade Brasil afora. Focada na formação de recursos humanos no atendimento à hotelaria de excelência, em especial no meio campesino, ela acredita que o modelo adotado pela estância constitui exemplo e impulso para novos empreendedores. “A simplicidade do local, porém com muito refinamento e serviço impecável encantam. Este é o caminho para quem quer se diferenciar na atividade, atraindo clientes pelo bem servir. É por aí que o segmento deverá crescer”. Ana também salienta a importância na missão da presença do chef de cozinha Jorge Nascimento, de Porto Alegre, interagindo com menus e propostas ofertadas às mesas no país vizinho.

O encantamento é justamente a palavra de ordem da La Vigna, percebido em cada detalhe, em cada canto da propriedade, que exibe 2.700 árvores, muitas delas frutíferas, que compõem o paisagismo local. Todas plantadas pelo próprio Augustín, orgulhoso de seus feitos.

Os animais são alimentados com pasto natural, apesar do solo seco, principalmente nesta época do ano. Como atrativo para a ordenha é oferecido aos animais cerca de 100 gramas por cabeça de farelo de trigo integral orgânico ou milho orgânico quebrado, que Augustín chama de “dulce”. Ele também aprimorou o local para que o parto das mesmas pudesse ser mais confortável. Na ordenha, as condições de limpeza são impecáveis e o leite não passa por pasteurização. “Estocado por alguns dias, segue para o freezer para permanecer em baixa temperatura. Para cada produto, utilizo uma técnica diferente”. Segundo ele, todos os dias são feitas análises da acidez do leite, garantindo a segurança alimentar. “Estou sempre aprendendo, sempre provando coisas, gosto de desafios, gosto de inventar queijos”.

A limpeza dos reservatórios é semanal, por bactérias japonesas que ele adquire no comércio eletrônico e que se alimentam dos microrganismos que sobrem da higienização, eliminando qualquer contaminação indesejável aos fermentos naturais contidos no leite crú. Para alguns tipos de queijo, a mescla de leite de ovelha e cabra predomina.

Hoje, a queijaria da La Vigna, com diferentes rótulos, está presente em todo o Uruguay. O que impulsionou a divulgação e comercialização dos produtos foi a preferência dos renomados chefs de cozinha espalhados pelo país, pelos sabores ofertados por Augustín através de seu variado e criativo mix, que não deixa nada a desejar comparado aos principais mercados produtores mundiais. A fila de clientes na pequena loja que fica junto à propriedade reitera o gosto pelos queijos, cujos odores impregnam agradavelmente o ambiente, entre eles, pimentão, ervas, flores e cogumelos, por exemplo.

A La Vigna também recebe grupos de turistas e apreciadores do produto para refeições e eventos, mantendo em cada um deles sua assinatura, envolta no perfeccionismo de bem servir. “Queremos que a La Vigna receba turistas do Brasil. Que os brasileiros venham aqui. Creio que nos próximos anos o Brasil e o Uruguay terão que trabalhar juntos, buscando este intercâmbio. Que venham aqui passar o dia, degustar os queijos, que provem alguns vinhos, que venham se hospedar. Aqui é um lugar para as pessoas que tem como ideal a ecologia, a gastronomia. Gente que gosta da natureza e do bem viver”.

Atividades renovadas

Bianca

Dos integrantes da missão, muitos já atuam no segmento queijeiro. Bianca Fleishman é de Nova Trento/Santa Catarina. Depois de algum tempo vivendo em Israel, ela e o marido descobriram suas paixões pela pecuária. Na volta ao Brasil, compraram algumas cabeças de cabras e hoje são 15 leiteiras que ocupam os 17 hectares do Sítio Terra Santa, onde produzem e comercializam diversos tipos de queijos, entre eles os cremosos, frescal, feta, meia cura e brancos, além de iogurte e doce de leite, vendidos em uma feira na Lagoa da Conceição, em Florianópolis, e no balneário Camboriú, fornecendo também para alguns restaurantes locais. São 27 litros/dia que conseguem ordenhar e a ideia é estender o rebanho com foco na ovinocultura.

