Sábado, 05 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 20 de junho de 2020
Anúncio da retirada parcial dos militares americanos em solo alemão força a repensar a estratégia de segurança de todo o continente. A Alemanha deverá assumir mais responsabilidade e rever sua política nuclear.O choque ainda não foi absorvido: poucos dias após o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que retiraria cerca de um terço de suas tropas da Alemanha, o assunto ocupa todas as camadas da política nacional alemã.
Prefeitos de regiões estruturalmente fracas preocupam-se com uma perda maciça de poder aquisitivo; o ministro do Exterior Heiko Maas teme por uma debilitação ainda maior das relações teuto-americanas; e os planejadores militares se perguntam o que essa decisão significa para a estrutura de segurança europeia.
Afinal, a Alemanha é um dos componentes centrais das estratégias de defesa americanas na Europa, sendo até mesmo local de estacionamento de armas nucleares dos EUA, a serem transportadas por aviões de combate até seu alvo, caso necessário.
No entanto, essa presença será consideravelmente enfraquecida. Trump quer retirar cerca de 9.500 soldados da Alemanha. Caso grande parte deles não seja transferida a outros postos no continente, retornando ao país natal, as relações de poder na Europa se alterarão.
“Ainda é totalmente obscuro aonde essa viagem levará e que lacunas de segurança acarretará”, comenta Thomas Kleine-Brockhoff, vice-presidente do German Marshall Fund, instituição de cunho transatlântico sediada em Berlim. No momento, ele não vê quem possa lucrar com a decisão, nem mesmo a vizinha Polônia, que poderia esperar um aumento do contingente americano em seu território.
O enfraquecimento dos laços entre Alemanha e EUA prejudicam toda a Europa, fato que reconhecem também os países do Centro e Leste do continente, destaca Kleine-Brockhoff. Mas, apesar de tudo, a União Europeia (UE) precisa encontrar respostas à retirada dos americanos.
“A Europa vai ter que assumir mais responsabilidade”, conclui Roderich Kiesewetter, ex-oficial militar atualmente encarregado de política externa da União Democrata Cristã (CDU) no parlamento federal. Ele repete assim uma reivindicação que se tem escutado tanto da chefe de governo Angela Merkel quanto dos departamentos competentes.
A política alemã ainda não definiu o que seria esse acréscimo de responsabilidade. Está-se falando de um pouco mais engajamento numa ou outra região de crise, a fim de aliviar os EUA, que deverá se concentrar fortemente no rival chinês e na Ásia? Ou a pressão causada pela retirada levará Berlim a ceder às reivindicações feitas há anos pelos EUA e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), aumentando significativamente seus gastos de defesa?
O especialista em política externa Kleine-Brockhoff recomenda exatamente essa reação. “A Alemanha provou na crise de refugiados, e agora na crise do coronavírus, que é bem capaz de lançar mão de grandes somas de dinheiro.” Ou seria cogitável Berlim até mesmo adotar uma mudança de paradigma, passando a trabalhar por uma Europa capaz de garantir a própria segurança, mesmo em caso extremo?
Caso seja esse o desejo secreto dos políticos alemães, sua realização inevitavelmente envolveria Berlim e Paris, os pesos-pesados políticos e militares remanescentes da UE. E para a Alemanha, isso voltaria a colocar em primeiro plano uma questão incômoda: seu posicionamento quanto às armas atômicas. Pois a dissuasão nuclear é considerada a garantia de vida final para a independência do Estado.