Maria Aparecida Sant’anna Margotto é mineira, mas reside no noroeste de Santa Catarina, em Campo Alegre. Ela conta que tinha o sonho de se tornar queijeira, seguindo os passos de sua mãe e avó. Não cria animais, mas compra o leite pasteurizado, optando sempre por bons fornecedores. “Adoro fazer queijo. Este é o meu trabalho”. No início, centrou esforços no leite de vaca e foi testando sabores e aprimorando técnicas até que em 2011 descobriu em uma revista setorial que Santa Catarina produzia leite de ovelha. Foi a arrancada para a diversificação da atividade. Em 2013 seguiu viagem para a Espanha e Portugal, sempre em busca de novidades e aprimoramento. “Visitei todas as queijarias, motivada com a produção da ovinocultura de leite”.

Maria Aparecida

No ano seguinte abriu as portas de sua indústria. O próximo passo foi decisivo em sua carreira. Inscrita em um concurso nacional de queijos, em São Paulo, levou em 2015 a medalha de bronze, sinalizando que estava no caminho certo. Em 2017 foi a vez da medalha de prata e em 2019 a medalha de ouro no mundial da premiação, realizada pela primeira vez na América Latina. “Foram mais de mil participantes e eu ganhei com a criação de um queijo maturado durante 90 dias na pimenta calabresa”, acrescenta, com orgulho. Segundo ela, a distinção chegou pelo seu cuidado, atenção e conhecimento sobre como mesclar temperatura e umidade, “os grandes fatores que ajudam a dar sabor aos queijos”.

Hoje, ela produz 150 quilos/mês de diversos tipos, tendo agregado ao seu mix também sorvetes, iogurtes, doce de leite, massas recheadas, canelones com ricota e outros doces, “todos à base de leite de ovelha”. A produção é totalmente comercializada no Estado e agora ela se prepara para abrir uma loja na BR 101, próximo a Camboriú, em ponto nobre, em frente ao posto da Polícia Rodoviária Federal. “Meus produtos têm excelente aceitação”. Durante a missão, ela percorreu os locais visitados, atenta às novidades e aos processos a fim de adequá-los ao cotidiano de sua empresa. “Este é um nicho de mercado que tem muito para ser explorado”. A mensagem que ela deixa àqueles que querem iniciar na atividade é “não desistir de seus sonhos. Toda a atividade no Brasil é lucrativa, mas tem que se ter certeza do que se quer e do que se gosta. Eu comecei em 2000 e venho pesquisando e me dedicando muito”.

Daniela

Daniela Fonseca é gaúcha e administra, ao lado do irmão Rafael, uma propriedade em São Francisco de Paula, na região serrana do Estado, onde produz queijos de ovelha. O projeto nasceu há cerca de quatro anos. Ela foi testando receitas artesanalmente em sua própria cozinha e hoje comercializa vários tipos, seguindo a linha francesa tradicional. São 24 hectares e 200 cabeças de ovelha que fornecem 100 litros de leite/dia, culminando em 20 quilos de queijo/dia. Com apenas uma funcionária, os planos são de entrar 2020 com outras 120 ovelhas em lactação e 2021 com mais 50 fêmeas. A alimentação do rebanho é à base de pasto, complementado com feno de alfafa e ração. Embora ainda não totalmente sustentável, o campo ganha atenção dos proprietários, que utilizam esterco para compostagem, depois curtido e pulverizado na lavoura. A produção se estende à carne e lã e a ideia é “o aumento da produtividade”, como aponta Daniela.

Jocemir Boone e seu filho, Moisés, são de Nova Petrópolis, também região serrana do Rio Grande do Sul. Em uma área de 10 hectares, eles criam gado da raça Holandesa, comercializando a produção de leite, hoje em torno de 600 litros/dia. A opção por participar da missão ao Uruguay foi a busca de alternativas para obter maior produtividade, pois segundo Jocemir, a terra não é boa para o gado, tem muito morro e precisaria de, pelo menos, mais 10 hectares, mas o custo da terra é elevado e inviabiliza no momento qualquer negociação. Durante a missão, a ideia de talvez transformar parte do local em uma pousada despertou a atenção dos proprietários, mas o caminho ainda é longo e precisa ser muito bem avaliado. “Precisamos de algo que agregue valor à propriedade. A região tem muito recurso natural e ideal para o turismo pela proximidade com Gramado”. Jocemir foi pioneiro na implantação da inseminação artificial para a melhoria do plantel de sua estância, iniciada pelos pais há cerca de 50 anos.

Fernando e Virgílio

Virgílio Paiva é médico anestesista e Fernando Marques empresário do segmento da moda, em São Paulo. Com o objetivo de dar uma guinada nas suas vidas, adquiriram um sítio em Cunha, na serra da Cantareira, com 30 hectares, pensando também em fugir da agitação da cidade, em busca de maior qualidade de vida. A missão serviu para uma avaliação sobre o que ambos podem fazer na propriedade, que está sendo recuperada em pastagem e paisagismo. “Nosso objetivo inicial era a ovinocultura estendida à queijaria, o plano de negócio está sendo arquitetado. Queremos fechar três anos com 75 ovelhas em lactação”. Eles também investem na repaginação de um antigo galpão, tendo adquirido já um biodigestor. “Estamos indo com calma. Talvez possamos abrir o local para visitação, experiências de um dia. São ideias que precisarão ser concretizadas”. Segundo Virgílio, ofertar workshops focados na produção de queijos faz parte dos planos. “As pessoas querem conhecer o setor, há demanda por parte do consumidor, preocupado com responsabilidade social e ambiental. É importante ter uma política de portas abertas para receber as pessoas”. Outra possibilidade, segundo Fernando, é a participação de ambos na Associação Caminho do Queijo Paulista, que conta com 20 produtores.

Denise

Denise Niedermeyer é gaúcha, natural de Venâncio Aires, e herdou da família uma cabanha em Barros Cassal, com 60 hectares. Depois de 15 anos trabalhando nos Correios e Telégrafos, optou por abandonar tudo e se dedicar ao campo. Com apenas 37 anos, ela diz que cansou do estresse da cidade. Depois de ter acesso a uma reportagem sobre ovinocultura de leite, diz que “me encantei porque sou formada em nutrição e vou me dedicar a beneficiar leite e derivados”. Ela pensa em queijos do tipo feta, roquefort e serra da estrela e já adquiriu 25 ovelhas prenhas que começarão a parir nos próximos dias. Como a propriedade ainda não está totalmente pronta, os animais estão em outro local. A obra inclui sala de ordenha para 4 animais por vez e, segundo ela, o investimento está sendo alto, já superando a casa dos 100 mil reais, com estimativa de retorno deste valor em torno de três anos. “Meu objetivo é chegar a 800 ovelhas”. Da experiência na missão, ela leva “a vivência com outras pessoas e informações relevantes para o meu negócio.” O rebanho é da raça Lacaune, leiteira e mais deslanada, mas de fácil adaptação no Rio Grande do Sul.

Paulo Sérgio Bracarense é de Brasília, onde adquiriu uma área de quatro hectares, dando início à ovinocultura de corte e leiteira. Por enquanto, 10 fêmeas estão ativas, garantindo a fabricação de queijos e iogurtes. “Ainda estamos na fase de projeto, com produção artesanal e os planos incluem o turismo rural”. Segundo ele, passeios a cavalo, almoços e café da manhã integram esta pauta de opções, seguida de detalhamento aos visitantes sobre a produção de carne e lã, com suas curiosidades e diferenciais. Sem concorrência na localidade, Paulo Sérgio mantém otimismo frente ao empreendimento, que já conta com linhas de crédito, representando investimentos na ordem de 350 mil reais, com retorno previsto para os próximos três anos.

Da missão, ele argumenta que “a troca de informações, principalmente com os colegas que já produzem foi muito importante. Muitos deles atuam de forma parecida com o que estou idealizando”. Conhecer a atividade do La Vigna e do El Caminho foi importantíssimo na avaliação do produtor rural, que pensa também em estender a atividade no segmento de orgânicos.

Rafael Scopel é professor de topografia na Escola Bom Pastor, em Nova Petrópolis e Denison Schadarum, agrônomo, é seu colega, lecionando mecanização e irrigação. A escola, com vocação agrária, vem sendo procurada por muitos estudantes que objetivam permanecer no campo ao lado de suas famílias. “Os pais estão dando oportunidade para os filhos serem protagonistas em suas terras”, diz Rafael, enfatizando que a busca também vem sendo por processos sustentáveis.

Gabriela Boelter, aluna, já auxilia seus pais em uma propriedade local que conta com 80 cabeças de ovelhas de corte além de pousada familiar a Pousada do Pioneiro em Nove colônias/ Nova Petrópolis. A missão, segundo eles, veio para somar pontos em suas escolhas, enriquecidas pelo vasto currículo escolar que a instituição oferta na região. É justamente esta efervescência que motivou Fernando Nerva, idealizador e organizador da missão ao Uruguay, que até recentemente lecionava na mesma escola as cadeiras de ovinocultura e caprinocultura, a buscar o desafio de se dedicar totalmente a profissionalizar produtores rurais voltados a atuar nestes segmentos. Na visão dos professores, o mercado de trabalho está em alta, com muitas possibilidades para quem quer permanecer no campo com bom resultado financeiro.

Quem compartilha da mesma opinião é Lucas da Costa, Secretário de Agricultura e Meio Ambiente de Nova Petrópolis/RS, que avalia o desenvolvimento da cadeia bovina, com forte produção de queijos e derivados, carne e embutidos, que vem evoluindo permanentemente, devendo levar neste rastro a ovinocultura como um todo. “É um setor em crescimento”, necessitando ainda de um maior consumo tanto de carne quanto de leite e queijos. Segundo o Secretário já existe por parte de sua pasta projetos de incentivo ao setor, bem como à caprinocultura, principalmente com foco na produção de queijos. “É outro nicho a ser explorado”. Para 2020, como aponta Raquel Mesquita, coordenadora do Serviço de Inspeção Municipal de Nova Petrópolis, algumas estratégias estão saindo do papel, entre elas, o fomento à agroindústria local e à ovinocultura em toda a sua cadeia produtiva. “Estamos traçando alternativas e detectando oportunidades para o crescimento setorial”.  Como finaliza o Secretário, este “é um caminho sem volta”.

Retorno

Na avaliação de Fernando Nerva, “encontramos o que fomos buscar, um país que apresenta soluções muito simples com alternativas de renda para a propriedade. Além de produzir riqueza, a ovinocultura permite a retenção de mais gases do efeito estufa, por isso mesmo é altamente benéfica  para o meio ambiente”.

Como médico veterinário e estudioso do segmento, Fernando frisa que segundo aprofundadas pesquisa on line na Biblioteca de Lisboa, pode averiguar  que o Uruguay “foi a porta de entrada da pecuária na América Latina a partir da região de Colônia do Sacramento, em 1608, pelos portugueses, sendo que as ovelhas entraram antes dos bovinos, que só chegaram ao local a partir de 1630”.  Tudo isso, segundo ele, mostra  que apostar nesta cadeia produtiva, além de tratar-se de um manejo secular, reforça tradição e história embasada em muito conhecimento e aperfeiçoamento técnico, conquistados ao longo do tempo.

(* Clarice Ledur viajou ao Uruguay a convite da organização do evento)

Compartilhe esta notícia:

Voltar Todas de Agro

Exportações de carne suína batem recorde em 2019
Casal dá uma guinada em suas opções profissionais e monta queijaria no interior gaúcho que já nasce com diferenciais competitivos e perspectivas de expansão a curto prazo
https://www.osul.com.br/em-missao-no-uruguay-empresarios-e-profissionais-do-meio-rural-buscam-tecnicas-e-conhecimentos-para-a-melhoria-de-cadeias-produtivas-com-foco-na-ovinocultura-leiteira/ Em missão no Uruguay, empresários e profissionais do meio rural buscam técnicas e conhecimentos para a melhoria de cadeias produtivas com foco na ovinocultura leiteira  2020-01-07
Deixe seu comentário
Pode te interessar